Por Nilza Vaz Guimarães

Apartir de 10 de março, todo motorista de caminhão que opera no terminal de contêineres do Porto de Salvador (Tecon) estará sujeito a fazer o teste do bafômetro. Trata-se de uma campanha de caráter preventivo contra o alcoolismo, intitulada “Você 100% Caminhoneiro” que tem como objetivo evitar acidentes no dia a dia dos carreteiros. A campanha – que lista como riscos ocorrências de colisão, mal súbito, danos aos equipamentos, ao patrimônio do terminal e do transportador, além de danos às cargas perigosas – é uma expansão de outro programa contra drogas dentro do terminal implantado há quatro anos no porto da capital baiana.

7469t
Na opinião de José Alberto de Souza, a intenção é boa para evitar acidentes, mas ainda existem muitas coisas a serem feitas dentro do terminal

Pelo projeto apresentado, o motorista será escolhido de forma aleatória ao sortear na urna uma bola. Caso ele tire bola branca estará livre para ter acesso ao terminal; bola laranja fará o teste do bafômetro. Caso haja recusa de fazê-lo, o resultado será considerado positivo e nesse caso o carreteiro terá de aguardar por duas horas para um novo teste do bafômetro. Se o resultado for novamente positivo ele estará impedido de acessar o terminal naquele dia. Além disso, entrará na lista de acompanhamento. Isso é, toda vez que ele for ao terminal de contêineres terá de ser submetido ao teste do bafômetro. Vale lembrar que em hipótese alguma a CNH dele será retida.

“Com a lei seca não se pode mais beber. Nossa carteira de motorista é o nosso instrumento de trabalho e não podemos perdê-la”, esclarece o carreteiro José Alberto Souza, com 51 anos de idade e 34 anos na profissão. Ele transporta contêineres carregados de arroz, eletrodomésticos e também contêineres vazios das cidades de Camaçari, Feira de Santana, Recife e Maceió para o porto de Salvador, e nos finais de semana não abre mão de degustar um churrasco junto com sua família acompanhado de uma cerveja bem gelada. “Durante a semana a história é outra. Se pegarmos uma fiscalização na estrada, a gente dança”, reconhece.

7438t
Para Ubirajara Argolo Santiago, a campanha no terminal de contêineres chegou em bom momento e torce pelo início dos testes com o bafômetro

Souza diz que vê muitos acidentes por causa da bebida, tanto nas rodovias estaduais quanto federais e não acredita que campanhas irão resolver. Lembra que já tinha uma lei. “Agora surgiu outra, mas os motoristas em geral, e não apenas os carreteiros, continuam bebendo e pegando a estrada. Não acredito que campanha alguma possa acabar com isso, pois nunca vi ninguém parar de beber por causa disso. Podem fazer, mas não irá mudar nunca”, enfatiza. E quanto à campanha que será realizada no porto de Salvador, também não acredita que dará resultado. “A intenção é boa para evitar acidentes, mas o porto deveria melhorar o trabalho dos carreteiros dentro do terminal. Tem muita coisa por fazer aqui”, conclui, desacreditado.

Já o carreteiro Ubirajara Argolo Santiago, 29 anos de idade e cinco anos transportando contêineres, afirma ter parado de beber há mais de seis meses. Disse que bebia diariamente e o valor que gastava com o consumo de cerveja começou a fugir de seu orçamento. Como tem quatro filhos para criar, não estava dando conta das despesas da casa. “Sempre à noite, em casa, eu bebia, mas a conta começou a ficar muito alta, então parei. Ainda mais agora, que o movimento no porto está fraco demais”, afirmou. Ubirajara Santiago afirma nunca ter bebido durante o trabalho, mesmo quando viajava para longe.”Chego a transportar cerca de 30 toneladas. É uma responsabilidade muito grande”, diz.

7465t
O estacionamento do porto, em estacionamento é logo após o portão de entrada, onde carreteiros aguardam serem chamados para carga ou descarga

Ele acredita que campanhas de conscientização são muito importantes e com elas muita coisa pode acontecer, como por exemplo, a redução de acidentes nas rodovias, principalmente nos finais de semana. “Nas estradas existem muitas pessoas imprudentes que dirigem bêbadas, mas não são apenas os carreteiros que devem ser conscientizados e sim os motoristas de carros de passeio também”, sugere. Para ele, os resultados positivos podem até serem colhidos, mas isso depende de fiscalização. “Caso contrário não será possível mudar a estatística atual de violência no trânsito”, acredita.

