Por Daniela Giopato Fotos Fernando Favoretto
Todo carreteiro sabe que a safra, apesar de seus problemas, como longas esperas para carregar e descarregar, é um dos períodos de mais trabalho, oportunidades de bons fretes e aumento do faturamento. Ainda mais quando as estimativas são positivas e acenam para um bom momento na economia, como este ano, em que dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em fevereiro, mostravam previsão de 145,1 milhões de toneladas para a safra nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas, 8,5% acima do verificado em 2009 (133,8 milhões de toneladas) e 1,2% acima da estimada em 2008 (143,4 milhões de toneladas).
Apesar do mercado aquecido, é cada vez mais frequente o transportador reclamar de caminhões parados por falta de mão de obra adequada para operá-los. O presidente do Grupo G10 Transportes Maringá/PR, Cláudio Adamucho, confirma que existe a falta de profissionais qualificados e o problema se agrava no período da safra, quando a demanda de transporte chega a crescer 40%. Segundo sua estimativa, a defasagem de motoristas chega a ser de aproximadamente 30%.
“Profissional qualificado é aquele que tem conhecimento básico de mecânica de caminhões, é comprometido com a segurança e a direção defensiva e atento às infrações de trânsito, além de ser uma pessoa socialmente responsável”, explica. Por conta dessa defasagem, os jovens acabam encontrando maiores oportunidades. Mas, Adamucho ressalta que tem mais chances aqueles que se profissionalizam, porque hoje os caminhões utilizam a tecnologia embarcada e sendo assim os motoristas precisam conhecer e saber operar o equipamento de trabalho.
Em 1995, o Grupo G10 montou em Maringá/PR seu próprio Centro de Treinamento e Qualificação no Transporte (CTQT) para preparar motoristas das empresas do Grupo e também de outras empresas. “Existe um déficit no mercado de cursos para esse perfil. É muito mais fácil encontrar cursos que preparam mecânicos, mas não do que para qualificar motoristas”, cita.
Os carreteiros que estão na estrada também concordam que existe uma defasagem de profissionais comprometidos e qualificados. Afirmam também que alguns colegas estão parados no tempo, como se ainda vivessem em uma época em que para dirigir caminhão bastava herdar a profissão do pai, e a tecnologia embarcada ainda não havia sido incorporada aos veículos. Por isso perdem a oportunidade de aproveitar os momentos de grande demanda, como a safra. Isso tudo por não se adequarem às exigências básicas do mercado, que incluem estar com o nome limpo, ter experiência e disciplina, principalmente.
Leandro de Melo, de Paraguaçu Paulista/SP, conta que em sua cidade é comum ver caminhões parados mesmo em períodos como o da safra. Autônomo, que faz a rota Interior de São Paulo a Santos, acredita que faltam profissionais capacitados e responsáveis para trabalhar. Tem opinião de que existem carreteiros, que ainda dirigem de qualquer jeito e reduzem a vida útil de itens importantes do caminhão como o pneu, freio e suspensão. Desta maneira estão sujeitos a se envolver em acidentes e atrasar a entrega da carga. “Além disso, parecem ignorar as novas tecnologias e não procuram se aperfeiçoar e se atualizar”, acrescenta. Melo acredita que este tipo de motorista perde a oportunidade de participar de um momento de grande oportunidade de frete. “Quando passei a dirigir um veículo com tecnologias às quais não estava acostumado, fiquei quatro meses em treinamento viajando com o meu tio antes de ir só para a estrada”, lembra. Em relação a safra ressalta ser um período de muito trabalho, dificuldades, mas também de mais lucro, cerca de 15% a mais em relação a períodos normais.
O mesmo problema é presenciado por Devaney Bissolotty, de Boa Vista do Sul/RS, 21 anos de profissão, que diz ser comum ver empresas com caminhões novos parados por falta de motorista qualificado, já que não quer arriscar a entregar um veículo para um carreteiro com o nome sujo e, principalmente, que não sabe operar e nem tirar o melhor proveito das novas tecnologias. “Sem contar na irresponsabilidade, que pode resultar em acidentes e atraso na entrega da carga. No período da safra pode significar um grande prejuízo”, julga.
Na ocasião, Devaney havia carregado em Diamantina/MT com destino ao Guarujá/SP. Apesar do tempo de espera, rodovias ruins e do trânsito na cidade de São Paulo, situações que prejudicam o ritmo acelerado de cargas, o período é de mais faturamento. Em seu caso, quase 30% a mais do que o resto do ano. Apesar do aumento no movimento, conhece colegas que mesmo nessa época reclamam da falta de oportunidades. “Hoje, todo mundo migra para o caminhão com a ilusão de que precisa apenas saber dirigir. Mas não é bem assim. É necessário se atualizar, fazer cursos, e ter a consciência da sua responsabilidade na estrada”, opina.
