Antigamente, ser autônomo era o sonho da maioria dos motoristas que estavam começando na profissão. A sensação de liberdade, de poder decidir a rota, locais de parada e horários eram os principais atrativos para se ter o próprio caminhão. Porém, as diversas mudanças ocorridas no setor de transporte através dos anos, levou muitos autônomos a pensarem e até trocarem a suposta liberdade por um emprego com carteira assinada. Afinal, quem trabalha registrado conta com salário fixo todo mês, direitos como 13º salário, férias anuais e plano de saúde, entre outros benefícios. Porém, a jornada de trabalho é determinada pela empresa, o que muitas vezes pode significar cargas horárias puxadas.
Por outro lado, o motorista que opta por ter o seu próprio caminhão pode prestar serviços para uma ou mais empresas sem vínculo empregatício, mas é o responsável pela parte operacional e administrativa do seu negócio. Tem horários flexíveis durante as jornadas diárias; flexibilidade sobre dias e horários de trabalho, de aceitar e recusar cargas, porém, em contrapartida, não conta com salário fixo e tem de arcar com os custos do diesel, pedágio, alimentação e manutenção do caminhão, entre outras obrigações.
Na teoria parece ser fácil escolher, mas na prática a melhor opção não existe, pois tanto o motorista empregado quanto o autônomo têm compromissos e dificuldades, assim vai depender de cada profissional, de sua forma de trabalho e como ela se adéqua às suas prioridades pessoais. Confira o que pensa os empregados e autônomos:
2O que dizem os empregados:
CLAUDIOMIRO LOPES
Há 40 anos na profissão, sempre como empregado, Claudiomiro Lopes, 62 anos de idade e morador de Primavera do Leste/MT, admitiu que várias vezes já pensou em comprar seu próprio caminhão, porém recuou. A situação que o País atravessa, disse, o levou a decidir por continuar alguns anos a mais no seu atual emprego. “Não consigo enxergar mudança nos próximos anos e trabalhar por conta virou um grande desafio. Alguns conseguem, mas muitos não. Do jeito que as coisas estão prefiro continuar no meu emprego”, justificou.
Comentou que seu salário é pequeno, mas também não tem preocupações com pneus, diesel, manutenção e busca de carga, embora não deixe de opinar que a vida do motorista empregado é de muita pressão e de pouco tempo com a família. “Hoje estou numa empresa que respeita meu trabalho e minhas horas de descanso, mas isso não acontece com a maioria. Tem muitos colegas que chegam para descarregar e já encontram uma ordem de serviço para carregar. Trabalham entre 25 e 26 dias por mês”, frisou.
ADELSON RODRIGUES
Outro carreteiro empregado é Adelson Rodrigues Simões, Xavantina/MT. Aos 38 anos de idade, e 15 na profissão, ele também acha que a vida de quem trabalha para empresa é intensa e que as paradas são apenas para carregar, descarregar, abastecer e pegar a nota. “Em todo o momento a empresa cobra produtividade. Eu, por exemplo, trabalho pelo menos em 25 dos 30 dias do mês.
Adelson afirma que mesmo com o desgaste maior do que um colega que tem o próprio caminhão, trabalhar de empregado é mais rentável. “Nossa vida é corrida demais, mas tenho a garantia de um salário que ainda dá o sustento da minha família. Ganho em torno de R$ 4.500,00 mil livres”, revelou, garantindo que mais da metade dos autônomos não retira esse valor, porque a despesa com caminhão é muito grande e leva praticamente tudo que o motorista recebe.
Adelson garantiu que só trabalharia por conta própria se fosse com um caminhão 0km e sem parcelas de financiamento. “Com um veículo novo e sem dívidas é outra história. Você pode viajar sem contratempos por milhares de quilômetros. E mais, sem prestação é possível tirar um bom dinheiro, mas infelizmente dá para contar nos dedos quem vive essa realidade”, comentou.
PAULO ROGÉRIO
Esse é também o pensamento de outros profissionais do volante. O paranaense de Ponta Grossa, Paulo Rogério de Mello, 57 anos de idade, por exemplo, também tem esse sonho, mas disse que nunca conseguiu economizar o suficiente para adquirir um caminhão novo. Depois de 30 anos trabalhando como empregado, ele decidiu, há cerca de 10 anos, comprar um veículo usado. Lembrou que sua opção deu certo nos primeiros anos, porque depois de algum tempo o veículo começou a apresentar desgaste e desde então parte do faturamento mensal ficou comprometida.
