Por Evilazio de Oliveira

Depois da crise econômica que atingiu o Brasil a partir do quarto trimestre de 2008, as lições de sobrevivência parecem ter sido bem aprendidas e, com isso, a recente crise internacional que novamente fez estremecer as economias mundiais – de novo com seus reflexos no transporte de cargas – já demonstra recuperação neste final de ano, principalmente para as empresas e autônomos mais bem estruturados.

Se os reflexos da crise ainda são sentidos nas empresas, mas com uma gradual recuperação no volume de cargas e aos níveis mais adequados nas tarifas dos fretes. Nas estradas essa recuperação ainda é vista e analisada com cautela. É bem verdade que muita gente ficou sem emprego em razão da “marolinha”, enquanto outros tantos viram seus ganhos serem drasticamente reduzidos e as longas esperas por carga se tornaram rotineiras.

Entre outubro de 2008 e outubro deste ano houve uma redução muito grande nas atividades do setor, lembra Sérgio Quintana, dono de dois caminhões
Entre outubro de 2008 e outubro deste ano houve uma redução muito grande nas atividades do setor, lembra Sérgio Quintana, dono de dois caminhões

Na opinião de Paulo Sérgio Quintana Lopes, 40 anos e 19 na área de transportes, o período de outubro de 2008 até outubro deste ano foi complicado, com uma redução de até 60% nas atividades do setor. Ele é dono de dois caminhões que atuam no transporte internacional, trabalha como despachante aduaneiro e representa várias empresas transportadoras em Uruguaiana/RS – onde está localizado o maior porto seco da América Latina, e também por onde passam cerca de 750 caminhões diariamente nas rotas Brasil, Argentina e Chile. Conforme destaca, tal como aconteceu na crise que afetou a Argentina em 2002 – que praticamente paralisou o comércio com o Brasil e centenas de empresas transportadoras sofreram calote ou demora no recebimento de valores – foi preciso buscar alternativas e a reestruturação de negócios. Também agora foi necessário captar novos clientes, diversificar as cargas e até mesmo os destinos. Com a gradual superação da recente crise, o setor de transportes se recupera, aos poucos. Paulo Sérgio acredita que, pelo menos no Sul, essa recuperação já atinge 80% daquela queda estimada em 60%, no auge dos problemas internacionais.

Maiquel Brasil, que já trabalhou com registro em carteira e agora é comissionado, diz que o volume de cargas está crescendo e acredita que a situação irá se normalizar Mesmo cauteloso, ressalta que se persistir bom
Maiquel Brasil, que já trabalhou com registro em carteira e agora é comissionado, diz que o volume de cargas está crescendo e acredita que a situação irá se normalizar 

Mesmo cauteloso, ressalta que se persistir bom senso nas cotações do dólar, a tendência para o ano de 2010 é de crescimento, da mesma forma em que – mesmo negociada – as tarifas de fretes também apontam para um retorno aos índices de 2008, quando todos trabalhavam felizes, lembra.

O relativo otimismo em relação aos bons negócios, ampliação do mercado de cargas e melhoria nas tarifas de fretes para o ano que vem se deve, principalmente, pela previsão de recuperação da economia brasileira e, por consequência, do setor de transportes, responsável pela movimentação de 58% da riqueza produzida no País, segundo analistas do setor. Para o carreteiro Maiquel Brasil de Oliveira, 28 anos e oito de volante – os efeitos da crise não teriam outras consequências se ele não tivesse saído da empresa em que era empregado, com carteira assinada, para trabalhar como comissionado. Antes disso, havia machucado o joelho ao cair do caminhão e, ao perder o emprego, perdeu também os benefícios do plano de saúde que lhe permitiriam o tratamento da lesão.

