Por Evilazio de Oliveira Fotos Gilmar Gomes
No transporte rodoviário, todas as cargas merecem a mesma atenção e são consideradas perigosas, afirmam os carreteiros, embora reconheçam que para algumas sejam necessários cuidados especiais, incluindo-se aí os materiais explosivos, químicos, inflamáveis, entre outros. E também de cargas que além de perigosas são muito valiosas em termos financeiros, como é o caso de pneus, medicamentos e cigarros.
Acostumados aos riscos das estradas, esses motoristas resumem os eventuais cuidados extras no transporte de cargas perigosas com palavras simples, que em princípio deveriam ser utilizadas por todos os motoristas: bom senso, cuidados nas ultrapassagens, controle da velocidade adequada e manter uma distância razoável dos demais veículos.
Mas, para encontrar motoristas que utilizem essas recomendações no trecho não é tarefa fácil, conforme admite o gerente comercial da Transportes Alpes Ltda., de Flores da Cunha/RS, Jerônimo Mioranza, 26 anos. Segundo ele, os jovens estão optando por profissões menos perigosas, mais rentáveis e que fiquem próximas do lugar onde moram. Os que se interessam em seguir a profissão geralmente são filhos ou parentes de motoristas, explica.
Lembra que a Alpes, com uma frota própria de 20 caminhões, ampliada agora com a compra de quatro modelos Volvo e dois Mercedes-Benz equipados com tanques para o transporte de produtos líquidos – determina que seus motoristas tenham todos os cursos exigidos por lei rigorosamente atualizados. Além disso, preocupa-se em mantê-los atualizados com as novas tecnologias embarcadas.
Mioranza salienta que a empresa transporta vários tipos de produtos líquidos, entre os quais o álcool neutro, inflamável e considerado carga perigosa. E como nunca sabe quando um motorista vai precisar fazer aquele tipo de transporte, ou para que localidade, todos precisam estar muito bem preparados para qualquer solicitação, explica.
Um dos mais antigos estradeiros da Transportes Alpes Ltda., Velucino Pontel, 61 anos e 41 de estrada, conta que nunca se descuidou de se manter atualizado com as novas tecnologias dos caminhões e com os cursos para cargas perigosas ou de direção defensiva. Com 16 anos nessa empresa, garante que está pronto para dirigir caminhão com qualquer tipo de carga, sempre com os mesmos cuidados. Ele diz que todos os caminhões são novos, equipados conforme as determinações da lei, restando ao motorista apenas ser cuidadoso e agir de acordo com as circunstâncias.
Até agora – segundo ele – todas as viagens transcorrem sem problemas, “dentro da mais perfeita normalidade”. Além do curso para movimentação de cargas perigosas e de direção defensiva, ele também está habilitado para o transporte de passageiros e ônibus escolar. “Afinal, é sempre bom estar prevenido”, ressalta sorrindo.
Outro tanqueiro acostumado ao transporte de combustíveis é Eliander Wegher, 28 anos e dois de profissão. Ele dirige uma carreta tanque com capacidade para 40 mil litros que pode estar carregado com diesel, gasolina ou álcool, dependendo das necessidades dos postos que abastece. Conta que começou cedo na profisão, no interior de Caxias do Sul/RS, onde reside.
Trabalhou como frentista, tirou carteira profissional com todos os cursos e conseguiu um emprego de motorista para o transporte de combustíveis da distribuidora para uma rede de postos da empresa. Garante que cuida de todos os procedimentos de segurança no momento da carga e descarga, sobretudo do aterramento na hora de transferir o combustível para os tanques, nos postos. “É preciso aterrar primeiro no piso e depois no caminhão para evitar faísca da eletricidade estática”, ensina.
Depois, os cuidados indispensáveis com o isolamento da área com cones, e sempre usar luvas e manter o kit de emergência à mão, afirma. Além disso, é importante dirigir com cautela, e manter distância dos demais veículos, estar atento nas curvas e manter uma velocidade constante de acordo com a sinalização e as condições do tempo e da estrada.
