Por Evilazio de Oliveira

O motorista estradeiro precisa de algumas coisas elementares para sobreviver na profissão, as quais nem sempre estão relacionadas com a parte física do trabalho, atingindo mais o comportamental e emocional, com reflexos evidentes no dia a dia e notados no relacionamento com colegas, nas operações de embarque e desembarque das cargas e, obviamente, no modo de dirigir. Depois de alguns segundos pensando, a maioria acaba concordando num ponto: o que falta, efetivamente, é respeito e reconhecimento pelo profissional e pela atividade exercida. E isso depende de uma mudança no comportamento dos motoristas e empresários, afinal, uma coisa leva a outra, reconhecem.

O gerente comercial da Roglio Logística S.A., com sede em Canoas/RS, David Vaz, 41 anos de idade, lembra que “apesar de tantos movimentos para que este profissional receba um tratamento mais digno, a “estrada” ainda impõe condições perversas que fazem com que ocorra uma desmotivação geral, afastando esta importante figura do volante. A prova disso está na escassez de mão de obra em que o Brasil se encontra no setor de transportes”.

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As condições desfavoráveis levam a uma desmotivação geral, afastando o motorista da atividade e causando a escassez de profissionais, comenta David Vaz

Com uma frota de aproximadamente 100 caminhões entre veículos próprios e agregados, especializada no transporte de produtos químicos e cargas líquidas em geral, a direção da empresa sempre acreditou que o respeito pelo motorista e sua família são a base fundamental para o sucesso de relação profissional duradoura, conforme salienta David Vaz. Segundo ele, “os colaboradores, mais do que empregados, são também parceiros e amigos, para os quais as portas estão sempre abertas para ouvi-los”. Vaz acredita também que a atualização contínua no uso de novas tecnologias e a busca pela capacitação, por parte do motorista, é essencial para que a categoria consiga cada vez mais respeito e valorização. “Desta forma, novos profissionais terão ambição para se desenvolverem nessa carreira tão importante”, acrescenta.

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Esposa e mãe de carreteiros, Jane Marli Regazzon diz que o motorista não recebe reconhecimento e nem a atenção merecida, principalmente por parte dos empresários

Casada com carreteiro e mãe de dois filhos – igualmente carreteiros – Jane Marli Regazzon, 53 anos, residente em Uruguaiana/RS, acompanha de perto, há 22 anos, as atividades do marido e dos filhos no transporte internacional. Segundo ela, o motorista de caminhão não recebe o reconhecimento e nem a atenção pessoal e profissional merecida, sobretudo pelos empresários. “Parece que ninguém quer ver o sacrifício dos motoristas, as dificuldades e as longas esperas para carregar ou descarregar. E ao final, o desrespeito”, diz.

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Para o autônomo Ivan Alexandrino da Silva é preciso gostar muito da estrada para continuar sobrevivendo da atividade de motorista de caminhão

Marli Regazzon reconhece que é preciso também o motorista mudar o comportamento, agindo de maneira mais adequada com os clientes ou mesmo com os colegas nos pontos de paradas. Mesmo assim, sempre há quem se comporte de maneira inadequada contribuindo para denegrir ainda mais a imagem dos estradeiros. Ela acredita que as mudanças devem começar pela apresentação, com roupas limpas, barba feita e cabelo aparado. “Tudo está mudando, os caminhões mais modernos e com muita tecnologia, novos meios de comunicação e o motorista também precisa acompanhar essa evolução”, opina.

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O motorista é maltratado por todos, até mesmo por outras pessoas com quem divide a estrada, mas ele tem parcela de culpa, opina José Adroaldo Neto

Pernambucano de nascimento, e paulistano desde muito pequeno, o carreteiro Ivan Alexandrino da Silva, 65 anos de idade e há 15 no trecho, acredita que os profissionais merecem ser mais valorizados pelos empresários e políticos. Ele é dono de caminhão trucado e com baú fabricado em 2001 e viaja por todo o País transportando caixas eletrônicos para diversos bancos. Queixa-se que há sete anos o valor do frete não é reajustado, enquanto os preços dos insumos continuam aumentando. Por isso reconhece que é preciso gostar muito da estrada para continuar na atividade.

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Para o carreteiro Ari Luiz Madeira, essa imagem negativa foi criada devido ao tratamento com os clientes e o comportamento no trânsito e locais públicos

O autônomo José Adroaldo Carrazzoni Nunes, 43 anos de idade e 10 na profissão, natural de Uruguaiana/RS, dono de uma carreta tracionada por um Fiat 76 equipado com um motor Scania 84, trabalha apenas no Brasil enquanto aguarda autorização para viajar para Argentina e Chile. Em sua opinião, falta reconhecimento e respeito com os carreteiros. “Motorista de caminhão é tratado pior do que cachorro nas empresas, pelas polícias rodoviárias e até mesmo por outras pessoas com que dividem as estradas”, desabafa, reconhecendo que os motoristas também têm uma parcela de culpa por esse tipo de comportamento. Precisam ser mais educados, cuidar da apresentação, ter melhor relacionamento com as pessoas e até mesmo na profissão, fazendo cursos técnicos, se aprimorando, enfim. “Ou a coisa vai ficar cada vez pior para os motoristas de caminhão”, adverte.

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José Gilson de Moraes acha que os motoristas não se valorizam, e sugere que uma mudança na apresentação e no comportamento possam ajudar a melhorar

Na opinião de José Gilson de Moraes, 48 anos de idade e 23 de idade, natural de São Paulo/SP, que trabalha com uma carreta na rota Brasil-Argentina, a profissão de motorista parece não ter nenhum valor. “Não há respeito, é mal remunerada e, de um modo geral, é também malvista pela sociedade”, lamenta. Acredita que a categoria, no conjunto, não sabe se valorizar. Talvez cuidando melhor da apresentação pessoal, no modo de falar e na própria evolução como ser humano. “Como ele quer ser bem tratado se, ele próprio, não se valoriza e contribui para uma imagem negativa”, questiona.

Mais radical ao falar sobre o que o motorista de caminhão precisa para viver na profissão, Ari Luís Baioco Madeira, 37 anos de idade e 10 de direção, é enfático: educação. Natural de Uruguaiana/RS e atuando no transporte internacional, ele lembra que é preciso seguir uma série de regras no trânsito e no tratamento com os clientes. Porém, mesmo sem a intenção de generalizar , a maioria não se comporta de modo civilizado, dentro do que denominou boas relações humanas, e com isso acaba gerando antipatia e falta de respeito pelos motoristas de caminhão.

Madeira afirma que atualmente todos reclamam da falta de reconhecimento e de respeito pela profissão, mas é preciso analisar o comportamento em locais públicos, no restaurante, nas salas de espera das empresas para a liberação dos documentos ou até mesmo nos banheiros e sanitários. Ele destaca que que todos reclamam da sujeira, da imundície dos banheiros e sanitários nos postos de combustíveis, onde suas mulheres e filhos não podem entrar, porém esquecem que são eles mesmo que fazem a sujeira, que não conservam o ambiente limpo. “São novos tempos, e se o motorista não se adaptar não vai ter lugar para ele nesta nova realidade”, conclui.