Por Evilazio de Oliveira
Entre os donos de caminhões mais antigos, a queixa é geral. Todos reclamam dos valores dos combustíveis, dos pedágios e dos fretes e da péssima conservação das estradas. Dizem que se encarecer muito, o consumidor fi nal não vai poder pagar pela mercadoria transportada. Segundo eles, o pessoal continua no trecho por teimosia, trabalhando apenas para manter o bruto e sustentar a família, com um mínimo de conforto.
Em alguns casos, quando surge um problema no caminhão, que não seja muito grave, a alternativa é meter as mãos na graxa. Gaúcho de Bagé, Pedro Fávero, 44 anos e 20 de estrada, dono de um Fiat 81, afi rma que como a coisa está não dá nem para imaginar a compra de um caminhão zero. “Ou mesmo, um pouco mais novo”. Ele conta que reformou o motor há uns dois anos e gastou cerca de R$ 5 mil. Mas, de vez em quando, surge algum imprevisto. Na ocasião, ele tentava consertar sozinho um problema no motor de arranque. Fávero diz que tem outro caminhão, um Scania 81, mas pensa seriamente em vender os dois e abandonar a profissão.
Rogério José Felisbino tem 36 anos e 12 de profi ssão. Mora no município de Morro da Fumaça/SC e é dono de um Mercedes-Benz 72. Reformou o motor há três anos e comprou pneus novos. Agora, pensa em gastar mais uns R$ 6 mil para dar “uma geral” na lataria e na mecânica. Afi nal, é com esse caminhão que viaja nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul e consegue livrar uns R$ 4 mil no fi nal do mês. Rogério pensa em trocar de veículo, pegar um mais novo e fazer viagens mais longas. Mas, por enquanto, apenas imagina. ele prefere fazer as coisas com os pés-no-chão e, como a situação está muito difícil para o pessoal do trecho, é melhor esperar um pouco.
O carreteiro Jandir Antônio Braum, 37 anos e 12 de boléia, de Cascavel/ PR, e dono de um Mercedes 81, tem o caminhão há 12 anos e gosta da marca porque considera de manutenção fácil e barata. Reformou o motor há cerca de dois anos e cuida para que tudo esteja funcionando direito, fazendo revisões periódicas para evitar prejuízos maiores. O caminhão de Jandir vale em torno de R$ 60 mil e ele precisaria de aproximadamente R$ 160 mil para comprar outro modelo da marca “mais atualizado”, por isso ele vai tocar por mais um ano e decidir o que fazer da vida: trocar de profi ssão ou trabalhar como empregado. Garante que está sempre no limite, fazendo muita economia para manter o bruto e a família. Além de cuidar da manutenção, também investiu num rastreador como forma de baratear o seguro e ter mais segurança nas estradas.
Depois de ter o caminhão que dirigia roubado em São Paulo, há seis meses, Sérgio Vieira, 44 anos e 18 de profi ssão, pensa em transportar cebola da Argentina, na próxima safra. Ele trabalhava como empregado e a Polícia recuperou o caminhão. E enquanto espera a colheita, viaja com Leonel Borré, 26 anos, que há seis meses está no trecho com uma carreta Scania 74. Comprou o caminhão por R$ 50 mil e ainda “está pegando o jeito da coisa”, por isso, conta com a companhia e a experiência de Sérgio. O veículo roda com um motor 81, mesmo assim, Borré se prepara para gastar mais um pouco e deixá-lo em melhores condições para trabalhar. Já fez algumas viagens para a Argentina e acha que tudo vai dar certo. Pelo menos quer trabalhar bastante e logo passar para um modelo mais novo, da mesma marca, garante.
Os donos de caminhões mais antigos quase sempre recorrem a oficinas de mecânicos conhecidos ou recomendados por colegas de estrada. Muitas vezes, quando o serviço é maior, chega a ser executado em vários locais. O mestre da Retifi cadora Novo Hamburgo, em Novo Hamburgo/RS, Argeu Araújo, 41 anos e 20 como retifi cador, diz que trabalha basicamente com motores de caminhões. Principalmente Mercedes, “que tem maior quantidade por aí”. Em geral, o motorista só leva a carcaça do motor para a retifi ca e a montagem é feita noutro local. Porém, é mais comum o carreteiro deixar o caminhão e dentro de cinco dias retirá-lo com o motor totalmente reformado e em condições de rodar “quase” a mesma quilometragem de um novinho em folha, afirma.
Argeu Araújo lembra que os Mercedes mais antigos agüentavam até 200 mil quilômetros. Agora, os novos modelos, chegam fácil aos 800 mil, desde que bem cuidados. “E cada vez são fabricados motores mais resistentes, capazes de superar 1 milhão de quilômetros”, diz. Agora, a forma como o carreteiro cuida do seu caminhão é muito importante – esclarece – não forçando demais, fazendo as marchas no tempo certo, cuidando da temperatura e da lubrifi cação. Quando abre um motor, Agrou já sabe o perfi l do motorista, se é cuidadoso ou não. Ainda mais se trabalha como empregado, observa rindo. “Daí sim, tem muita gente que abusa mesmo, não cuida.”
Valter Ribeiro, 34 anos, trabalha há 15 como retifi cador. Explica que muitas vezes a troca de marchas mal-feitas acaba danifi cando as bielas, com a necessidade de trocá-las por novas e, consequentemente, mais despesa. E, de novo, o conselho de quem vê os danos que o motor sofreu durante os anos e quilômetros de trabalho nas estradas: nada de forçar, cuidar da lubrifi cação e da temperatura. Enfim, uma coisa que todos sabem. Principalmente quem está no trecho com um caminhão antigo e que precisa dele para trabalhar.