Por Daniela Giopato
Uma das obras mais importantes e talvez a mais esperada pelos motoristas de caminhão que trafegam pela rodovia Régis Bittencourt – no trecho São Paulo e Curitiba – pode finalmente sair do papel. Isso porque, a concessionária Autopista Régis Bittencourt anunciou, no início deste ano, que o IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, havia emitido a Licença de Instalação (LI) autorizando o início da duplicação do trecho da Serra do Cafezal.
Conforme informações da concessionária, a extensão total da duplicação é de 30 quilômetros (entre o km 336,7 (Juquitiba/SP) e o km 367 (Miracatu/SP). Deste total, 11 estão duplicados e já se encontram em operação – entre o km 336,7 e o km 344, e entre o km 363 e o km 367. As obras dos 19 quilômetros restantes serão realizadas em aproximadamente quatro anos e deverão começar em abril deste ano, já que a concessionária tem ainda de cumprir as condições administrativas e ambientais referentes à fauna e flora listadas na Licença de Instalação.
O projeto de duplicação inclui uma pista com três faixas de tráfego na subida (sentido São Paulo) e duas faixas na descida (sentido Curitiba). Os trabalhos envolverão obras de artes especiais para minimizar o impacto ambiental. O projeto inclui a construção de 35 pontes e viadutos (total de sete quilômetros) e quatro túneis (total de 1,8 quilômetros). A duplicação desse trecho será realizada de maneira a deixar preparada a infraestrutura para futura implantação da quarta faixa na subida e uma terceira na descida.
A Régis Bittencourt é considerada uma importante ligação entre as regiões Sudeste e Sul do País, com 401,6 km de extensão – correspondente ao trecho entre as capitais de São Paulo/SP e Curitiba/PR. Esta obra, segundo a concessionária responsável pelo trecho, vai influenciar de forma direta na melhoria do escoamento do tráfego para o Sul, além de uma mudança importante para desenvolver as relações do Brasil com o Mercosul.
Para o departamento de comunicação da 6ª Superintendência da Polícia Rodoviária Federal, a duplicação da Serra do Cafezal representa uma grande obra social. A facilidade de acesso que irá proporcionar aos bairros localizados no meio da serra e aos demais municípios do Vale do Ribeira certamente vai refletir em um melhor desenvolvimento dessa região, uma das mais pobres do Estado de São Paulo. Outros pontos abordados pela PRF é a redução dos custos do transporte entre Estados do Sul do País e as demais regiões. Além do número de acidentes, feridos e mortos no trecho de serra da Régis Bittencourt. A média do 2º semestre de 2012 foi de aproximadamente 23 acidentes por mês, totalizando 137 no segundo semestre.
Nos dias de maior movimento (quarta, quinta e sexta-feira) e na configuração de pista simples que o trecho se encontra atualmente, a PRF estima que pode levar até 20 horas para que o tráfego se normalize. Para os motoristas de caminhão que utilizam o trecho com frequência – estima-se que 26 mil veículos passem pelo local e desse total cerca de 70% são pesados – este tipo de situação pode resultar em atraso nas entregas e estresse, além de aumentar os custos com manutenção e diesel.
Com pista dupla no trecho de serra, o aumento da segurança no trecho e a redução no tempo da viagem são os itens com maior destaque na visão dos carreteiros. Rodrigo Frandaloso, 30 anos de idade e cinco anos de profissão, de Uruguaiana/RS, atualmente na rota São Paulo-Buenos Aires, lembra-se de uma ocasião de muito trânsito no local quando ficou sem freio. “Isso mesmo com a manutenção preventiva do seu caminhão em dia e por sorte consegui parar em segurança”, recorda. Em sua opinião, os 30 km de serra são desgastantes para o motorista, um absurdo demorar até quatro horas ou mais para percorrê-los, dependendo do dia.
“Cheguei a ficar mais de seis horas para subir a Serra. O pior de tudo é não ter posto de serviço próximo para qualquer emergência, sem contar a falta de segurança”, lamentou Frandaloso, esperançoso de que se as obras de duplicação forem realmente concluídas os motoristas terão menos problemas naquele trecho. Apesar de também achar um absurdo a demora para duplicar um trecho tão importante, o autônomo de Porto Xirim/RS, Vilmar Stulpen, 38 anos, 15 de profissão, faz a rota São Paulo-Buenos Aires, diz ter se acostumado com os congestionamentos na Serra do Cafezal. Geralmente fica entre três e quatro horas parado, sendo que a subida no domingo e a descida entre quarta e sexta-feira são mais complicadas. Para evitar estresse, ele diz que procura organizar suas viagens para fugir desses dias de maior concentração de veículos.
“A falta de segurança é o que me deixa mais tenso quando enfrento a serra. Sem contar no gasto com diesel. A duplicação deveria ter acontecido há muito mais tempo”, comenta. Stulpen tem opinião de que, hoje, quando se fala na construção de mais uma pista trata-se apenas de uma forma de amenizar o problema, porque o trecho não atende mais o volume diário de veículos. “Conheço muitos colegas que preferem perder o frete a aceitar passar pela Serra do Cafezal”, finaliza. Além da segurança, ele destaca que o consumo de diesel e de embreagem são muito altos para subir o trecho.