No início de 2009 a situação estava muito ruim, mas foi melhorando aos poucos e agora, no final do ano, está quase como antes da crise, afirma Ângelo Márcio Pereira
No início de 2009 a situação estava muito ruim, mas foi melhorando aos poucos e agora, no final do ano, está quase como antes da crise, afirma Ângelo Márcio Pereira

Maiquel não se queixa e reconhece que o volume de cargas está crescendo. Os valores dos fretes continuam baixos e os seus vencimentos, no final do mês, estão cerca de 10% a menos do que no ano passado. “Antes, eu tinha condições de pagar uma prestação de R$ 600,00 e hoje não dá para pagar nem R$ 500,00”, afirma. Tem trabalhado mais e confia que irão se normalizar. “E para o ano de 2010 é preciso ser otimista”, acrescenta. Ele é natural de Porto Alegre/RS e costuma transportar polietileno do Pólo Petroquímico, em Trunfo/RS. Trabalhando com carteira assinada e com comissão sobre o valor do frete, Ângelo Márcio Pereira, 32 anos e cinco de estrada, lembra que no começo do ano o volume de carga caiu muito e a situação ficou ruim, mas aos poucos foi melhorando. “Agora está bom, quase como antes da tal crise”. Ele atua no transporte internacional e acredita que, apesar do valor dos fretes continuar baixo, pelo menos existe mais carga e dá para trabalhar mais sossegado. Está confiante que em 2010 tudo será melhor, “afinal é uma época de renovação e de confiança e é preciso ter fé no futuro”.

Há cinco anos no Brasil, o argentino Mário Ramón Saviero tem opinião de que após um período muito difícil houve uma melhora a partir de outubro deste ano
Há cinco anos no Brasil, o argentino Mário Ramón Saviero tem opinião de que após um período muito difícil
houve uma melhora a partir de outubro deste ano

O argentino Mário Ramón Siviero, 25 anos de idade, está há cinco no Brasil e neste período tem trabalhado como motorista de caminhão. É natural de Mocoreta, província de Corrientes, e conta que atravessou a fronteira em busca de melhores oportunidades. Questionado se valeu a pena, Ramón, que trabalha como empregado no transporte internacional na rota Brasil/Argentina, dá de ombros. Lembra que este ano foi ruim, com poucas cargas e com o valor do frete muito baixo. Em janeiro passado ficou duas semanas parado em Buenos Aires,
tendo despesa para a sua manutenção e sem ganhar nada. “O rendimento caiu neste ano e para o comissionado é preciso rodar muito para conseguir faturar alguma coisa”, conforme explica. Segundo ele, a partir de outubro houve uma pequena melhora na oferta de cargas, mas o valor do frete continua baixo. Saliente que de acordo com o noticiário da imprensa a situação da economia encontra-se em recuperação, está confiante que em 2010 tudo será diferente e melhor, com os carreteiros tendo cargas e fretes melhorando para que todos possam tocar a vida em paz. “É preciso melhorar, tem de melhorar…”

Apesar de ter havido uma baixa no volume de cargas, Neil Leiria compara 2009 com o ano passado, que foi bom para ele, e não acredita em grandes mudanças em 2010
Apesar de ter havido uma baixa no volume de cargas, Neil Leiria compara 2009 com o ano passado, que foi bom para ele, e não acredita em grandes mudanças em 2010

Além dos problemas de falta de cargas e dos baixos valores para os fretes, o carreteiro Neil Leiria Prates, 35 anos e cinco de profissão, lamenta a grande demora para a liberação dos caminhões na aduana de Uruguaiana/RS, que causa atrasos e prejuízos para o pessoal do transporte internacional. Enquanto aproveita o tempo livre, em casa, para fazer uma revisão no bruto, Neil Leiria “mata as saudades do filho Samuel”, com idade de um ano e sete meses. Ao fazer uma análise do que foi o ano de 2009, em termos profissionais, acredita que andou parelho com 2008, apesar da crise. Considera que mesmo tendo baixado um pouco o volume de cargas e o faturamento, já que é comissionado, o ano foi bom. Acredita que em 2010 a situação continuará do mesmo jeito, com o motorista sempre correndo atrás de cargas, de melhores fretes e precisando rodar muito para conseguir sobreviver. Agora, ressalta, o grande problema é a burocracia e a lentidão no atendimento na aduana.