Em relação à campanha que terá início no porto de Salvador, Ubirajara Santiago considera importante e acha que chegou em momento certo. “Os carreteiros que bebem precisam ter consciência de que álcool e volante não combinam. Além disso, eles vão correr risco de perderem suas Carteiras de Habilitação”, comenta preocupado, já pensando na falta de mão de obra que poderá acarretar. “Ou o motorista para de beber ou a situação vai ficar muito feia para ele”, acrescenta. “Tomara que esse programa tenha início o mais rápido possível”,
conclui.

7451t
Iniciativas como essa são sempre bem- vindas, pois o Brasil todo precisa ter mais conscientização, opina o autônomo Balbino Leite dos Santos

Há 12 anos trabalhando como carreteiro autônomo, Balbino Leite dos Santos, natural de Cruz das Almas, interior da Bahia, costuma ir para casa praticamente todos os dias, exceto quando a viagem é longa e ele dorme em seu próprio caminhão. Com 40 anos de idade, casado e pai de três filhos, ele transporta cargas em contêineres e também carga seca. Balbino Leite diz que não bebe e nem fuma, mas que vê diariamente nos jornais e na televisão notícias de acidentes ocasionados pela ingestão de bebida alcoólica. “O álcool prejudica qualquer pessoa, além de acabar com a sua saúde. Mas não é só a integridade física do carreteiro que está em jogo e sim, de qualquer um. O negócio é beber muita água e suco”, recomenda.

De acordo com ele, muitos colegas ficam aguardando carga e quando chega a hora do almoço vão tomar uma dose para abrir o apetite. “É aí que mora o perigo. Se forem escalados para transportar, podem causar algum acidente”, explica. Em sua opinião, o ideal
seria que quando um motorista, carreteiro, bombeiro, advogado, não importa qual a profissão, fosse flagrado bêbado ao volante, tivessem a habilitação e direito de dirigir cassados. “Salvador deveria seguir o modelo de Recife. Lá a lei seca é um exemplo e funciona. Aqui na Bahia também existe, mas não pune como lá. A fiscalização tem de ser mais rígida”, completa. Quanto à campanha do Tecon Salvador, acha muito boa a iniciativa. Em sua opinião, o Brasil todo precisa ter mais conscientização. “Campanhas assim sempre são bem-vindas e os resultados são sempre positivos”, finaliza.

7455t
Vitor Cruz afirma não haver problema no terminal devido a questão do alcoolismo, mas acredita que a campanha será um alerta para evitar acidentes

O carreteiro Vitor Cruz, 50 anos de idade e 30 de profissão, só roda por perto atualmente. Mas também não é de ficar parado, pois chega fazer até cinco viagens por dia. Ele diz que já viajou muito e que há 15 anos roda somente em trechos entre o porto de Salvador e as cidades próximas da capital baiana. Afirma que depois da “lei seca” só bebe em casa, e nos finais de semana. Acredita que a maioria dos acidentes que ocorre nas estradas se deve ao uso indevido do álcool, mas ele não deixa de considerar também as ultrapassagens perigosas e defeitos no caminhão, entre outros fatores que podem contribuir. “Acidente é imprevisível”, acentua.

Vitor diz não ter horário fixo para trabalhar. Dirige durante o dia ou à noite, dependendo do trabalho e acha mais perigoso dirigir durante o dia, quando aumenta o fluxo de veículos nas estradas. Em sua opinião, o álcool tira o golpe de vista e o equilíbrio do motorista. “Deveria ser suspenso o carreteiro que chegasse bêbado para trabalhar. O álcool não combina com trabalho”, justifica. Acredita também que a “lei seca” está contribuindo muito para a redução de acidentes, seja nas cidades ou nas estradas, portanto, a fiscalização deve ser mais acirrada.

Afirma que campanhas são importantes, mesmo no porto, onde, do seu ponto de vista, apesar de não existirem problemas, esta questão do alcoolismo será um alerta para todos os profissionais que trabalham aqui. É uma maneira a mais para evitar acidentes”, reflete. Por outro lado, Vitor Cruz reivindica que o sistema portuário faça outras campanhas, como por exemplo, cuidar da saúde respiratória dos carreteiros. “Ficamos “comendo” poeira o dia todo no porto e quando chega à noite não conseguimos respirar direito,comprometendo uma boa noite de sono. Esta campanha também seria muito bem-vinda por todos nós”, sugere.