Por Evilazio de Oliveira

Na contabilidade quase sempre apertada do carreteiro, invariavelmente consta um item a ser descontado do valor do frete, que dificilmente pode ser eliminado. É a comissão do agenciador de cargas, aquele personagem encontrado na maioria dos postos de combustíveis ou pontos de estacionamento de caminhões. Munidos de dois ou três telefones celulares, são vistos como a salvação dos estradeiros, embora fiquem com uma razoável fatia do valor do frete negociado. Com alguns telefonemas para empresas transportadoras conseguem os mais diferentes tipos de cargas para praticamente todas as localidades do País. E de acordo com a lei da oferta e da procura, servem também como uma fonte confiável dos valores dos fretes vigentes no mercado. Mesmo assim, há quem os veja com certa desconfiança, culpando-os de achatar o valor do frete, sempre levando vantagem maior do que seria o negociado com o carreteiro.

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O agenciador sabe tudo, conhece o mercado e ajuda a reduzir custos para as empresas e carreteiros, opina José Carlos Silvano

Na opinião do presidente do Setcergs (Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística no Estado do Rio Grande do Sul), José Carlos Silvano, 56 anos, o agenciador de cargas é essencial para a atividade do motorista de caminhão, servindo também, como referência de preços de mercado. “Ele sabe tudo, conhece o mercado e serve para reduzir os custos para as empresas e carreteiros, fazendo o meio-campo e simplificando as negociações”. É de muita importância no setor de transportes, segundo afirma, embora ressalte que, como em todas as atividades, existem também os maus elementos. Em alguns casos, pessoas da própria empresa atuam de comum acordo com o agenciador e estabelecem valores irreais de fretes, que não são repassados ao carreteiro. Essa diferença é repartida entre eles, numa atitude criminosa e de difícil identificação, admite Carlos Silvano. “Mas, pelo menos 90% desses profissionais são pessoas honestas e trabalhadoras”, diz.

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Flávio Pezzeti não se incomoda em pagar a comissão solicitada, mas se achar o preço alto se acerta negociando o valor

Flávio Pezzetti, o Tucano, natural de Bento Gonçalves/RS, tem 44 anos de idade e 19 como motorista de caminhão viajando por todos os Estados brasileiros. Para ele os agenciadores de cargas são a salvação do carreteiro, principalmente em cidades estranhas. O motorista não tem condições e nem conhecimento para procurar carga por conta própria, precisando sempre recorrer ao agenciador, que na maioria das vezes já é conhecido ou indicado por algum colega de estrada. Não se incomoda de pagar a comissão solicitada e, claro, se considerar muito alta negocia e ao final acabam se acertando.

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Só depois de ligar para empresas conhecidas Rildo Cardoso recorre aos serviços dos agenciadores e diz que é preciso ter jogo de cintura com eles

O carreteiro Nelson Cândido Ferreira, natural de Campinas/SP, 47 anos e 20 de estrada, afirma que ninguém vive sem o agenciador de carga, pois ele facilita tudo, em termos de fretes, valores e até adiantamentos. Embora trabalhe para uma empresa com carga certa, algumas vezes retorna vazio para a base porque o frete não compensa eventuais demoras para carregar e descarregar, principalmente quando se trata de supermercados. Mas quando precisa, não pensa duas vezes e recorre ao agenciador.

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Na opinião de Everton Dias, muitos deles chegam a passar a perna nos motoristas, que precisam ficar atentos aos valores do frete e da comissão pedida

Para Rildo Cardoso de Souza, 26 anos de idade e quatro de profissão, natural de Terra de Areia/RS, quando procura carga a primeira providência é ligar para as empresas conhecidas, depois recorrer aos agenciadores. Ele dirige um caminhão Scania 2010 equipado com carreta transportando carga seca e garante que não dá para ficar parado. Por isso não se incomoda de pagar a comissão exigida pelo agenciador. “É preciso ter jogo de cintura com eles”, afirma. Ele lembra que quase sempre é preciso negociar o valor da comissão, que é variável de acordo com o preço do frete. Lembra que já aconteceu de ligar para uma transportadora pedindo carga e não conseguiu. Ao seu lado, o agenciador ligou e a carga, no mesmo momento, estava disponível. “Coisa estranha”, ironiza.

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Para Reginaldo Arminda, os motoristas precisam parar de procurar cargas com agenciadores e negociar direto com as transportadoras

A atividade dos agenciadores de cargas, na opinião do motorista Everton Dias, 36 anos e 10 de profissão, natural de Urussanga/SC, pode ser considerada como um mal necessário. “A bem da verdade, muitos deles chegam a passar a perna nos motoristas, por isso é preciso ficar atento às negociações, valores dos fretes e a comissão pedida”, adverte. Viajando nos Estados de Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo como empregado de uma transportadora, na maioria das vezes ele tem carga certa, não precisando, portanto, recorrer aos serviços de agenciadores. Lembra que já aconteceu, mas faz tempo. Segundo ele, para o motorista não é um bom negócio, porque a comissão do agenciador sai do valor do frete, que já é baixo. E para o agenciador é rentável, pois ganha do motorista e muitas vezes da empresa, sem falar nos casos em que alguém de dentro da empresa também leva “o seu”, tirando do patrão e do motorista.

