Por mais crédulo e corajosos que seja o carreteiro, quando acontece alguma coisa estranha, à noite na estrada, ele treme. Reza e pede proteção a Deus, São Cristóvão e de quem mais ele lembrar no momento. Prova disso é o fato que aconteceu com Luizão, um veterano da estrada, o qual mostra que a coragem depende de hora, local e as condições do ambiente. Pior ainda se tratar-se de algum acontecimento que foge do entendimento.
Luizão – pessoa calma, inclusive no jeito de falar – seguia firme pela BR 116 no trecho entre a divisa do Paraná com Santa Catarina. Fora da boléia, um vento gelado cortava a madrugada umedecida por uma fina garoa de junho enquanto a carreta frigorífica cortava a estrada. Como companheiro, naquela noite que marcou sua vida, Luizão tinha apenas um rádio-toca-fitas para espantar a solidão.
Uma boa música sertaneja tomava conta da boléia quando ele ouviu uma pancada forte no baú. Estranhou, porque naquela região existem alguns vilarejos afastados da margem da estrada e mata. Além disso, nada mais. Continuou acelerando até ouvir outra pancada. Desta vez mais forte. Olhou pelo retrovisor e não viu nada. Nenhum carro ou caminhão na estrada.
De repente, viu um vulto cruzar a estrada. Ele nunca acreditou em fantasma. Nem considerava esta hipótese, mas também não conseguia sequer um palpite sobre o que poderia ser. Acelerar não podia, porque além de estar carregado a pista se encontrava molhada. O jeito foi prosseguir, mas alguns metros a frente viu um carro parado na beira da estrada. Uma mulher toda de preto fez sinal. Pedia ajuda.
Luizão pensou em parar, poderia ser um assalto. Assustado com as batidas no baú ele associou uma coisa com à outra. Além disso, a roupa preta era assustadora. Corajoso que era, decidiu parar. Ligou o pisca alerta e desceu. Começou a caminhar em direção ao carro e num momento que descuidou não viu mais o carro e nem a mulher. Quando se voltou para correr em direção ao caminhão este também já não estava mais lá. Luizão gelou.
Já não sabia mais o que estava acontecendo. Era coisa de gente ou de assombração? Fechou os olhos, rezou e invocou todos os santos
que conhecia. Passados alguns minutos um caminhão se aproximou. Para sua surpresa, a tal mulher de roupas negras estava ao volante. Ela parou, olhou bem nos olhos de Luizão e disse: “pode subir, vou te levar pra onde você quer”.
Ele já não entendia nada que estava acontecendo. Mas aceitou a carona. Aquela carreta perfumada andava como a Ferrari do Schumacher e fazia as curvas em alta velocidade. Passados alguns minutos Luizão avistou seu caminhão parado na beira da estrada. Mal encostou o pé no chão a desconhecida saiu acelerando e desapareceu.
Tudo parecia estar no lugar, inclusive seus pertences pessoais. Uma coisa o perturbava: o perfume daquela carreteira impregnava a boléia do seu caminhão. Pegou a estrada, abriu as janelas e nada do cheiro sair. Logo o dia amanheceu e ele parou num posto para tomar um café. Na lanchonete era grande a falação sobre um motorista que tinha aceitado a carona da carreteira de negro e que nunca mais ela iria assombrar as estradas daquela região. Ao ouvir a conversa, Luizão tratou de sair de fininho. Vendeu o caminhão e montou um boteco e nunca mais quis saber de viajar a noite.