Wegher reconhece que é um trabalho perigoso, ao mesmo tempo lembra que é preciso trabalhar e se considera um motorista muito cuidadoso. Faz todos os cursos de segurança e segue à risca os ensinamentos que recebe. Alguns, por exemplo, são bem difíceis, como o de somente estacionar em locais permitidos para cargas perigosas, que não existem em nenhum dos estabelecimentos por onde passa. “Assim, quando preciso parar, escolho um lugar mais afastado dos outros caminhões ou automóveis para evitar qualquer tipo de transtorno”, explica. Para Hugomar Ghiotto, 42 anos, 22 de profissão e há 16 “no tanque”, o transporte de combustíveis não tem “nenhum mistério”. Ele não revela se tem medo ou não da carga inflamável, apenas garante que toma todas as precauções necessárias e segue as orientações da empresa e dos cursos que fez e faz para essa atividade. Quando vai encher os tanques de combustível, as normas de segurança no pátio da distribuidora são muito rígidas. E depois, na estrada, os cuidados são redobrados.
Novamente, ao descarregar nos postos, é preciso seguir todas as orientações técnicas como o uso de fio terra, luvas, sinalização e isolamento do local. “Mesmo assim, de vez em quando aparece algum gaiato fumando por perto, uma irresponsabilidade”, garante. Hugomar gosta desse tipo de transporte, que lhe permite ficar mais perto de casa e da família. Ele dirige uma carreta bitrem, com dois tanques. Já trabalhou na rota para o Norte e Nordeste, mas agora está mais satisfeito. Tem carteira assinada, carga certa e as viagens são mais curtas. Natural de Dom Pedrito/RS, Antônio Vagner Arrué Ortiz, 34 anos e 15 de estrada, trabalhou no transporte de passageiros e está há cinco meses ao volante de uma carreta tanque com capacidade para 42 mil litros de combustível, que pode ser diesel, gasolina ou álcool. Ele também destaca a necessidade de ser extremamente cuidadoso nas operações de carga e descarga, além da atenção redobrada nas estradas, “onde não basta cuidar de si, é preciso cuidar dos outros”, conforme diz. A vantagem desse trabalho é ficar mais perto de casa, porém, como é preciso estar na fila da distribuidora às 4h da manhã, é necessário dormir na cabine e só vai para casa nos finais de semana. Mesmo assim não se queixa. Se estivesse dirigindo uma carreta para o centro do País ou em viagens internacionais as oportunidades de ficar com a família seriam menores, pondera o tanqueiro Arrué Ortiz.
Cláudio Hindersmann, natural de Arroio do Tigre/RS, tem 34 anos, 12 de profissão e nove no transporte de combustíveis. Começou como auxiliar de logística na empresa, e como gostava de dirigir caminhões, aprendeu a profissão e acabou sendo promovido a motorista. Trabalhou seis anos no transporte de carga seca, foi transferido para o combustível e gostou. Mesmo trabalhando para uma empresa de Flores da Cunha/RS, a cerca de 130 quilômetros da distribuidora, só tem os finais de semana livres. Isso porque precisa carregar muito cedo, de madrugada, enfrentando uma fila de uns 40 caminhões. Ele é casado e pai de dois filhos. Lembra que apesar de trabalhar numa rota curta e perto de casa tem pouco tempo para ficar com a família, imagina como seria se viajasse para longe. Sabe de um colega que ficou 90 dias viajando. “Uma barbaridade”. Cláudio garante que está feliz com o trabalho, com carteira assinada e ainda um extra por insalubridade. É um emprego fixo, com carga certa, caminhão bom e os riscos são inerentes à atividade. “A gente precisa fazer tudo certo, de acordo com as normas para evitar qualquer tipo de acidente e, se acontecer, saber como resolver na hora”, explica. O analista de logística da Ditrento – Postos e Logística Ltda., de Flores da Cunha/RS, Adriano Malikoski, 29 anos, conta que a empresa atua há 25 anos no setor de combustíveis e distribuição de açúcar. São donos de uma rede de 35 postos de combustíveis na serra gaúcha, das bandeiras Petrobras, Shell e Megapetro e de uma frota de 23 caminhões, cinco deles utilizados para o transporte do combustível para os seus postos.
Segundo ele, o grande problema dos transportadores atualmente é encontrar bons motoristas, pessoas idôneas, preparadas e com horário flexível para viagens. Ressalta que entre os jovens são poucos os que querem seguir a profissão de motorista de caminhão, preferindo outras atividades. Segundo ele, os jovens que gostam de caminhão geralmente são filhos de motoristas ou têm alguém na família ligado ao setor de transportes. Defende, também, a necessidade de se investir na profissionalização dos novos carreteiros, para que estejam preparados para os tempos atuais, como caminhões cada vez mais modernos e as exigências do setor.