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Apesar de ter carga certa, Sandro Márcio da Silva afirma não se importar em pagar comissão se precisar de uma carga de retorno

Mais radical, Reginaldo Arminda, 36 anos, 18 de estrada, natural de Maracajá/SC, acredita que os motoristas precisam parar de procurar cargas com agenciadores e negociar direto com as transportadoras. Garante que, felizmente, não depende deles para carregar, não precisando esperar em filas, salas pequenas e abafadas, disputando cargas com fretes baixos e ainda pagar comissão alta. Além disso, afirma, eles ganham dos dois lados: do motorista e da empresa e com isso puxam o valor do frete para baixo. Quem perde é o motorista. “O certo é procurar as empresas, se organizar, ter um caderno com endereços, telefones, trabalhar direto e evitar os intermediários”, enfatiza.

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O agenciador Walter Silva diz que muitas transportadoras preferem a intermediação, porque ele envia o caminhão certo e os valores já negociados

Sandro Márcio da Silva, 35 anos e 10 de boleia, dirige um bitrem graneleiro e quase sempre tem carga certa. Porém, se acontecer de precisar de uma carga para não voltar vazio recorre ao agenciador, mesmo sabendo que o valor do frete pago pela empresa vai chegar a ele bem abaixo, com descontos para alguém lá de dentro e a comissão do agenciador. “Mas se ficar parado é pior, o prejuízo é maior”. Segundo ele, não existe outra opção. O motorista não pode ficar rodando à procura de frete, muitas vezes sem conhecer a cidade, ou as transportadoras. Então, por indicação de colegas, vai pelo caminho mais fácil, mesmo sabendo das consequências.

As transportadoras estabelecem o preço do frete, cabe ao agenciador oferecê-los aos carreteiros, que decidem aceitar ou não, explica Leandro dos Santos
As transportadoras estabelecem o preço do frete, cabe ao agenciador oferecê-los aos carreteiros, que decidem aceitar ou não, explica Leandro dos Santos

Com 60 anos de idade, o aposentado Walter Silva se dedica a agenciar cargas há mais de 25 anos. Há cerca de 16 anos ele trabalha no estacionamento do Posto Buffon, na BR-386, em Canoas/RS. Tem uma clientela fiel e se tornou amigo da maioria dos carreteiros que o procuram. Reconhece que muitas transportadoras preferem a intermediação do agenciador, que envia os caminhões certos, valores negociados e sem maiores problemas. Garante que sempre procura “ver o lado do motorista” na hora de cobrar a comissão. Sabe que desde o momento em que o carreteiro sai de casa ele está gastando e que os valores dos fretes são baixos. Por isso, procura cobrar um valor coerente, sempre negociável. A tabela vai de R$ 50 a R$ 300, “tudo negociável”, repete.

Walter conta que já socorreu muitos motoristas que ficaram no estacionamento sem dinheiro para alimentação e mesmo para abastecer o caminhão. Depois, quando conseguiam carregar, ele recebia esses valores da empresa, que descontava do valor do frete. “Ninguém perdia nada e todos ficam bem”, ressalta. Ele acredita ter os telefones de umas 150 empresas em suas agendas. E, quanto ao número de carreteiros que atende, nem imagina. Eles chegam, acertam a carga e vão embora. Alguns voltam a cada viagem. Outros, nunca mais. É a vida”, diz.

O agenciador de cargas, Leandro dos Santos, 53 anos e no setor de transportes desde os 13 anos, classifica a atividade como qualquer outra profissão, desempenhada com seriedade e respeito mútuo com empresas e carreteiros. Explica que as transportadoras estabelecem os preços dos fretes e fazem a concorrência entre si, cabendo ao agenciador passar esses valores ao carreteiro que pode aceitar ou não, dependendo de seus interesses e necessidades. De acordo com os valores estabelecidos pelas transportadoras é cobrada a comissão, sempre dentro da realidade local de mercado.

Leandro conta que também já socorreu financeiramente muitos carreteiros e também já levou muito calote, sobretudo com cheques devolvidos por falta de fundos. “Uns 150 cheques”, afirma desolado. Diz ter uma carteira com aproximadamente 300 transportadoras do Brasil, Argentina, Paraguai e Bolívia, estando apto a conseguir sempre os melhores fretes para os carreteiros. Está estabelecido na BR-386, em Canoas/RS, onde trabalha com o auxílio de um filho, celular, MSN e e-mails que o mantém conectado o tempo todo, sabendo as cotações dos fretes e a disponibilidade de cargas em todas as partes. “Afinal, não é um serviço para amadores”, garante.