A tecnologia no setor automotivo segue ano a ano promovendo novidades. Automatização começou em larga escala com veículos de passeio e na última década invadiu o setor de transporte pesado. Parte da frota de caminhões brasileiros, produzida nos últimos três anos já sai da fábrica computadorizada. Tal fato representa direção de alta sensibilidade, caixa de câmbio automatizada, bancos com múltiplas regulagens, ar condicionado, sistema inteligente de frenagem, computador de bordo, sensor de chuva, detector de distração do motorista, além de suspensão inteligente para a cabine entre outros itens que contribuem para a eficiência do veículo, conforto do motorista e segurança.
Essa comodidade está presente em quase 80% das transportadoras de Mato Grosso. O Estado, segundo último levantamento do IBGE, concentra quase 30% da frota de caminhões pesados do Brasil. Além disso, boa parte das empresas de transportes estão localizadas no município de Rondonópolis, região Sul, a 222km de Cuiabá e conhecida nacionalmente como capital do bitrem.
Na cidade os motoristas empregados só dirigem máquinas modernas e normalmente após longo período de treinamento nas empresas. “É possível tirar muitos benefícios desses caminhões, mas para isso é preciso conhecê-los de A a Z” , conforme disse Rosano Reis Flausino Araújo, supervisor de frota da Roma Transportes. Segundo ele, por isso a empresa qualifica os funcionários, para que todos entendam como funciona o sistema completo dos veículos e os usem de forma adequada. “Assim evitamos manutenção, ganhamos em produtividade e as viagens ficam até 15% mais baratas”, justifica.
Nos planos da empresa consta ter uma frota totalmente automatizada nos próximos anos, porque as perdas incentivam as empresas a investirem ainda mais na automatização da frota. Para o gerente da Roma Transportes, Cristiano Freitas, a tecnologia invadiu as cabines de forma irreversível. “A questão implica numa série de facilidades, as quais condicionam o motorista, oferecem conforto e segurança. O resultado é a expressiva melhora na produtividade”, reconhece.
As afirmações acima são ratificadas pela motorista empregada Angelina Borges, carreteira que está a pouco mais de um ano e meio no volante. “O caminhão mais parece um robô, quando alguma coisa não vai bem ele avisa, reduz parte do desempenho até você encontrar socorro. Num passado não muito distante, o carro quebrava e o motorista era obrigado a encostar”, relata Angelina acrescentando que nunca ficou parada na estrada por problema no caminhão.
Porém, muitos motoristas ainda estão acostumando com a novidade. É o caso do autônomo paranaense Gildo Aparecido Samuel. Dos seus 52 anos de vida, 30 foram dedicados ao volante de caminhão. Ele comenta que nos últimos cinco anos ele viu e conheceu muitas inovações nos pesados. “É uma realidade completamente diferente daquela que estávamos acostumados. A caixa automatizada diminui o cansaço, o banco parece que abraça, a cabine não sacode, sem falar na quantidade de botões e sensores” relaciona. Samuel diz que a adaptação demorou um pouco, no início achou estranho entender aquilo tudo, quando se está acostumado a olhar apenas para dois, três medidores no painel. “Mas vale a pena, hoje levanto cedo para pegar estrada com a impressão que estou em casa. Termino o dia, com corpo inteiro. O cansaço é quase zero e as dores pelo corpo praticamente sumiram”, afirmou.
Enquanto uma parte da categoria é inserida na era digital, outros realizam o caminho contrário. Um exemplo é o caminhoneiro Francisco Assis de Lima, de Sinop/MT, 56 anos de idade e mais de 30 de experiência na estrada. Ele contou que até o início de 2015 trabalhou como empregado e dirigia umas das versões de caminhão mais modernas do Brasil. Para realizar o sonho de guiar seu próprio veículo, saiu da empresa e comprou um cavalo-mecânico ano 2000. Embora se sinta feliz por ter conquistado seu objetivo, tem sentindo a mudança tanto no corpo, quanto no bolso.
“É bom ter o próprio caminhão, mas é complicado dirigir um veículo que não contém a evolução dos últimos anos”, reconheceu Francisco Lima. Ainda de acordo com ele, a média de combustível não favorece, a manutenção é cara e o corpo fica constantemente desgastado. “Tenho dores na coluna e na perna. Meu cansaço hoje é 50% maior do que dois anos atrás”, reclama dizendo que sua intenção é de ficar alguns anos com esse carro e tentar comprar um automatizado de segunda mão.
Em meio a vários depoimentos favoráveis aos caminhões mais modernos e com tecnologias recentes, a reportagem da Revista O Carreteiro encontrou num posto de combustível em Rondonópolis/MT, o motorista Arilton Gonçalves dos Santos. O paranaense de 58 anos fala com orgulho de sua história no volante, a qual já passa dos 38 anos. Ele afirmou que já dirigiu praticamente todas marcas e modelos de veículos pesados, exceto caminhões automatizados.
“Não quero e nem faço questão. Esses caminhões estão programados para favorecer somente as transportadoras. Mas para nós que somos autônomos não vejo vantagem”, justifica. Arilton destaca ainda que um conjunto completo custa quase um milhão de reais, enquanto pagou R$ 140 mil pelo seu caminhão ano de fabricação 2001. “Já paguei todo o veículo, não tenho dívidas e vivo muito bem com ele”, enfatizou.
O autônomo tem opinião de que um caminhão mais antigo tem capacidade para obter desempenho semelhante aos novos. Com relação ao combustível disse que qualquer motorista é capaz de fazer média. “Não precisa de computador para isso e o desgaste também pode ser reduzido com manutenção constante, aliás, a manutenção é outra coisa favorável em caminhões como o meu. “Se quebrou vou lá, identifico o problema e pronto. Os caminhões de hoje quebram, ficam todos desprogramados e aí você tem de procurar uma autorizada para reprogramar. Não faço questão nenhuma de entrar na era dos botões”, conclui.
Por Erik Valeriano
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