Por João Geraldo
Fotos Divulgação
Atualmente na Europa, o caminhão é responsável pela movimentação de três quartos das cargas movimentadas por rodovias, uma realidade que o coloca numa condição de espinha dorsal do transporte de mercadorias no continente. Especialistas do setor – e também de outras áreas – avaliam que a dependência do modal rodoviário deverá prosseguir crescendo nas próximas décadas. A estimativa é que até o ano de 2050 os volumes de transporte serão pelo menos três vezes maiores do que hoje.
Embora essa expectativa tenha ares de positiva, e os caminhões que rodam no continente estejam entre os mais modernos do mundo, a realidade aponta necessidade de mudanças no setor para torná-lo mais eficiente. Entre as principais questões se destacam como evitar um colapso total do já crítico tráfego nas rodovias e reduzir de forma significativa o consumo de combustível fóssil, as emissões e os acidentes de trânsito.
O caminho apontado atualmente para se avançar nestes quesitos é o caminhão inteligente, conectado, o qual irá trazer vantagens para as empresas de transporte, motoristas, o meio ambiente e a sociedade em geral. Isso tudo com o uso da Internet, pela qual o veículo estará o tempo todo interligado. Em linha gerais, essa tecnologia vai desenhar um novo rumo no mundo do transporte rodoviário de cargas nos próximos anos. A Daimler Trucks apresentou o protótipo de um caminhão autônomo ao público, pela primeira vez, em 2014, na IAA (feira de veículos comerciais em Hannover, Alemanha).
Esse veículo de carga inteligente já é uma realidade – mesmo de forma incipiente em relação ao que virá a ser no futuro – ecomeçou a modificar o transporte. A Divisão Trucks, do Grupo Daimler – o qual agrega marcas de caminhões como Mercedes-Benz, Freightliner, Western Star, BharatBenz e Mitsubishi Fuso – estabeleceu em 2013 que a conectividade é ponto de sua estratégia corporativa e por conta dessa estratégia, até 2020 a empresa investirá cerca de meio bilhão de Euros na conexão de seus veículos comerciais e também na criação de novos serviços e soluções digitais. Conforme informou o doutor Wolfgang Bernhard, membro do board da Daimler AG e responsável pela Daimler Trucks & Buses, atualmente existem 365 mil veículos comerciais com marcas do grupo que operam de alguma forma conectados em diferentes regiões do planeta.
Os primeiros os resultados práticos do caminhão autônomo e conectado já começaram a ser colhidos pelo Grupo Daimler. Na segunda quinzena de março, a empresa apresentou em Dusseldorf (Alemanha) suas mais recentes ações na área da conectividade, as quais podem ser interpretadas como o início de atuação do caminhão conectado operando de modo semiautônomo.
O que se viu e se encontra em testes na Alemanha é um comboio formado por três caminhões Mercedes-Benz Actros com semirreboque de três eixos operando conectados um ao outro por WIFI, através de um sistema identificado pelo Grupo Daimler como HPC (Highway Pilot Connect). O caminhão conectado ainda depende de legislação para trafegar pelas rodovias, mas o comboio opera com autorização do estado alemão para testar o HPC na estradas e vias públicas do país.
Interligados pela tecnologia da conectividade, os caminhões podem andar de forma autônoma (cada um com um motorista na cabine) e manter sempre a distância de 15 metros entre eles controlada automaticamente. Se houver uma emergência, os veículos freiam juntos em um décimo de segundo e no espaço de poucos metros. As carretas trafegam a 15 metros de distância uma da outra e reconhecem os outros veículos na estrada.
Os caminhões operam com GPS e mapas digitais integrados ao sistema HPC, e quando se aproximam de trevos nas rodovias, ou situações que assim exijam, por segurança aumentam automaticamente a distância entre eles. Quando o veículo percebe que não vai conseguir executar determinada manobra, como mudar de faixa, por exemplo, por segurança é solicitada ajuda do motorista.
Caso um dos caminhões tenha de sair do pelotão para seguir por outra rota, basta o motorista desacoplá-lo do sistema com um leve toque no pedal de freio. Para se conectar ao comboio e fazer parte dele, a conexão é feita por meio de uma tecla no painel de instrumentos e o motorista é avisado quando ele pode entrar no pelotão. Segundo o chefe de engenharia da Daimler Trucks, Sven Ennerst, o comboio é viável com até 10 carretas e o sistema para o futuro é conectar caminhões de diferentes marcas num mesmo pelotão. “Este é o primeiro passo”, comemorou Ennerst.
O comboio conectado e otimizado da forma como foi apresentado em Dusseldorf, traz uma série de vantagens para o transporte rodoviário. Além da tranquilidade do motorista, da sua segurança e dos demais usuários da rodovia, possibilita a redução do consumo de combustível. Segundo Ennerst, os testes mostraram que o primeiro veículo do pelotão teve redução de 2% no consumo de combustível; o segundo 11% e o terceiro de 9%. Ele destaca que além do Highway Pilot Connect, é necessário também concentrar o foco na aerodinâmica do cavalo-mecânico e do semirreboque. Os testes acontecem em estradas da Alemanha e dos Estados Unidos.
