Antigamente, ser autônomo era o sonho da maioria dos motoristas que estavam começando na profissão. A sensação de liberdade, de poder decidir a rota, locais de parada e horários eram os principais atrativos para se ter o próprio caminhão. Porém, as diversas mudanças ocorridas no setor de transporte através dos anos, levou muitos autônomos a pensarem e até trocarem a suposta liberdade por um emprego com carteira assinada. Afinal, quem trabalha registrado conta com salário fixo todo mês, direitos como 13º salário, férias anuais e plano de saúde, entre outros benefícios. Porém, a jornada de trabalho é determinada pela empresa, o que muitas vezes pode significar cargas horárias puxadas.

Por outro lado, o motorista que opta por ter o seu próprio caminhão pode prestar serviços para uma ou mais empresas sem vínculo empregatício, mas é o responsável pela parte operacional e administrativa do seu negócio. Tem horários flexíveis durante as jornadas diárias; flexibilidade sobre dias e horários de trabalho, de aceitar e recusar cargas, porém, em contrapartida, não conta com salário fixo e tem de arcar com os custos do diesel, pedágio, alimentação e manutenção do caminhão, entre outras obrigações.

Na teoria parece ser fácil escolher, mas na prática a melhor opção não existe, pois tanto o motorista empregado quanto o autônomo têm compromissos e dificuldades, assim vai depender de cada profissional, de sua forma de trabalho e como ela se adéqua às suas prioridades pessoais. Confira o que pensa os empregados e autônomos:

1O que dizem os autônomos:

A opção profissional precisa ser consciente em relação às dificuldades de trabalhar por conta. O valor do frete, por exemplo, nem sempre é justo, alerta Jamil Ferreira

JAMIL FERREIRA

Jamil Ferreira Lourenço, 60 anos de idade e 33 de profissão, de Marataízes/ES. Autônomo, ele acredita que as duas condições apresentam vantagens e desvantagens, por isso é preciso estar bem atento na hora de escolher. “No meu caso, a possibilidade de poder faturar mais é uma das vantagens. O empregado tem garantias, mas recebe sempre o mesmo valor. Dependendo da minha organização e empenho, consigo aumentar o meu faturamento. Outros benefícios são a liberdade planejar a viagem e conhecer lugares diferentes e sem muitas cobranças”.

Jamil alerta que, como toda opção profissional é preciso ter consciência das dificuldades na hora de escolher trabalhar por conta. “Os valores de frete nem sempre são justos e todas as despesas são por nossa conta. Mas não posso reclamar, pois criei meus filhos e conquistei uma casa sempre em cima do caminhão”. O carreteiro comenta que as tecnologias existentes hoje facilitaram a vida do motorista autônomo. Ele destaca os aplicativos de frete, que em sua opinião encurtam a distância entre o embarcador e o motorista. “Hoje ficou fácil conseguir frete. Basta acessar esses aplicativos e escolher a opção que melhor se encaixa no meu perfil. Sei que a profissão não é um mar de rosas, mas é o que sei fazer e pretendo continuar até Deus me permitir”, finalizou.

CLAITON CESAR

Outro motorista autônomo de Marataízes/ES, Claiton Cesar, 36 anos de idade e 16 de estrada, vem de uma família de motoristas. Ele começou a dirigir caminhão pela paixão e disse que ser autônomo é bom, porém antigamente o faturamento era bem melhor.

CLAITON
Antigamente, o faturamento do autônomo era muito melhor, não havia tantos pedágios nas estradas e o valor do diesel era mais baixo, comentou Claiton Cesar

“Quando comecei na profissão, não havia tantos pedágios  nas estradas e o valor do diesel não tão alto. O frete foi sempre o mesmo, porém sem esses custos e me sobrava mais no final do mês”, contabilizou. Claiton explicou que de oito anos para cá a situação começou a ficar mais difícil para os autônomos por conta do crescimento dos custos. “Hoje, os empregados têm como vantagens a segurança do salário e não ter de arcar com os custos”, exemplificou.

