Por Evilazio de Oliveira
A safra brasileira de grãos prevista para 2009 será de 135,32 milhões de toneladas, segundo estimativa da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), volume 6,1% inferior à safra 2007/2008. Para o Rio Grande do Sul, a previsão é de uma colheita de 22,49 toneladas de grãos. A expectativa é que a maior produtividade da soja e do arroz revertam a atual projeção de queda de 0,6% em relação ao ciclo anterior, com 22,63 milhões de toneladas. A colheita de arroz é recorde no Estado e a soja pode chegar a nove milhões de toneladas. No entanto, abundância não significa garantia de lucro por causa dos altos custos de produção, afirmam os lavoureiros. Mesmo assim, com os bons resultados, o setor do transporte rodoviário de cargas tem frete garantido por alguns meses e, claro, com possibilidade de remuneração acima da média.
O presidente da Associação dos Arrozeiros de Uruguaiana/RS, Walter Arns, lembra que o desaquecimento da economia e a redução do fluxo de caminhões utilizados na importação e exportação de produtos, pela travessia internacional entre Brasil e Argentina – Uruguaiana e Paso de los Libres – se reflete na maior oferta de caminhões para o transporte da atual safra. Com isso, acontece a natural negociação nos valores dos fretes, que de certa maneira pode favorecer um pouco ao produtor, “mas não muito”, conforme acentua.
Vale lembrar que Uruguaiana e Barra do Quaraí – na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul – são considerados os maiores produtores de arroz do País, com uma previsão de colher 74 milhões de sacas, ou 700 mil toneladas, o que daria em torno de 17.500 viagens de caminhão da lavoura aos silos ou cooperativas. Daí, para os principais centros consumidores, o arroz é transportado em caminhões maiores e uma parte por transporte ferroviário.
Walter Arns destaca que como a safra na região é a primeira a ser colhida, carreteiros de todas as partes chegam para o transporte, ao mesmo tempo em que parte migra para outras regiões produtoras, demonstrando a dinamicidade do setor. Ressalta que embora os produtores estejam numa posição mais confortável para negociar preços de fretes, certamente também é um bom momento para os carreteiros, com o ingresso de mais recursos de caixa para a renovação de frota ou mesmo para uma manutenção mais adequada de seus caminhões.
Valdecir Ângelo da Silva, 30 anos e sete de estrada – natural de Guaíra/PR – ainda está pagando o financiamento do seu Mercedes-Benz ano 95, comprado há um ano e meio. Até agora ele puxava carvão do Paraguai para Minas Gerais, e no retorno levava o que aparecesse, já que o frete é mais difícil. Numa de suas viagens recentes ele trouxe trigo para o Rio Grande do Sul e já mantinha expectativa de trabalhar na safra do Mato Grosso. Afirma que já tem trabalho garantido no transporte de grãos da lavoura para os silos, num trajeto de 80 quilômetros e com uma remuneração de R$ 7 mil mensais, livres do combustível e alimentação. A manutenção do caminhão fica por sua conta. E, apesar de ficar inteiramente à disposição do lavoureiro, garante que não tem medo do serviço e com esse dinheiro quer pagar as contas e, se der, adiantar algumas prestações do caminhão. É a primeira vez que Valdecir vai trabalhar no transporte da safra. Está otimista, pois, conforme relato dos colegas de estrada, é lucro garantido.
Outro carreteiro, de Guaíra/PR, João Aparecido da Silva, 52 anos de idade e 30 de profissão, também estava indo, na ocasião, para o Mato Grosso com a intenção de trabalhar na safra. Empregado, ele dirige um Volvo ano 95 com carreta, no território nacional e Paraguai. Segundo afirma, os fretes baixos, custos altos e o excesso de caminhões no trecho estão fazendo com que a vida do carreteiro fique cada vez mais difícil. “Estamos apenas trocando bananas”.
Garante que continuará na estrada, porque carreteiro é “bicho insistente”. Está indo para a safra na esperança de ganhar um pouco mais, todavia, acredita que a situação ainda vai piorar. Lembra que pequenas transportadoras estão quebrando, junto dos autônomos, tudo por conta do grande número de caminhões que fazem concorrência entre si, inviabilizando um frete justo. Acredita que em pouco tempo nem os bancos vão querer tomar de volta os caminhões dos credores, pois não terão mais local para guardá-los.
Natural de Palmeira das Missões/RS, Josemar Somavilla, 46 anos e nove de profissão, dirige um Scania ano 93 com carreta graneleira. Até pouco tempo atrás ele transportava arroz de Rosário do Sul/RS para Ji-Paraná/RO e retornava com milho. Porém, devido à distância e aos altos custos pretende se dedicar ao transporte da safra de soja, que está iniciando. Apesar da grande competição no setor, que faz baratear o frete, Josemar acredita que é situação de pegar ou ficar parado. E, se ficar parado, como é que vai manter a família e pagar as contas, pergunta. Acha que depois da safra a situação do estradeiro vai continuar na mesma, nem pior e nem melhor, com o diesel e pedágios caros, estradas ruins e falta de segurança. “Sempre a mesma coisa”, finaliza.
Dono de um Volvo 94 atrelado a um bitrem, Gilberto Garavaglia, 48 anos de estrada e 30 profissão – natural de Garibaldi/RS – e sempre atuando no transporte de safras, acredita que 2009 não começou bem. Ele afirma que a enorme concorrência dos grandes grupos transportadores e os altos custos de manutenção prejudicam muito o autônomo, que precisa se contentar com as sobras. Os bons fretes ficam com os grandes grupos, que têm poder de negociação, por isso a preferência. Confessa que já pensou em entrar para uma cooperativa de transportes, com a intenção de obter melhores fretes, porém como só tem um caminhão, teria uma despesa a mais no final do mês. Garavaglia lembra que o resultado da safra está bom, mas que em razão da concorrência e dos custos de manutenção, a situação continuará ruim. “É gente de todo o País esperando para carregar”, afirma. Defende o estabelecimento de um valor único para o frete, sem importar se o produto vai ser transportado por caminhões de um grande grupo ou por um autônomo. “Deveria haver igualdade para todos”, sugere.
O carreteiro Ivanir Riboli, 50 anos de idade e 23 de profissão, natural de Sarandi/RS – importante região produtora de soja – trabalhou muito tempo no transporte da lavoura para os silos. Agora, ele dirige um Scania ano 91 e, embora seja ligado à produção rural transporta outro tipo de carga, bem mais leve e mais lucrativa. Trabalha para uma empresa que faz manutenção de silos e armazéns, transportando chapas e material para a irrigação de lavouras. “É uma atividade que evidentemente está relacionada ao bom desempenho da safra, pois sempre é preciso local para armazenar os grãos”, lembra. Além disso, os silos precisam constantemente de reparos, ampliação ou construção de novas unidades. Com isso, no último mês conseguiu ganhar cerca de R$ 7 mil ‘limpinhos’. “Mas, não é sempre que isso acontece”, lembra. A média de ganho fica nos R$ 2 mil e se descuidar passa fome.
Bem ou mal, a lavoura continua sendo a salvação de muita gente que trabalha no trecho – conforme Ivanir Riboli – inclusive muita gente que sai do transporte internacional vai para safra. Agora, sempre há os descontentes, salienta. “Faz parte da natureza humana”.