Por Daniela Giopato

Sensação de liberdade, oportunidade de conhecer lugares e pessoas diferentes, vivenciar diversas situações a cada parada e ser reconhecido como herói eram os principais atrativos da profissão de motorista de caminhão na década de 70. Incentivados, na maioria das vezes, pelo pai, irmão ou parente próximo, muitos jovens abandonaram os estudos acreditando que seriam os donos do seu próprio negócio trabalhando na estrada, livres, com poder de ir e vir, e ainda com perspectiva de obter sucesso profissional.

Para Flavio Benatti, na década de 70 a profissão era mais valorizada pela sociedade, que enxergava o caminhão como um meio de conhecer as novidades
Para Flavio Benatti, na década de 70 a profissão era mais valorizada pela sociedade, que enxergava o caminhão como um meio de conhecer as novidades

Motoristas veteranos lembram que era fácil conseguir frete, havia menos roubos de carga e os transportadores exigiam apenas a carteira de habilitação do motorista e uma condução responsável. A profissão era vista com romantismo e encarada como uma alternativa prazerosa de ganhar dinheiro. “Acredito que naquela época, apesar de o caminhão não ser tão evoluído e a infraestrutura no Brasil ser pior do que é hoje, a profissão era mais valorizada pela sociedade, que enxergava o caminhão como o principal meio para ter acesso às novidades”, explica Flávio Benatti, presidente da NTC & Logística.

Para se manter no mercado, os carreteiros começaram a buscar uma formação mais adequada e participar de cursos
Para se manter no mercado, os carreteiros começaram a buscar uma formação mais adequada e participar de cursos

Em quatro décadas, a tecnologia embarcada chegou aos caminhões e os transportadores passaram a exigir profissionais qualificados para conduzir os seus veículos. Atualmente, há mais exigências para se conseguir frete. É preciso, entre outras coisas, ter um caminhão em boas condições de conservação, e de preferência com aparelho de rastreamento instalado, cursos profissionalizantes, cadastro em seguradora e experiência comprovada.

As novas exigências dos transportadores impulsionaram a profissionalização do motorista de caminhão
As novas exigências dos transportadores impulsionaram a profissionalização do motorista de caminhão

Com o passar dos anos, o autônomo foi perdendo o poder de compra e, sem alternativas, viu a sua frota envelhecer e ficar pouco competitiva no mercado. Para se ter uma ideia, dados da Agência Nacional de Transportes Terrestres &chaves1;ANTT&chaves2; mostram que a idade média dos 1.083.669 veículos que estão nas mãos dos autônomos é de 22,2 anos.

Pesquisa realizada pelo Sest Senat com mil motoristas, em 35 municípios de 11 Estados, mostrou que 44% dos autônomos definem a profissão como sacrifício, 18% como solitária, e apenas 20% ainda têm a imagem de liberdade. Além disso, o trabalho mostra que 27% da sociedade passou a ver o carreteiro como um profissional irresponsável, 19% como imprudente, e apenas 16% ainda o considera um profissional importante para a sociedade.

“No passado, existiu o romantismo que impulsionou milhares de jovens a seguir a profissão. Hoje, existe o risco, as exigências, e todos estão diante de um quadro de aumento de roubo de cargas e de insegurança, da falta de frete e alta competitividade. Poucos querem se submeter a arriscar a vida, e assim os próprios motoristas de caminhão pararam de incentivar seus filhos a ganhar a vida na estrada”, afirma o coronel da reserva do exército Paulo Roberto de Souza, assessor de segurança do Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região &chaves1;Setcesp&chaves2;.

Benatti revela que a chegada da tecnologia da informação também foi outro fator que contribuiu para a queda no número de jovens motoristas, que passaram a ter a oportunidade de se inteirar mais das dificuldades da profissão antes de se decidir. Acrescenta que, aos poucos, perceberam que ser carreteiro passou de uma aventura prazerosa a uma atividade perigosa e desvalorizada. “O conjunto de situações negativas – como a falta de infraestrutura, estradas malconservadas, congestionamento urbano, entre outros problemas – provocou o desinteresse entre os jovens, que começaram a optar por outras profissões. Ainda existem interessados, mas em relação à década de 70 é uma parcela muito pequena”, destaca.

Apesar dessa nova realidade do transporte ter acabado com toda a poesia que envolvia a atividade, por outro lado contribuiu para profissionalizar o carreteiro. E, para se manter no mercado, ele se viu obrigado a buscar uma formação mais adequada e participar de cursos, treinamentos e escolas direcionadas a melhorar seu perfil profissional.

Atualmente, conforme alerta Benatti, é importante que o aspirante à profissão conheça de perto tudo o que envolve esse universo do transporte, tenha noção do que é um caminhão e como o veículo se comporta, por exemplo, nos centros urbanos, onde disputa diariamente espaço com carros de passeio. “A recomendação vale também para os que já exercem a atividade. É essencial estar atento às novidades e saber lidar com as tecnologias e até mesmo com o cliente. Todo esse conjunto se tornou um diferencial no mercado”, explica.