Outro carreteiro acostumado com o trânsito no local é Luis Vanderlei Fagundes, 47 anos e 10 de profissão, de Venâncio Aires/RS. Ele lembra que o trecho deveria ter sido duplicado há 20 anos, e considera absurdo o que os motoristas fazem no local. “A imprudência é rotina, por isso é frequente acontecer tombamento de carreta. Por isso acho que a velocidade no local deveria ser reduzida de 60 para 40km/hora”, sugere Fagundes acreditando que a duplicação vai acabar com muitos problemas. “Mas é preciso reduzir a velocidade”, reforça.
Assim como o colega, Rubens de Barros Almeida, 37 anos, 15 de profissão, Itaqui/RS, faz o trecho Uruguaiana/SP, destaca que um dos grandes problemas na Serra do Cafezal é também a falta de paciência e ansiedade de muitos motoristas, principalmente de veículos de passeio, que se arriscam nas ultrapassagens facilitando a ocorrência de acidentes. Ele destaca também o quanto o trecho fica perigoso em dias de chuva, exigindo mais a concentração por parte dos motoristas, e também o aumento das dificuldades pelo maior volume de veículos nos três primeiros meses do ano, período de férias.
“No Natal enfrentei oito horas para descer, foi muito cansativo. Era carro ultrapassando caminhões pelo acostamento e veículos quebrados. Por isso a duplicação vai ajudar bastante, mas penso que a questão da velocidade deve ser repensada para contribuir com a redução de acidentes”, alerta. Além da Serra do Cafezal, Rubens afirma que outros trechos também merecem atenção e cita a Curva da Cigana, próxima a Curitiba/PR.
Para o catarinense de Chapecó, Sergio Aloizio de Lima Furtado, 30 anos de estrada e 51 de idade, a duplicação já estava mais do que na hora de acontecer. “É inviável ficar parado quase meio dia no local, principalmente pela falta de segurança. São os 30 quilômetros mais tensos da viagem entre São Paulo e Curitiba. Ficar parado na Serra à noite é estar sujeito a ações de ladrões, afinal não tem fiscalização”, reclama.
Ele também concorda que a velocidade no local deve ser reduzida, vê na instalação de radares uma possível solução para impedir que os motoristas irresponsáveis excedam a velocidade na descida da Serra. “Se isso não for feito, o risco de acidentes vai permanecer. Nunca vou me esquecer de uma ocasião que presenciei uma carreta que descia em velocidade bater na traseira de um carro de passeio e levar outros 10, provocando a morte de pessoas”, lembra.
A falta de consciência dos motoristas é ressaltada também pelo catarinense de Concordia, Hugo Zanelato, 58 anos de idade e 37 de profissão. “As circunstâncias enfrentadas pelos motoristas no trânsito da Serra do Cafezal são desumanas e sem segurança. Todos têm pressa para sair logo do trecho local e isso contribui para que se pratiquem abusos e cometam infrações, aumentando as chances de acidentes”, desabafa.
Para Hugo, as dificuldades impostas para liberar a duplicação como a licença ambiental é coisa de quem realmente não sente na pele o que o motorista de caminhão enfrenta no dia a dia na estrada. “São apenas 30km, porque tanta demora? Um trecho de 400 quilômetros entre São Paulo e Curitiba que normalmente levaria entre 6 e 7 horas para ser percorrido está demorando até 12 horas. Um absurdo o gasto de tempo, diesel e manutenção”, lamenta.
Outra questão importante levantada pelo carreteiro está relacionada à lei 12.619, que regulamenta a profissão do motorista. “A vida do motorista está realmente complicada, porque não existem muitos postos com infraestrutura adequada para receber os caminhões. Como vamos cumprir as regras da lei se não existe ponto de parada. Esse trecho mesmo da Régis é super complicado”, questiona.
Com mais de 30 anos de estrada, o experiente Ivanir Marques, de Palmas/PR, comenta que viu as dificuldades dos motoristas de caminhão na Serra do Cafezal aumentarem ao longo dos anos. “Há 30 anos, o volume de veículos no local era bem menor não havia tanta dificuldade de ficar parado no local. Hoje é difícil de prever quantas horas serão desperdiçadas para subir ou descer a Serra. Além disso, todos têm medo de assalto”, afirma. Com o aumento de veículos na estrada, os acidentes aumentaram, mas na opinião de Ivanir, 100% das ocorrências são causados pela imprudência do motorista que não tem paciência ou que utiliza rebite ou álcool para aguentar o trabalho. “A duplicação é mais do que necessária, vai aumentar a fluidez do trânsito e, quem sabe, até diminuir o número de acidentes”, estima.
Em relação à fiscalização no trecho, a assessoria de comunicação da 6ª Superintendência da PRF informou que entre setembro do ano passado e janeiro de 2013, foi dobrado o efetivo operacional na Régis Bittencourt. O trecho da Serra do Cafezal, especificamente, foi um dos maiores beneficiados, justamente com o objetivo de reduzir o número de acidentes, feridos e mortos, além de combater a crescente criminalidade na região serrana.
Segundo estatísticas a PRF, cerca de 90% dos acidentes ocorrem por falha humana. Colisão traseira lidera as ocorrências, 30,66% dos registros; colisão lateral 14,60%; tombamento 12,41% e saída de pista 10,95%. De acordo com a PRF, mesmo com a duplicação da serra e a instalação de lombadas eletrônicas – as duas principais soluções para a redução de acidentes -, a situação dificilmente mudará se não houver colaboração dos motoristas, que precisam enquadrar-se nas novas regras de tempo de direção e respeitar os limites de velocidade em trechos críticos.