Por Alessandra Sales Fotos Calam Sanderson e Rafael Almeida
Muitos motoristas viajam em companhia da mulher para afastar a solidão, porém, é comum enfrentarem problemas para entrarem acompanhados em empresas. A proibição de esposas ou outros acompanhantes dos carreteiros no processo de carga ou descarga é praticada por várias empresas e, por outro lado, é claro, não faltam críticas e em muitos casos até mesmo procedentes, principalmente devido ao longo tempo que permanecem do lado de fora dos portões das empresas expostas ao perigo de assalto e até de assédios de pessoas mal intencionadas. Para os carreteiros, a ordem das empresas podem e devem ser cumpridas, desde que haja locais apropriados para receber suas famílias.
Situação difícil viveu a família do carreteiro José Maria de Souza, quando chegou em Santos com um contêiner de café. Ele lembra que foi impedido de descarregar e enquanto resolvia o problema com a empresa, sua esposa, Helena Maria de Souza, e o filho João Victor, de 6 anos, tiveram de esperar do lado de fora, no meio da lama. “Em alguns terminais não têm jeito, é preciso esconder esposa e filho, caso contrário, o guarda ameaça chamar o Conselho Tutelar, por envolver criança menor de idade”, explica. Para José Maria não há muita escolha nessas horas. “Hoje nosso filho já sabe a hora certa de se esconder. É muito chato tudo isso, acredito que o ideal mesmo seria melhorar a estrutura dos locais de espera, porque às vezes é madrugada e não temos onde ficar”, desabafa Helena Maria.
Situação semelhante tem vivido Ivan Ferreira da Silva Jr, 38, de Lorena/SP, e sua esposa Patrícia Rodrigues de Farias, de 32 anos. Mesmo grávida de sete meses ela conta que sua entrada não é permitida e muito menos facilitada. Patrícia explica que a decisão de viajar com o marido se deve ao fato dele chegar a ficar até 15 dias fora de casa e nem sempre consegue estar por perto. “É importante estar próximo dela, até mesmo porque com gravidez não se brinca”, comenta Ivan.
Na noite anterior à entrevista da Revista O Carreteiro, Ivan havia descarregado em Taubaté/SP e chovia muito naquela ocasião. Sem lugar para deixar sua esposa esperar, ele não pensou duas vezes e escondeu Patrícia na cama do caminhão. “Não quis nem saber, puxei as cortinas e descarreguei a carga com ela. Não poderia permitir minha mulher, grávida, sozinha na chuva”, revela.
Apesar da revolta, o motorista afirma viver uma situação corriqueira e somente quem está na estrada no dia a dia enfrenta esses obstáculos. Já Patrícia diz que pede para seu marido não se preocupar com ela e quando a deixam entrar, geralmente, ela pede um banquinho para sentar, embora nem sempre seja disponibilizado. “Se não for possível espero de três a quatro horas em pé. É muito raro alguém se preocupar com nós, mulheres de motoristas de caminhão”, finaliza.
Ciente das dificuldades encontradas, o autônomo Marcos Antônio Dutra Rezende, 40 anos de idade, de Carmópolis de Minas/MG, espera o período de férias para viajar com a família. Com 20 anos de experiência, reconhece que apesar de muita coisa não andar bem há empresas estruturadas oferecendo locais seguros para as companheiras dos motoristas. Mas, como tudo direcionado ao autônomo não pode ser considerado regra, há exceções em grande parte. “A burocracia é tanta que chega a ser comum esconder a família no caminhão, como já fiz com minha esposa e meu filho. Por sorte, ninguém viu. Fiz isso por necessidade, não havia lugar onde eles pudessem esperar por mim”, justifica.
Sua esposa Rute Angélica Faleiro, 39 anos de idade, recordou que em uma das viagens chegou a esperar pelo marido cerca de 20 horas. Ela costuma acompanhá-lo de duas a três vezes por ano, devido à escola do filho e ao seu trabalho. “Uma vez, em Pirapora/MG, já esperei sete horas em pleno serrado, e nem havia lugar para sentar. Minha sorte foi encontrar uma barraca de lanches, e me alimentei ali mesmo enquanto esperava por ele”, lembrou.
Apesar das proibições, o que mais se tem visto por aí são motoristas de caminhão viajando ao lado da família e driblando as ordens das empresas, em grande maioria sem estrutura para receber os acompanhantes. “Sempre que posso levo minha esposa comigo”, é o que diz o carreteiro Jander Lucas da Silva, 33 anos de idade, de Monsenhor Paulo/MG. Há 14 anos na estrada, o autônomo atualmente transporta portas e janelas. Por lidar com estabelecimentos de materiais de construção, o motorista explica que não enfrenta muitos problemas para levar sua esposa Simone Cristina Lemes Silva, 31 de anos de idade. “Sei bem como é quando há impedimentos, por enquanto estou mais tranquilo com isso, mas se houvesse iria procurar postos seguros e confiantes para deixá-la durante o carregamento”, disse.
Para o mineiro Deusdete Manso, 48 de idade, de São Gonçalo do Sapucaí, também transportador de portas e janelas, por mais que se respeite as regras das empresas é complicado trabalhar tranquilo, sabendo que a esposa está do lado de fora. “Já vivi algumas situações constrangedoras com minha mulher Vitória Carvalho Manso, 37 anos de idade, mas hoje, graças a Deus, as coisas estão mais fáceis em razão da carga que transporto”, garante. Mesmo assim, o motorista diz ser fundamental haver um local seguro para as famílias dos carreteiros aguardarem enquanto é feito a operação de carga ou descarga. Para Vitória, ela sempre aguardará o esposo terminar o trabalho, sem prejudicá-lo. “Já fiquei horas à espera dele, mas o importante é estarmos juntos e em segurança”, finaliza.