Por: Sérgio Caldeira
Após paciente rastreamento, foram localizados protótipos Scania nas mãos de empresas como o Expresso Figueiredo e a Transherculano, com a placa de identificação 420 cv de potência. Eles tracionam composições bitrens e a suspeita recai sobre seus motores que devem atingir 470 cv com o atual bloco de seis cilindros em linha. Seus motoristas esbanjaram ética profissional, mantendo fidelidade ao trato com a montadora de nada informarem e muito menos abrirem a porta da nova cabine para um olhar indiscreto. Fotos por dentro, nem pensar. Mas sempre o repórter consegue agachar furtivamente para captar alguma novidade. O essencial, no entanto, confirmou-se: o modelo de 470 cv adotará o turbocompound (pronuncia-se turbocompaund) e como o carreteiro adota sua própria nomenclatura, alguns estradeiros consultados preferem a denominação biturbo.
A Scania aposta alto nessa tecnologia de dois turbos compostos, que na verdade, posicionam-se enfileirados na tubulação de escape. Há cerca de dois anos, quando saiu na edição de maio de 2005 a foto de outro Scania experimental, já era o sinal da chegada das novas linhas R e P (será o primeiro lançamento da Scania em que não haverá mais o aprimoramento da linha T, a qual foi descontinuada recentemente). Gente freqüentadora da engenharia de produção da Scania garante que aquele caminhão de teste, a serviço da tradicional Cavalinho, de Vacaria/ RS, foi totalmente desmontado para avaliação de componentes. Para a mesma fonte, os planos iniciais eram de o novo produto chegar ao mercado ainda em 2006. Atrasado, o desenvolvimento do 470 levou em conta a pesada responsabilidade de deixar bem acertada a grande e inédita novidade escandinava, o turbocompound. Já conhecido na Europa, o turbocompound pode ser resumido de maneira bem simples como motor biturbo. Trata-se de duas turbinas em linha no duto de escape. A primeira é o tradicional turbo-alimentador, sendo que a segunda aciona uma engrenagem encaixada na cremalheira do volante do motor. Um acoplamento hidráulico compatibiliza as velocidades e torques, oferecendo aumento de potência ao veículo a baixo custo. Vale lembrar que o dispositivo de nome complicado gira a uma velocidade de cerca de 55.000 rotações/ minuto enquanto que o volante do motor não passa de 2.200 rotações. Assim, a Scania não precisou projetar um novo bloco – de maior cilindrada – para enfrentar a maluca corrida de cavalos, entendida como potência do motor. Neste pormenor, a conterrânea Volvo preferiu a segunda hipótese, não sem antes provar do dispositivo turbocompound, no motor D12D-500, de 12 litros. Percebendo alguma queda de barreira no trecho à frente, a montadora decidiu-se pela construção de um novo engenho com 13 litros sem a segunda turbina e capaz de render até 520 cv, por enquanto.
Os propulsores com turbocompound disponíveis na Europa pela Scania, hoje desenvolvem 420 cv, 470 cv e 480 cv, potências máximas a 1.900 giros, tendo torques máximos de 2.100 Nm, 2.200 Nm, 2.250 Nm, respectivamente. No mercado brasileiro, espera-se o 470, pois seria o de menor custo para o fabricante de São Bernardo do Campo/SP. Este, denominado como DT 12, dotado de HPI – um sistema de alta pressão de injeção, alcança torque máximo de 1.050 a 1.350 rotações/min e atende à norma Euro 3 (equivalente à brasileira Porconve 5), enquanto os demais, o 420 e o 480, são enquadrados à Euro 4, norma vigente na Europa. Para tanto, além do turbocompound, ganham um dispositivo de EGR (Exhaust Gás Recirculation) que, resumidamente, impõe a recirculação de parte dos gases de escapamento, visando o resfriamento dos mesmos e a conseqüente diminuição das emissões de óxidos de nitrogênio. Mas percebe-se um ar de modernidade ao ouvir o baixo nível de ruído dos motores dos dois prováveis 470 (Euro3) em teste, tanto em marcha lenta quanto em giros altos, ambos rodando pela Fernão Dias no início de 2007.
Na Europa, a superalimentação simples (turbo compressor) foi incorporada aos veículos Scania em fevereiro de 1961 na série 75. O motor era o DS10 e entregava 205cv. Lá desde 1991 (ano do centenário da marca sueca) a Scania já disponibilizava o turbocompound. Era o DTC11 e equipava o modelo R113/400 até a chegada da série 4 em 1996, quando a produção foi interrompida até a reintrodução do “biturbo” em 2001 na roupagem do 12 litros.
Vindo do miolo para a casca, a cabine dos novos Scania se iguala com a dos europeus de nova frente. A grade frontal projetada em peça única tem linhas suaves e será fabricada com as tampas laterais. No basculamento das novas cabines R e P, todo o conjunto da tampa frontal inteiriça se levanta, mostrando evolução. Nas linhas P e R brasileiras, ao contrário do lançamento previsto para até o meio deste ano, para fazer o basculamento da cabine é necessário, além de levantar a grade frontal (onde estão os itens de verificação diária), abrir as duas peças laterais.
Quanto ao tamanho do habitáculo, há expectativa de os veículos oferecerem opcionalmente o modelo HighLine, um pouco mais baixo que a TopLine européia (há registro de quatro unidades destas fabricadas em 1998 na Suécia e exportadas para o Chile). A HighLine deixará a nova linha R com ‘pé-direito’ da mesma altura interna do Volvo FH Globetrotter e também de algumas versões do Mercedes- Benz Axor. A nova cabine Scania mede 21 cm a mais do que a cabine de série 4 atual, oferecendo a altura na região do capô do motor com cerca de 1,90m. Do lado de fora, fica com altura total de 3,55m (sem climatizador e outros apetrechos), se o veículo estiver calçado com pneus 295/80 R22,5.
De volta à boléia, mais notícia boa. Além do cofre do motor rebaixado, quase plano para facilitar a mobilidade dos condutores mais encorpados, haverá ainda um painel recurvado, totalmente reestilizado, gabando-se inclusive de visor de cristal líquido. Outra novidade nos pesados brasileiros da marca sueca será o volante multifuncional, compondo- se de teclas e comandos do rádio-CD, do freio-retarder e do piloto automático. O câmbio automatizado Optcruise (opcional) deve ganhar mais espaço na nova linha e completa o pacote de regalias.
Com o pé no acelerador, a Scania poderá superar a compatriota Volvo, hoje com 520 cv. Para tanto, usará o seu poderoso propulsor V8, seguramente. No Velho Continente ele alcança 620 cv, a partir dos seus 16 litros, versão Euro 4. Durante as comemorações dos 50 anos, possivelmente não será esquecido o V8 de 580 cv (preparado para Euro 3), já presente no Brasil em algumas raras unidades para o transporte de cargas indivisíveis. Uma forma legítima de manter o reinado das megapotências. É uma espécie de capricho diante do mercado, do qual os nórdicos não abrem mão. Briga de cachorro grande e de pedigree sueco!