A tecnologia da conectividade permite que os caminhões se conectem, via Internet, com o seu meio ambiente, enviando e recebendo informações continuamente, de uma maneira que todos os envolvidos no processo de logística possam utilizar os dados de acordo com suas respectivas necessidades. O membro do board da Daimler AG e responsável pela Daimler Trucks & Buses, doutor Wolfgang Bernhard destaca que no futuro será possível, por exemplo, reduzir os tempos de espera enquanto ocorrem operações de carga e descarga do caminhão, reduzir a burocracia e evitar congestionamentos e também de forma significante as entradas do veículo em oficina através de atualização por download.
“Dados em tempo real são essenciais para a logística de alta performance, portanto, estamos investindo para conectar nossos veículos com seu ambiente e desenvolver aplicativos novos e específicos”, disse o executivo. Ele destacou ainda a melhoria do desempenho dos clientes, inclusive a operar seus negócios de maneira mais segura e ecologicamente correta. Conforme foi apresentado, com essa tecnologia o veículo pode agilizar o transporte enviando dados e eliminando a espera de documentação; transmitir documentos, programar manutenção e se antecipar à possíveis problemas evitando a parada para reparo e indicar a melhor rota.
Na visão dos especialistas, somente motoristas bem preparados e veículos modernos não são suficientes para vencer os desafios do transporte rodoviário e do baixo aproveitamento do caminhão. É preciso vencer a morosidade devido a engarrafamentos, pontos de espera, documentação da carga, procura por estacionamento e alfândega. A solução, acredita-se, virá mesmo através da conectividade, porque é preciso interligar, criar uma rede global na cadeia logística. De acordo com o dr. Peter Vaughan Schmidt, chefe de estratégia da Daimler Trucks, em experiência realizada com cliente durante o período de uma semana, o veículo esteve 35% do tempo na estrada e 65% parado. “Hoje falta integração, uma rede de informação, transparência no planejamento, informação do trânsito e muitas outras. É preciso interligar as informações”, concluiu.
O doutor Wolfgang Bernhard acrescenta que caminhão é muito mal aproveitado e há desperdício de recursos na forma como é feito o transporte hoje. “Às vezes, as viagens são vazias, e mesmo quando está totalmente carregado o veículo fica preso no trânsito, além de o motorista não ter onde estacionar”. Entre outras citações, Bernhard afirmou que o caminhão é uma máquina que poderia operar 24 horas por dia, mas chega a ficar um terço de sua vida parado, cujo aproveitamento é de apenas 18%. “Essa situação se deve à falta de comunicação, mas a conectividade vai ajudar a mudar essa situação”, afirmou o executivo.
Para o doutor Jeremy Rifkin, escritor, sociólogo e futurólogo, com a conectividade, o Grupo Daimler está fornecendo as bases da 3ª revolução industrial. Ele acrescenta que na “era da Internet das Coisas”, todas as ferramentas e maquinários serão equipados com sensores que fornecem constantemente um fluxo de informações em tempo real. “Isso mudará fundamentalmente a maneira como fazemos negócios. A “Internet das Coisas” está oferecendo oportunidades completamente novas”, disse. Quanto ao transporte rodoviário de cargas, Rifkin afirmou que a Internet vai revolucionar o setor nos próximos anos, porque milhares de veículos estarão interligados nas estradas, pois, em suas palavras, “cada veículo será um computador”.
Dada à importância desta tecnologia para o futuro do transporte, presidente mundial da Mercedes-Benz Trucks. Stefan Buchner, anunciou que em 1º de abril deste ano a Mercedes-Benz estabelecerá a nova unidade Digital Solutions & Services, chefiada pela doutora Daniela Gerd Tom Markotten, profissional com muitos anos de experiência no campo da TI de suporte à telemática de veículos.
Esta unidade, que também tem a FleetBoard GmbH como núcleo, dirigirá todas as atividades relativas aos aplicativos digitais para os veículos comerciais Mercedes-Benz – em estreita colaboração com outras divisões da empresa.
A nova divisão tem por missão garantir que a empresa se mantenha à frente no desenvolvimento de soluções digitais relacionadas a caminhões conectados. De acordo com o Buchner, os engenheiros estarão conectados com clientes e departamentos de vendas. “Isso é muito importante para nosso futuro. Não somente uma nova era, é uma mudança que vai trazer novas regras”, disse o presidente mundial da Mercedes-Benz Trucks
O executivo lembra que quando o primeiro iPhone foi introduzido, em novembro de 2007, os clientes da marca já utilizavam o FleetBoard há sete anos. “Por mais de 15 anos, eles já conseguiam controlar suas frotas e administrar com eficiência seus motoristas, tanto dos caminhões Mercedes-Benz, como os de outros fabricantes”, comentou, acrescentando que ninguém tem mais experiência nesse campo do que a Mercedes-Benz.