Para Manoel Esteves, Goianápolis/GO, 49 anos de idade e 18 de profissão, que transporta soja de Vicentinópolis/GO para o Guarujá/SP, mesmo em um período de tanta “fartura de carga” muitos caminhões ficam parados por não ter mão de obra qualificada. O principal fator, em sua opinião, é o desencantamento com a profissão, que fez muitos jovens – que antes queriam seguir a profissão do pai – migrarem para outros setores, com expectativas melhores. Já os mais velhos desejam parar. E, no meio desses dois grupos têm aqueles que se limitam simplesmente a fazer o trabalho e não têm interesse em atualizar. Assim as opções ficam cada vez menores.
“Muitos colegas reclamam do frete, mas não têm perfil para atender o transportador e o dono da carga. E o pior, nada fazem para melhorar”, explica. Para ele, a safra é uma ótima chance para aumentar o faturamento mensal e por outro lado o carreteiro precisa entender que hoje o transportador exige um profissional preparado, que saiba lidar com as tecnologias, seja responsável e esteja com o nome limpo na praça.
Sidney de Oliveira, de Lucélia/SP, 19 anos de profissão, acredita que para se manter competitivo no mercado e preparado para faturar em épocas de grande demanda, como a safra, é importante estar com o nome limpo, ser responsável e formar associações para ter mais facilidade na hora de contratar o frete, além de comprar componentes novos para o caminhão. “O motorista que quiser permanecer na ativa tem de se virar, estar sempre antenado às novidades e criar maneiras para conseguir atender as exigências, que não são poucas, impostas pelas transportadoras”, lembra.
Outro motorista que também vê falta de profissionalismo nos colegas é Francisco Joaquim dos Santos, 32 anos e sete de profissão. Na ocasião ele havia carregado farelo de soja em Rondonópolis/MT para descarregar em Santos/SP e retornar com adubo ou gesso. “Esse período é bom, tem bastante carga, mas para aproveitar é importante que o motorista tenha responsabilidade, experiência, referência e saiba fazer a média”. Conta que apesar de não ter muito tempo livre, sempre que leva o caminhão para revisão pede dicas aos mecânicos da montadora, foi a maneira que encontrou para melhorar a dirigibilidade e se manter atualizado.
Pedro Cavalcante, de Campo Grande/MS, com 25 anos de profissão, afirma que durante a safra – apesar das longas esperas para carregar e descarregar – existe bastante oportunidade de frete. É uma fase onde o motorista de caminhão trabalha mais e acredita que muitos carreteiros não aproveitam por irresponsabilidade. “A rapaziada usa essas porcarias para se manter acordada e conseguir carregar mais, e assim fica vulnerável a se envolver em acidentes e ter a imagem prejudicada dentro da empresa. Sem contar que fecha os olhos para as novas tecnologias”, opina.
Para Cavalcante a palavra da vez é atualização e se preparar para conseguir acompanhar todas as mudanças. “É importante dirigir com responsabilidade, fazer cursos – como o de direção defensiva – e passar por um processo de reciclagem”, diz. “Tem que correr atrás, não basta ser apenas motorista, tem de ser profissional e acima de tudo ser humano e lembrar que toda ação gera uma reação. Afinal, a vida é uma só e não tem estepe”, conclui.
Durante a safra, João Batista, de São Gabriel do Oeste/MS, 10 anos de estrada, recebe mil reais a mais do que seu salário habitual para transportar de Chapadão do Sul a Santos/SP. É um momento bom e de muito trabalho para ele, que faz duas viagens por semana. Explica que a empresa para a qual trabalha se preocupa muito com o profissional que contrata e exige coisas básicas como experiência de dois anos, nome limpo, sem vícios e conhecimento para operar as tecnologias. “Sempre escuto alguns colegas reclamarem da falta de oportunidade, porém, penso que a maioria não corre atrás e não se preocupa em atender as exigências.”, afirma.
José Néri de Souza, 58 anos e 20 de profissão, de Pacaembu, interior de São Paulo, viaja com soja do terminal de Mato Grosso/MT para o Guarujá/SP. Ele acredita que a safra é um dos melhores períodos do ano, porque aumenta em 20% seu faturamento, mesmo com o valor do frete sendo mais baixo por conta da grande oferta e procura. Apesar das dificuldades, tem opinião de que o carreteiro deve aproveitar essa fartura de carga, e para isso deve ser um profissional responsável e com nome limpo e sem nenhuma restrição. “Hoje, a rapaziada comete muitas bobagens durante as viagens, o que compromete a segurança na estrada e da carga transportada”, explica.