Por volta de 1980, a indústria brasileira de caminhões estava começando a amadurecer. As marcas Ford, Scania e Mercedes-Benz já eram tradicionais e donas dos clássicos de hoje e que naquele período eram líderes de venda. Também foi no início dessa década que a Volvo, que havia sido constituída em 1977 e em 1979 apresentou o chassi de ônibus B58, lançou em 1980 o modelo bicudo N10, modelo que desenvolvia 263cv – uma enorme potência para a época em que predominavam veículos com cavalagens bem inferiores ao brutão da grife sueca.
Contudo, de lá para cá, as potências dos veículos dobraram. Os motores dos caminhões rodoviários saíram da faixa dos 180cv e 200cv para a casa dos 400cv – esta, a faixa de potência que mais prevalece no País atualmente. O que não se cogitava à época, é que haveria caminhões com motores de 13 litros e potências superiores a 500cv – foco dessa reportagem.
Tamanha cavalagem parece influência europeia, porque é lá que ficam as matrizes das marcas de caminhões que rodam aqui. A necessidade do Brasil aumentar as potências e o torque dos motores ocorreu por influência do aumento da capacidade de carga dos caminhões. Vale ressaltar que o País levou quase duas décadas para avançar no desenvolvimento dos motores mais potentes. Isso tem uma razão.
Segundo Sérgio Gomes, especialista em estratégia de mercado e desenvolvimento do negócio, proprietário da SG Consulting, nos anos 1980, a relação peso/potência dos caminhões era de 6cv por tonelada. “A composição de 3 eixos era o equipamento usado para o transporte rodoviário, então se multiplicarmos 40 toneladas por 6cv, o resultado é 240cv”, lembra Gomes.
Contudo, na virada do século, precisamente nos anos 2000, com a autorização do bitrem, a capacidade de carga dos caminhões saltou de 40 para 56 toneladas, havendo a necessidade do aumento de potências.
Álvaro Menoncin, gerente de engenharia de vendas da Volvo, explica que de 1980 as potências dos caminhões evoluíram na média de 6cv ao ano. “Fazendo essa mesma analogia, passamos de veículos com torque na faixa dos 96 mkgf para os atuais 265 mkgf como do motor Volvo de 540 cv. Com isso, a média de crescimento foi de aproximadamente 15Nm por ano”, salientou.
A tecnologia empregada no motor diesel como o turbo e a eletrônica embarcada serviram de pontapé inicial para a potência e torque existente nos propulsores existentes atualmente.
O turbo foi o elemento que mais propiciou uma rápida escalada no desempenho do motor. Salvo os esforços térmicos que a sobrealimentação impunha para as partes “quentes” dessa máquina, o rendimento em relação às versões aspiradas teve um incremento entre 15% e 30%.
Em 1984, a DAF revolucionou os motores com o desenvolvimento do ATi (Advanced Turbo Intercooling), conceito de sobrealimentação refrigerado mediante a incorporação de um intercooler que arrefece o ar precedente do turbo. Além do incremento de potência, essa solução é capaz de refrigerar a temperatura na parte alta dos pistões. Isso permitiu que os motores evoluíssem para 12 e 13 litros, com cilindros em linha.
Em 2006, com a introdução do Proconve P5 (equivalente à norma Euro 3, na Europa), mudanças significativas aconteceram nos motores a diesel. A começar pela introdução da eletrônica. Um módulo eletrônico garantiu a injeção de combustível com altíssima pressão. Neste ano a Volvo lançou o FH com motor de 13 litros e a caixa I-Shift passou a ter capacidade para operar até 60 toneladas.
Tamanha evolução foi necessária para acompanhar mais uma tendência que estava por vir: das composições com capacidade para transportar 74 t. Para isso, os caminhões 6×4 que pareciam antes atender a um nicho de mercado, se tornam grandes protagonistas do transporte rodoviário de carga de longas distâncias.
E lá foram os engenheiros das montadoras desenvolver motores com capacidade para puxar tamanha composição. É aí que os caminhões brasileiros começam a ser equipados com motores superiores a 500 cv. Essa cavalagem, que parecia absurda há cerca de 10 anos, começou a ganhar mais espaço no setor a partir do Proconve P7 (equivalente à norma europeia de redução de poluentes Euro 5).
Ela entra em vigor em 01 de janeiro de 2012 e deixa estabelecido rigorosos níveis de emissões, reduzindo o CO2 para 1,50 g/kW.h e o NOx para 2,00 g/kW.h. O Material Particulado ficou instituído até 0,02g/kW.h. E para cumprir tais demandas exigidas pelo programa, as tecnologias empregadas para atender ao Proconve P7 são a EGR e a SCR (que utiliza Arla 32), sendo esta última eleita a mais apropriada para os caminhões pesados.
Para tanto – e também para justificar o valor agregado à nova tecnologia –, as fabricantes deram uma subida na potência e torque dos propulsores que passaram a atender à legislação. Álvaro Menoncin lembra, ainda, que o consumo de um caminhão com composição para PBTC (Peso Bruto Total Combinado) de 45 toneladas era, em média, de 2,2 km/l. “Atualmente, conjuntos do tipo bitrem fazem média até melhor transportando 40 toneladas só de carga líquida. Essa melhoria se deve à tecnologia embarcada, com novos materiais e, principalmente, com a eletrônica dos motores e a utilização de caixas de transmissão inteligentes”.
Traçando um paralelo com o mercado europeu, os países daquele continente usam potências equivalentes às atuais do Brasil, contudo, não dispõem das mesmas capacidades de carga aqui permitidas. Lá, as capacidades giram em torno de 40 toneladas de PBTC. Sergio Gomes explica que na Europa o que se leva em conta é a manutenção da velocidade média dos caminhões, preferencialmente sem mudar quase de marcha. Por isso, as altas potências têm seu valor por lá.
Acompanhe a segunda parte desta reportagem na edição de dezembro de O Carreteiro, de número 515.