MAURO JOSI

Com a experiência de quem já rodou por todo o Brasil, exceto os Estados do Acre e Roraima, o autônomo Mauro Josi de Andrade, de Duque de Caxias/RJ, 64 anos de idade e 30 de profissão, trabalhou como empregado até 2008, quando decidiu deixar a empresa e investiu em seu próprio caminhão. “O motivo principal foi ter maior liberdade de escolher meu roteiro, porém, as coisas não são bem assim, porque apesar de ter esse lado positivo, existe a questão do frete baixo e os gastos para transportar”, observou.

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Mauro de Andrade trabalhou como motorista empregado até comprar seu próprio caminhão, em 2008, com a expectativa de ter mais liberdade

Caso tivesse de dar um conselho para quem está iniciando na profissão, ele diria para ser autônomo, porém com algumas condições. “Para ter sucesso, tem de começar com um bom caminhão e frete garantido. Caso não tenha essas duas possibilidades é melhor ser empregado”, aconselhou, acrescentando que para ser dono do próprio veículo é preciso coragem e saber administrar o negócio. No seu caso, atualmente ele trabalha como agregado.

VITOR MERLO

O carreteiro de Rondonópolis/MT, Vitor Merlo, 40 anos de idade, por exemplo, disse que sua situação não tem sido nada fácil, mas também não está disposto a trocar os mais de 22 anos de trabalho como autônomo por uma carteira assinada. “Temos inúmeros problemas que estão travando nossa profissão. É o diesel caro, frete de retorno irregular, falta de uma linha de crédito acessível para autônomos e mercado inflado com muita gente, mas nada me encoraja a trabalhar para uma empresa. É muita pressão por resultado. Não acho interessante e nem saudável para o motorista”, concluiu.

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Mesmo diante das dificuldades em trabalhar com o próprio caminhão, Vitor Merlo afirma que nada o encoraja a ser motorista de empresa

JUSCELINO SKOWRONSKI

Com um pouco de organização ainda é possível viver com o que a estrada oferece. Isso é o que pensa o também autônomo Juscelino Skowronski, 41 anos de idade e 20 de profissão. Ele aprendeu o ofício com familiares e trabalhou sempre com o próprio caminhão, dividindo com o pai e o irmão dois veículos antigos que percorrem as regiões do Centro-Oeste e Nordeste. Otimista, disse que vê uma luz no final do túnel. “Na minha opinião quem vive como autônomo tem de andar com a calculadora debaixo do braço e saber rodar com a margem de lucro lá embaixo”, comentou.

Ainda conforme seu raciocínio, o caminhoneiro tem de deixar na mão apenas o dinheiro necessário e não gastar um centavo a mais do previsto. Juscelino Skowronski disse ainda que considera importante movimentar o caminhão no tempo certo. “Descarreguei aqui e já tenho carga para outro lugar. Assim consigo giro constante para manutenção do veículo e nossa sobrevivência”, pontuou. Ele lembra que a escolha da viagem é fundamental para um bom retorno financeiro.

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Juscelino Skowronski trabalha há 20 anos com seu caminhão e defende que com um pouco de organização é possível viver da profissão

“Quem pretende sobreviver como autônomo precisa colocar na ponta da caneta se esse ou aquele lugar, que as vezes paga um frete bom, compensa. Às vezes, você recebe um bom dinheiro e acaba deixando tudo no caminho por conta do desgaste do caminhão, que na maioria das vezes já está velho”, explicou. Na sua visão profissional, é importante conhecer o lugar para aonde você vai levar a carga, os preços do combustível, calcular a quantidade de pedágios e avaliar trechos de asfaltos e de terra. “Priorizando esses cuidados, com toda certeza a despesa é menor”, garantiu.

Juscelino destacou que diante da instabilidade do mercado, viagem “pagas no fiado” compromete o planejamento do mês. “Se você faz um trecho e deixa tudo pago acabou. Pode até não render muita coisa, mas não tem nada a pagar. Isso é lição de casa para todos que pretendem sobreviver da profissão. Quem não trabalhar assim pode acabar virando empregado”, alertou.

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