Por Elizabete Vasconcelos

Proteção divina. Esta é uma das coisas que quase todo estradeiro pede ao sair para mais um dia de trabalho. Isso é mais comum ainda para o motorista que terá como rota uma das estradas conhecidas por “rodovia da morte”. Como se não fosse suficiente estar sempre atento ao comportamento de motoristas imprudentes, ou à conservação das vias, o carreteiro tem, ainda, de se preocupar com possíveis erros técnicos nos projetos ou com a sinalização ineficiente, principalmente quando o assunto são as curvas.

Números da Pesquisa Rodoviária da CNT (Confederação Nacional do Transporte), realizada em 2011, mostram que em 36,4% dos trechos pesquisados (33.736 quilômetros) foi observada a presença de pelo menos uma curva perigosa. A situação é ainda mais alarmante quando levado em consideração que em apenas 13,1% delas há sinalização satisfatória (placas visíveis e defensas completas). De acordo com a análise, 33,9% das vias avaliadas não possuem placas, mas contam com defensas. Outras 6,9% possuem placas, mas não têm defensas. Além disso, outras 46,1% das vias com curvas perigosas estão totalmente inseguras (não possuem placas ou defensas).

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Segundo recomendação de especialista, caminhões devem manter velocidade inferior ao indicado nas placas de sinalização

Neste cenário, o engenheiro Sérgio Ejzenberg – que pesquisou o tema para sua dissertação de mestrado na Poli/USP -, destaca ainda que muitas vezes os projetos não consideram o risco de tombamento de veículos grandes. “Os critérios de projeto geométrico das curvas ignoram a propensão dos caminhões e ônibus ao tombamento lateral, confiando apenas nas forças de atrito e na superelevação da via para manutenção do veículo em trajetória segura”, argumenta. De acordo com o engenheiro, os veículos articulados são mais propensos ao tombamento lateral. Segundo ele, desses veículos, os reboques correm mais riscos do que os semirreboques. “Mas é preciso muita atenção para a lotação do veículo e para a amarração e posicionamento da carga. Normalmente, tombam os veículos lotados, com cargas altas, mal amarradas e posicionadas de forma incorreta”, explica.

Outros levantamentos realizados sobre o assunto revelam ainda que, além dos riscos de tombamento (devido a instabilidade do caminhão por conta de sua altura), outro perigo comum nas curvas é a perda de aderência, que leva o veículo involuntariamente para o lado de fora da curva, podendo bater em outros ou no muro de proteção. Para solucionar este ponto, seria necessário a “sobrelevação”, também chamada de “superelevação”. Isso quer dizer que o lado de fora da curva tem que ser um pouco mais alto que o lado de dentro, ou seja, ser inclinada. Se essa medida for adotada, é possível aumentar a força centrípeta (que puxa para dentro), aumentando a segurança.

Segundo Sérgio Ejzenberg, existem soluções mais simples e baratas. “Basta sinalizar as curvas das rodovias existentes com velocidades máximas diferenciadas para veículos leves e pesados. Essa diferenciação inclusive já é feita nos trechos retos das rodovias para a fiscalização de excesso de velocidade”, destaca. Para as novas rodovias, o especialista recomenda “especial atenção para evitar curvas de menores raios, que são mais perigosas para veículos pesados”. Enquanto essas ações não são realizadas, o engenheiro recomenda que os motoristas de caminhão fiquem atentos. “É preciso alertar os condutores de veículos pesados que existe risco de tombamento lateral em curvas, mesmo obedecendo os limites de velocidade recomendados. Dependendo do tipo de carga e do veículo, pode não existir margem de segurança”, garante. Ele destaca também que o carreteiro precisa identificar com antecedência a situação de risco de tombamento e reduzir a velocidade de forma compatível. “Essas situações perigosas são lotação máxima ou próximo da máxima, carga alta e curva fechada. Além disso, tudo se agrava quando a curva é descendente e o veículo for articulado”. Segundo Ejzenberg, enquanto não se adota a sinalização diferenciada para veículos pesados nas curvas, o mais prudente é manter, nestas circunstâncias, velocidade de 20 a 30 quilômetros inferior ao limite recomendado nas sinalizações.

Posicionamento do Dnit
Procurado pela reportagem da Revista O Carreteiro, o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura) – responsável pelos manuais de projetos e pela sinalização em boa parte das estradas – afirmou que o manual em vigência considera veículos leves e pesados nos projetos. No entanto, como nos últimos anos, chegaram a mais de quarenta as configurações certificadas pelo Contran, inclusive muitas combinações de veículos de carga com sete ou mais eixos, foi realizada uma ampla pesquisa denominada de “Estudo dos Impactos do Bitrem nas Rodovias Federais Brasileiras”, em que se recomenda a adoção de mais cinco novos veículos pesados no projeto.

O órgão disse ainda, por meio de sua assessoria de imprensa, que todas estas modificações vão ser contempladas na revisão do manual – que deve ser realizada em breve – de modo a contribuir assim para a prevenção de acidentes em rodovias futuras. Quanto à sinalização, o Departamento destaca que no “caso de pista dupla é mais viável fazer distinção de velocidade, pois os veículos pesados ficariam na faixa da direita e os mais leves na faixa da esquerda, porém esta distinção também é utilizada em alguns segmentos de pista simples”. No entanto de acordo com o orgão, “a distinção de velocidade para veículos nas curvas não seria uma solução para redução de acidentes”.