Por João Geraldo
O motor que empurra a frota brasileira de caminhões tem queimado todo tipo de mistura, por conta do abastecimento com óleo diesel adulterado e até mesmo propositadamente, por motivo de redução de custos, como tem acontecido com certos transportadores que utilizam óleo vegetal misturado ao diesel para mover suas frotas. Especialistas no assunto defendem que estas misturas, tais como 50% de óleo diesel e 50% de óleo vegetal, por exemplo, trazem como conseqüência mais manutenção para o motor além de poluírem o meio ambiente.
Júlio César Barbosa, dono da Truck Diesel Maringá, no Paraná, profissional que trabalha há mais de 20 anos com sistemas de injeção mecânica para motor diesel, conta que desde antes de se falar tanto em biodiesel como se faz atualmente, os transportadores da sua região já usam “óleo de comida” – como é comum se referir ao óleo vegetal na região – misturado ao diesel no motor do caminhão.
A mistura adotada há mais de dois anos, diz Júlio César, é em proporções superiores a 50% do óleo vegetal, porém explica que antes de ser usado o produto passa por um processo de refino para reduzir os problemas causados ao bico injetor, principalmente. Produzido pelas cooperativas agrícolas, o óleo vegetal é vendido apenas em grandes quantidades, por isso este tipo de mistura está fora do alcance do motorista autônomo, sendo mais utilizado, portanto, por caminhões de frotas.
“O óleo vetegal para ser usado misturado ao diesel é comprado em mais de um lugar, mas nós pegamos aqui em Cascavel, na Diplomata. Carregamos em carretas de 30 mil litros e 45 mil, no caso do bitrem”, explica Rodnei Souza Rodrigues, chefe de manutenção da Transpanorama, uma das empresas do grupo G-10, formado atualmente por sete transportadoras. Ainda de acordo com Rodrigues, outros fornecedores no Paraná são a Ourinhos (óleo de algodão) e Bumge, que tem óleo de girassol e mamona, estes com maior preço, R$ 1,12 e R$ 1,16 o litro. Em Mato Grosso, o produto vem da Coimbra e da ADM, em Rondonópolis, cidade onde o grupo mantém uma base.
“Usamos óleo vegetal há dois anos e já fizemos pesquisas com caminhões eletrônicos. Nunca tivemos problemas e também continuamos a fazer a manutenção preventiva da frota no período normal de sempre, isto é, a cada 150 mil quilômetros trocamos os bicos injetores”, explica o chefe de manutenção da Transpanorama, empresa com frota de 160 caminhões.
Para o gerente de frota da Rodoingá, Almir Barbosa Souza, mais conhecido como He-Man, a empresa já usou bastante, mas hoje em dia o preço do óleo vegetal subiu e já não é mais tão vantajoso como antes. Mesmo assim diz que a empresa deixou de usar por causa do preço do diesel, principalmente no Estado do Mato Grosso, onde é mais caro. “Usamos na média de 50% de diesel e 50% de óleo vegetal e percebemos que houve desgaste dos bicos injetores, motor e corpo da bomba e os caminhões fazem a média de 2,5 km/litro vazios e carregados tracionando bitrem”, disse.
Souza acrescenta ainda que no início tinha mais problemas com os bicos injetores que entupiam porque usavam óleo vegetal mais grosso, mas depois a empresa passou a adquirir um produto mais fino e os problemas se acabaram. O valor pago, informado por ele na ocasião era de R$ 1,23 o litro do óleo vegetal, contra R$ 1,77 do produto derivado de petróleo. A frota da Rodoingá conta com 25 veículos de carga e consome mensalmente cerca de 130 mil litros de combustível.
De acordo com Alexandre Parker, analista de planejamento do produto, da Volvo do Brasil, as informações técnicas da área de garantia da montadora dão conta de que os bicos injetores são os primeiros componentes a apresentarem sintomas de problema e depois passa para o motor. “ Tem uma parte dessa mistura, glicerina, que é retirado do óleo vegetal para a produção do biodiesel. Com o tempo ela carboniza o motor e cria depósitos na sede de válvula, dá problema nos pistões e acaba por fundir o motor”, detalha Parker.
Ele diz ainda que a mistura reduz bastante a vida útil do motor, o qual perde a garantia. “É fácil saber quando usou a mistura, porque ficam borras de óleo, como se fosse uma pasta, na sede de válvula e também no bico injetor”, explica. Além disso, contamina o óleo do motor e não lubrifica. E avisa que a Volvo não recomenda o uso de diesel e óleo vegetal juntos em nenhuma porcentagem. “Essa mistura não tem as mesmas propriedades do óleo diesel e o risco é por conta do frotista que quiser usar”, finaliza.
Gian Marques, membro do Comitê técnico de Combustível da SAE – Sociedade de Engenheiros da Mobilidade, acrescenta que o diesel representa 60% ou até mais do custo do frotista, e se ele consegue reduzir o custo, até compensa, em certos casos, perder o motor com 100 mil quilômetros, por exemplo. “Com a diferença de gasto pode dar para comprar dois motores, mas para quem não tem um grande volume de caminhões ou não consome tanto diesel a mistura não faz nenhum sentido”.
Porém, Marques não é a favor da mistura e explica que quando se queima óleo vegetal se queima também a glicerina que libera uma substância tóxica chamada acroleina, danosa para quem fica a ela exposto. “O motor diesel é uma máquina amigável, queima qualquer coisa, mas o uso não é recomendável. Nem mesmo a ANP – Agência Nacional do Petróleo reconhece o óleo vegetal como combustível automotivo. “, esclarece. Ele acrescenta que quem usa está considerando apenas o lado financeiro e sendo assim não pode, na sua opinião, ser considerado como bom.