“É muito complicado trabalhar com caminhão mais velho, pois com o passar do tempo a manutenção vai se tornando cada vez mais frequente. Aí você inclui o alto custo do diesel contra o frete baixo, não sobra quase nada”, afirmou. Paulo Rogério disse ainda que a cada cem reais que ganha setenta e cinco ficam na estrada. “Na minha idade, não há muito o que fazer a não ser esperar a aposentadoria”, lamentou. Ele contou que ganha em média R$ 7 mil reais por mês, mas garantiu à reportagem da revista O Carreteiro que se aparecer uma proposta de R$ 5 mil volta a ser empregado. “Não penso duas vezes, a pressão pela produtividade é bem maior, mas pelo menos não tenho que matar um leão por dia”, concluiu.
HELANOS LEÃO
Helanos Leão, de São Paulo/SP, 45 anos de idade e 20 de profissão é empregado desde o início da carreira, garante que as principais vantagens dessa relação empregatícia são a isenção de custos como pedágio e diesel e receber mensalmente um salário. No entanto, observa, o empregado é muito cobrado e obedece a uma jornada de trabalho muitas vezes exaustiva. “Temos de dar resultado, fazer boa média de consumo. Além disso somos monitorados em todas as viagens”, explicou.
Em sua opinião não existe certo e errado quando o assunto é decidir ser autônomo ou empregado. O que deve ser levado em conta, afirma, são as oportunidades. Ele contou que tem um filho autônomo que transporta bobina dentro de São Paulo e se comparar o faturamento deles é quase o mesmo. “A diferença é que a jornada dele é bem mais tranquila, pois ele dita o ritmo de trabalho. Mas ter um caminhão exige responsabilidade e bons contatos para manter uma boa rentabilidade todo mês”, explicou.
Na ocasião da reportagem, Helanos viajava com o filho de 16 anos, Alisson, que também pensa em ser motorista. “Claro que eu queria que ele escolhesse outra área, mas em um País onde nenhum profissional é valorizado, fica difícil justificar a mudança. Eu digo para ele que a profissão não é ruim, mas tem que gostar para enfrentar as dificuldades e se destacar”, finalizou.
FÁBIO PEREIRA
Já o mineiro de Sete Lagoas, Fábio Pereira Passo, 35 anos de idade e 17 de estrada, acredita que diante da situação do País, ser empregado é uma boa alternativa. “Fico tranquilo por ter um salário garantido todo mês e não precisar arcar com o alto preço do diesel e de outros custos do transporte, como pedágio, pneus e o frete baixo”, explicou.
Por outro lado, Passo reconhece que o autônomo pode gerenciar o seu próprio negócio e ter chances de crescer, caso seja bem organizado e tenha um bom equipamento. “Se eu fosse dar um conselho para quem quer começar agora, diria ao motorista para escolher a condição de autônomo somente se ele tivesse um caminhão novo e garantias de frete. No meu caso confesso que ando um pouco cansado da profissão, que na minha opinião é muito sofrida e sem valorização”, finalizou.
JUAREZ PEREIRA
Outro carreteiro que atua como empregado é Juarez Pereira, 32 anos de idade e oito de profissão, de Linhares/ES. Assim como seus colegasde profissão, ele também defende que atualmente as grandes vantagens de trabalhar com registro em carteirasão a garantia de manter um salário fixo todos mêses, não ter nenhum tipo de despesa e poder tirar férias. “Nesses aspectos, realmente é muito bom trabalhar em uma empresa. Temos estrutura, mas existem as desvantagens da carga horária”, lembrou.
Do seu ponto de vista, a maior vantagem em ser autônomo é poder traçar a própria rota, fazer seu horário e também ter valor recebido variado. “O motorista que tem um caminhão bom e frete certo consegue fazer o seu próprio salário. Mas, mesmo assim, acredito que para quem pensa em começar hoje na profissão, o mais indicado seja ter carteira de trabalho assinada”, opinou.