Por Evilazio Oliveira
A utilização de drogas por motoristas de caminhão é assunto recorrente no trecho. O rebite, também conhecido por azulzinho, ou a cerveja na hora do almoço são coisas do passado. “A moçada agora vai direto para a cocaína e até mesmo o crack, passando livre pela maconha”, garante um veterano estradeiro. “O rebite já era”. Se, por um lado falta a comprovação efetiva sobre o uso de drogas consideradas pesadas entre alguns motoristas, é certo que o problema existe. E preocupa. Mesmo assim, ninguém fala abertamente sobre o assunto, preferindo o “sei que existe, mas nunca vi”.
Na estrada, pouca gente se habilita a falar do assunto sobre o uso de qualquer tipo de droga, mas há quem admita já ter experimentado o tal rebite. O carreteiro Joel Kramer, 44 anos de idade, 16 de estrada, natural de Bom Jesus/RS, conta que há anos teve uma experiência terrível ao usar rebite, numa viagem de urgência. Lembra que ficou muito assustado com o resultado. Segundo suas palavras, parecia ver prédios nas margens da estrada, quando na verdade ele viajava por lugares de campo aberto. Nunca mais usou, segundo afirmou. Garante que “essas substâncias são coisas do passado no trecho, porque hoje a “gurizada” usa coisas bem mais fortes”, pelo que ouve falar. Acredita que se a Lei do Motorista for devidamente obedecida, ninguém precisa se preocupar com qualquer tipo de droga, porque todos vão dirigir numa boa e com segurança.
O estradeiro Valdemar da Silva, conhecido no trecho como El Bujo, é natural de São Borja/RS, tem 43 anos de idade e 10 de profissão. Ele, que viaja com sua carreta para onde tiver carga e que o frete compense, garante que nunca viu e nem conhece qualquer tipo de droga pesada ou rebite. “Só de falar sinto medo”, afirma encolhendo-se. O também gaúcho da cidade de Rodeio Bonito, Armelindo Cavagnolli, 63 anos e 14 de estrada, que roda por todo o País, diz que já utilizou rebite uma única vez e que passou muito mal, precisou ser hospitalizado.
Segundo ele, não vale a pena, pois além de ser perigoso e ilegal faz muito mal à saúde e acredita que o pessoal do trecho já abandonou há tempo o tal azulzinho e hoje usa coisas mais fortes. “Não que eu tenha visto, mas apenas por escutar os motoristas comentando”. Afirma também que nunca viu qualquer ação de traficantes nos pontos de parada, embora saiba que existe, principalmente nos Estados das regiões Norte e Nordeste.
Anísio Álvaro dos Santos, 63 anos de idade e 42 de profissão, natural de Londrina/PR, carreteiro acostumado a viagens longas por rodovias do Brasil e Mercosul, garante que o seu rebite é o lençol. Ou café e Coca-Cola. Mas não tem dúvidas sobre o uso de drogas pesadas no trecho. E, como os demais estradeiros, também garante que nunca viu alguém usando, “mas que usam, ah, usam”. Ressalta que vê cada “coisa na estrada que uma pessoa normal não faria, só estando fora de órbita”. Ele também já usou rebite e garante que não usa mais. “Já era”, afirma.
Com bastante experiência nas estradas, Washington Conti, 70 anos de idade, natural de Quarai/RS e atualmente residindo em Florianópolis/SC, costuma viajar com a mulher, Edi. Já rodou muito pelos países do Mercosul, mas agora dedica-se apenas a viagens no território nacional. E, sempre que possível, acompanhado pela mulher e os três filhos, hoje todos adultos. Acredita que talvez por isso nunca tenha sido assediado por vendedores de rebites ou outros tipos de drogas, embora saiba que isso seja corriqueiro, principalmente no Nordeste. Em sua opinião, são os motoristas mais jovens que estão usando essas bobagens, cada vez mais fortes. “Mas, nunca vi de perto”, diz.
O autônomo José Altamir Rocho Fraga, o Barba, tem 56 anos de idade e 33 de profissão, natural de São Borja/RS comenta que “pelo que se vê, a gurizada tá metendo pressão no pozinho e até no crack”. Ressalta que é difícil de ver e comprovar, porque eles formam a sua turminha, o grupo fechado, mas mesmo assim se ouve os comentários entre os colegas. Em seu caso, ressalta que nunca precisou usar nenhum tipo de droga para se manter acordado. Diz que não trabalha com carga horária e dirige de acordo com as possibilidades. “O meu rebite é o travesseiro”, finaliza.
De acordo com a psicóloga Vanessa Garcia de Oliveira, 39 anos de idade, 12 de profissão e há pouco mais de um ano na Gabardo Logística e Transporte Internacional de Veículos, e a RG Log, com sede em Porto Alegre/RS, a preocupação com o consumo de drogas por parte dos motoristas, ou qualquer outro tipo de comportamento inadequado, começa a partir da seleção dos candidatos. O resultado desse rigor é que para cada admissão na empresa são entrevistados 10 candidatos em média. Por mês, são realizadas cerca de 150 entrevistas nas filiais.
Vanessa Garcia explica que há uma preocupação muito grande no trabalho preventivo, através de treinamento profissional, apoio psicológico e o envolvimento familiar do motorista, tudo isso visando a conscientização para os seus atos, dentro e fora do ambiente do trabalho. No caso de ser percebido qualquer sinal de alteração no comportamento do motorista, ele é afastado imediatamente e passa por atendimento especializado, sempre com o envolvimento dos familiares, explica.
Com uma frota de aproximadamente 1.300 caminhões e 1.500 motoristas carreteiros entre a Gabardo Logística e Transporte Internacional de Veículos, e a RG Log, com sede em Porto Alegre/RS, todos os assuntos são tratados com seriedade, incluindo o comportamento dos estradeiros para qualquer atitude que seja considerada fora do normal, segundo explica do diretor da empresa, Sérgio Mário Gabardo, 56 anos. Mesmo sem admitir explicitamente qualquer tipo de problema relacionado aos motoristas das duas empresas, ele faz questão de destacar que os clientes sempre estão em primeiro lugar, e como o motorista se constitui num dos principais cartões de visitas da empresa é inegável que ele tenha uma boa apresentação pessoal e um bom relacionamento com o cliente. Qualquer alteração comportamental que eventualmente seja detectada e depois de comprovada, resulta numa conversa séria com o motorista, passando pelo próprio Sérgio Gabardo, psicólogos e até tratamento médico se for o caso. Ou, reciclagem. Custa muito mais barato tratar o motorista, ver o que está acontecendo, quais os problemas que têm e ajudá-lo a resolvê-los do que simplesmente desligá-lo da empresa, explica.