Por Katia Siqueira

Cerca de 95% dos seis mil caminhões que ocuparam o pátio de triagem do porto de Paranaguá e mais de 100 quilômetros da BR-277, por cerca de um mês, já haviam descarregado no dia 30 de março e retornado às cidades de origem em busca de uma nova carga. A ocorrência de fila em Paranaguá se repete anualmente, sempre na época da safra, quando o fluxo de veículos de carga aumenta.

A cada ano, nesta época, arruma-se uma desculpa para justificar o acúmulo de caminhões no pátio de triagem e também na rodovia BR 377. Desta vez, por exemplo, ninguém soube dizer o que originou a fila e qual o motivo de haver um volume tão grande de carretas e caminhões parados durante semanas. Alguns tem opinião de que a fila começou quando foi proibido o embarque de soja transgênico, enquanto outros atribuíram a culpa, por tantos veículos de carga parados, à greve dos trabalhadores do porto.

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e real, pode se afirmar que o congestionamento teve início no começo do mês de março, quando alguns caminhões foram impedidos de descarregar porque a mercadoria não tinha destino certo. Em outras palavras, não estava vendida ainda. De acordo com a Appa (Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina), a fila começou porque os operadores e embarcadores utilizaram os caminhões como silos exemplo de anos anteriores. “Eles carregam o caminhão muito antes de vender o grão, o motorista chega no porto e não consegue descarregar”, diz um representante da Appa.

Para dar um basta à exploração dos carreteiros que permaneciam dias aguardando a carga ser vendida para descarregar, no dia 31 de dezembro de 2003 foi emitida a ordem de serviço de número 020/03, na qual o superintendente da Appa, Eduardo Requião, dava conhecimento de que, a partir daquela data, só seria permitida a entrada no pátio de triagem caminhão com carga vendida.

Responsabilidades à parte, o autônomo José Milton Rodrigues, de 41 anos (sete de estrada), queria saber se realmente ele seria ressarcido do prejuízo por permanecer dias parado aguardando para descarregar. “Eu carreguei no dia 5/03, em Ubiratã/PR, e segui para o Porto de Paranaguá pela manhã, entrei no pátio de triagem às 11h45 e lá permaneci parado por 19 dias, sem trabalhar”, reclamava no dia 24 de março à tarde, poucas horas antes de ser fechado o acordo pelo qual os embarcadores e carregadores se comprometeram a pagar aos motoristas R$ 0,40 hora/tonelada, contra R$ 0,25 hora/tonelada que eram pagos até aquela data.

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Dono de um Volvo EDC, ano 97, que utiliza para transportar grãos do interior do Paraná ao porto de Paranaguá, Milton Rodrigues diz que perdeu mais de R$ 5 mil em frete. “Uma viagem de Ibiratã (distante 650 quilômetros de Paranaguá) costuma pagar R$ 2,2 mil e em situação normal faço três carregamentos por semana”, conta.

Segundo ele, a fila de caminhões chegou a Campo Largo, distante a cerca de 100 quilômetros de Paranaguá. “Os motoristas que permaneceram na BR-277 viveram uma situação desumana, sem sanitário, chuveiro, restaurante, etc.”

Galdino Pedro Kirsten, supervisor de frota da Transportadora Transvale, com unidade em Palotina/PR, achou correto os embarcadores e operadores pagarem as diárias. A Transvale ficou com 13 bitrens parados durante 10 dias. Cada caminhão causou um prejuízo da ordem de R$ 10 mil no período. “Os trabalhadores do porto retornaram ao trabalho no dia 24 pela manhã, mas ninguém queria pagar as diárias aos motoristas. Em anos anteriores, quando a fila chegou a superar os 120 quilômetros, as transportadoras pagaram as horas paradas”, explicou.
Segundo Jair R. Flávio, gerente do posto de serviço Cupim Paranaguá Grande Parada, no km 6 da BR-277, no dia 24 os motoristas fizeram seis piquetes na serra e bloquearam a estrada para todos os caminhões.

Para descer, iam até Campina Grande, distante 40 quilômetros de Curitiba, pegava a estrada velha da Graciosa para conseguir chegar ao porto”, explicou.

Para o presidente da Fenacam (Federação Nacional dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens) , Diumar Deléo Cunha Bueno – um dos sindicalistas que intermediou a negociação que garantiu aos motoristas o pagamento de R$ 0,40 a tonelada/hora – o acordo fechado no dia 25/03 foi um dos mais difíceis, porque ele contemplou inclusive quem estava parado antes da praça de São José dos Pinhais. A base de cálculo para determinar o tempo de espera foi estabelecida a partir da hora que o veículo passou pelos pedágios de São Luiz do Purunã e da Lapa, distante 130 quilômetros de Paranaguá. De acordo com Bueno, os terminais portuários e as empresas exportadoras fizeram o pagamento das diárias aos motoristas. Estima-se que a cifra deve ter atingido R$ 20 milhões.

OBS: na próxima edição vamos publicar matéria especial sobre a supersafra de grãos e seus efeitos sobre o transporte de carga e mercado de caminhões.