Não é de hoje que o mercado brasileiro de caminhões atrai o interesse das grandes montadoras. Com a crise nos mercados europeu e norte-americano, o País se tornou uma das grandes promessas para os próximos anos – junto à Rússia, Índia e China, formando o denominado BRIC. Por outro lado, nos chamados mercados desenvolvidos, a situação encontra-se bastante séria: a Europa registrou queda de 9,6% no primeiro trimestre de 2012, e países como a Espanha e Itália viram suas vendas despencarem 22,6% e 36,1% nesse período, respectivamente.

A expectativa para o mercado de caminhões no BRIC, é de que os países do bloco sejam responsáveis por 66% da demanda de caminhões em 2020, o que demonstra um crescimento significativo, considerando que esse número era de 33% no ano 2000. Os dados são do levantamento “Vencendo a batalha no mercado de caminhões do BRIC”, do Boston Consulting Group. “A expectativa é de que o mercado total de caminhões seja de 6,8 milhões de unidades em 2020 e, no Brasil, 208 mil unidades”, diz o sócio do escritório do BCG em São Paulo e um dos autores do estudo, Ilson Dalri.

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A expectativa é que em 2020 o mercado brasileiro de caminhões seja de 208 mil unidades /ano, diz Ilson Dalri, um dos autores de estudo sobre o segmento

O levantamento aponta que o Brasil tem o mercado mais desenvolvido entre os demais. De acordo com Dalri, as grandes montadoras entraram no Brasil muito antes de qualquer outro mercado do BRIC”. Isso significa que o País ganhou antes o acesso a um sofisticado know-how, enquanto os outros mercados (Rússia, Índia e China) eram – e a maioria ainda é – dominados por montadoras locais que produzem caminhões low cost (de baixo custo) midmarket (intermediários, entre os de baixo custo e os premium)”, explica Dalri. O professor do curso de Engenharia Mecânica Automobilística do Centro Universitário da FEI (Fundação Educacional Inaciana), Edson Esteves, acrescenta que as montadoras trouxeram desenvolvimento, mas o consumidor pagou alto por ele. Isso porque o Brasil teve que adequar os conceitos de produtos desenvolvidos a partir de plataformas arquitetadas pelas grandes montadoras do mercado europeu/americano, que se instalaram localmente, e o consumidor local acaba tendo o ônus de pagar o royalty pelo uso dos conceitos pesquisados e desenvolvidos nos centros de estudos de engenharia avançada das matrizes internacionais.

O motivo de nosso País não contar com montadoras próprias, de grande participação no mercado, se deve a fatores históricos, explica Esteves. “Esse tema é um pouco complexo e deve ser discutido considerando dois aspectos: a carência da formação de profissionais e falta de infraestrutura adequada. O Brasil não teve, e continua não tendo, vontade política para direcionar incentivos e investimentos às instituições de ensino para formar profissionais que possam pesquisar e desenvolver soluções e ideias direcionadas para novas arquiteturas de projetos de veículos de transporte de passageiros ou de cargas”, explana.

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De acordo com o professor de engenharia da FEI, Edson Esteves, o Brasil se adequou aos conceitos de produtos desenvolvidos para mercados europeu e norte-americano

Os países do BRIC estão crescendo em ritmo mais acelerado que os europeus, inclusive no mercado de transporte de carga, fazendo com que os olhos – e os investimentos – das montadoras estejam atentos a eles. Mas isso não significa que os mercados sejam iguais: ainda há diferenças em relação aos padrões de emissões, às necessidades dos clientes (por conta das diferenças climáticas, condições das vias e qualidade do diesel), aos preços e na participação de montadoras locais. (O Brasil é o único deles que não tem montadora nacional com participação significativa), enquanto na Rússia as quatro maiores locais concentram 75% do mercado. Na Índia, a Tata domina com 2/3 do volume de vendas; e na China as montadoras nacionais ainda são maioria, embora fabricantes europeus já marcam presença no segmento premium.

Com isso, o mercado brasileiro não conta com um significativo mercado low cost – o que pode mudar com a chegada das montadoras chinesas. Mas a expectativa é de que, por aqui, elas se encaixem no midmarket. “Tende a ser como no mercado dos automóveis de passeio, ou seja, a primeira fase foi a de disponibilizar veículos básicos, como objetivo de acessibilidade de preço ao segmento de baixo poder aquisitivo e alta taxação. Em seguida, com base no processo de uma maior nacionalização dos itens de menor peso, como, por exemplo, os acessórios, e gradativamente aumentar o número de modelos com veículos mais sofisticados/preços maiores, porém, sempre dependentes da aceitabilidade do mercado, para uma produção em escala que justifique os investimentos”, ressalta o professor da FEI Edson Esteves. Neste aspecto, Ilson Dalri, diz que a concorrência com os orientais é esperada há algumas décadas pelas marcas que já estão no Brasil. Ele acredita também nas chances de que no futuro as montadoras chinesas e indianas ganhem espaço no Brasil. “Seus produtos vão atingir níveis de sofisticação cada vez mais altos, de maneira que o portfólio cubra toda a gama de caminhões low cost até o midmarket”.

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Na opinião de Marcelo Bouhid, gerente de marketing da Iveco, as montadoras que estão chegando terão ainda um tempo de maturação, principalmente em relação ao pós-venda

Para o gerente de marketing da Iveco, Marcelo Bouhid, a chegada de novas montadoras é vista como fato natural, pois o Brasil é hoje um dos cinco maiores mercados de caminhões do mundo. Em sua opinião, apesar de estes concorrentes possuírem algumas vantagens competitivas, as que produzem localmente já possuem vasta experiência com o mercado brasileiro e com as exigências de seus consumidores. “Acreditamos que as novas montadoras terão ainda um tempo de maturação, principalmente no que diz respeito ao pós-venda”, explica.

O diretor de Marketing, Vendas e Pós-Vendas da MAN Latin America, Ricardo Alouche, compartilha da opinião do colega: “A competição é sempre saudável, desde que praticada dentro das regras internacionais aceitas e reconhecidas. A MAN Latin America aceita isto com naturalidade, e mesmo com esta presença crescente em todos os mercados onde atuamos, acreditamos que temos trunfos e valores que serão reconhecidos pelos nossos clientes ainda por muito tempo”. Apesar das diferenças mencionadas, os mercados dos países do BRIC possuem muitas semelhanças. Uma delas é a tendência de um predomínio do midmarket, que deverá ser responsável por 70% das vendas em 2020. Entre as razões estão ações de governos (os quatro países já terão implementado o Euro 5 até 2015), a maior exigência dos clientes e profissionalização da indústria de transporte. Na avaliação de Alouche, existem mais similaridades do que diferenças entre os mercados dos chamados BRICS (incluindo África do Sul – SA). Explica que estão seguindo uma trajetória de expansão forte nos últimos anos e, frequentemente, superando o próprio ritmo de crescimento econômico. “Trata-se de um perfil de mercado bastante familiar ao que temos hoje no Brasil. Obviamente existem peculiaridades ambientais, de extremos de temperatura e altitudes de operação, mas nada que represente maiores obstáculos tecnológicos”, complementa Alouche.

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