Por Daniela Giopato
Fotos: Alexandre Andrade
A redução da movimentação de carga e do valor do frete e do outro o aumento do óleo diesel e das demais despesas que elevaram o custo do transporte rodoviário de cargas, foram a base dos principais problemas enfrentados pelos motoristas de caminhão em 2015. As dificuldades atingiram tanto os profissionais autônomos quanto empregados e agregados, que trabalharam muito menos, passaram mais tempo parados em postos de serviço à espera de carga, com queda brutal no faturamento.
Diante do momento difícil, com alta taxa desemprego e baixo desempenho da economia, além da falta de credibilidade nos rumos da política do País, os carreteiros não acreditam em grandes mudanças para 2016. Porém, admitem estarem mais bem preparados para encarar um ano duro pela frente, com total contenção de despesas.
“O movimento caiu cerca de 40%, como consequência o meu faturamento também, pois apesar de trabalhar com registro em carteira, quanto menos carrego menor será a minha comissão”, explicou Jadir André Pereira Teles, de Ijui/RS, 45 anos, motorista há 18. Ele definiu 2015 como um ano difícil, de aumento de custos, e para contornar a situação teve de controlar mais os gastos para sobrar um pouquinho mais no final do mês.
Teles acrescenta que as empresas também estão tentando driblar a crise enxugando os gastos, exigindo mais responsabilidade do motorista ao dirigir e buscando cargas mais leves que resultem em menos despesas. “Se o patrão vai bem, vamos bem, por isso é preciso colaborar também”, justificou. Quando o assunto é o ano novo, o motorista não se sente muito animado e acredita que a situação vai mudar bem pouco. “O jeito é esperar passar a crise e procurar não fazer dívidas”, concluiu.
Na opinião do motorista também empregado, Evandro dos Reis Rosa, 38 anos de idade e 10 de profissão, no segundo semestre o transporte de carga caiu em torno de 20%. Diz que tem salário fixo, por isso não enfrentou problema, mas destaca que o tempo perdido à espera de carga nos postos de serviço é um grande inconveniente. “Chego a esperar durante uma semana por uma carga de retorno boa. Antes, aguardava no máximo dois dias”, explicou.
Evandro acredita que isso tenha sido um dos motivos que levou motoristas a desistirem da profissão, porque não é todo mundo que aguenta viver nessa situação, mas alerta que existem outros motivos, como o aumento dos custos. Ele cita dois exemplos básicos, como o preço do banho e da alimentação na estrada. Neste segundo caso, a saída citada por ele foi os colegas se juntarem para preparar as refeições no próprio caminhão.
“O jeito é juntar as panelas. Cada um dá um pouco do que tem e preparamos o almoço e o jantar”, brinca. Ele também não conta com grandes mudanças em 2016, mas afirma que já está preparado para mais um ano difícil. “Minha esposa voltou a trabalhar e iniciamos uma poupança para casos de emergência”, destacou.
Diferente dos colegas, Jacinto Neri Marsaro, 51 anos de idade e 15 de profissão, classifica 2015 como um ano mais tranquilo. Motorista com registro em carteira, mas sem comissão, diz que não sofreu queda em seu faturamento, porém reconhece que o momento não é bom para a categoria por conta da redução de viagens realizadas, principalmente no segundo semestre de 2015. “Dependemos da saúde financeira da empresa, então precisamos fazer o trabalho direito e conseguir cargas boas para que o nosso emprego esteja garantido”, opinou.
Marsaro destaca que o fato de não trabalhar mais com comissão melhorou muito a sua vida e aumentou a segurança. “Imagina se eu dependesse de comissão? Estaria estressado e com o faturamento bem comprometido”, explica. Em relação a 2016 diz não ver ‘luz no fim do túnel’, afirma estar sem perspectiva e diz estar preparado para enfrentar mais um ano difícil. “Vou trabalhar para sobreviver e me programar melhor”, finalizou.
Aumentar o faturamento e conhecer lugares diferentes era o objetivo do gaúcho Joer Cesar de Oliveira, 32 anos de idade, quando decidiu trocar o trabalho na distribuição urbana pelas rotas rodoviárias. Porém, em conversa com reportagem da revista O Carreteiro, ele disse que já acreditava ter feito uma escolha errada porque nada do que esperava aconteceu. “Há três anos, meus colegas ganhavam dinheiro na estrada, a comissão chegava a 12% do valor que era transportado. Até o final de 2014 e início de 2015 consegui ganhar algum dinheiro, mas no segundo semestre as coisas mudaram e perdi mais de 10%”, conta.
Diz que chegou a ficar esperando carga de retorno, no posto de serviço, por quase duas semanas. Como ele não tem caixa de cozinha no caminhão, disse que compra para apenas uma refeição e depois fica a base de pão, fruta, salgado ou pastel. Conta que antes conseguia passar os dias na estrada com R$ 100,00, mas atualmente gasta R$ 150,00 devido ao aumento dos custos em geral. “Se eu não der meus pulos fico sem dinheiro. Faço apenas uma refeição principal para economizar”, comenta.
Outro problema enfrentado em 2015 foi o frete. Oliveira disse que o motorista de caminhão se viu obrigado a pegar o que aparecesse. Lembra de uma carga que pegou do Sul para São Paulo no valor de R$ 3.800,00, pela qual recebeu R$ 400,00 de comissão, sem contar as despesas diárias. Seus planos para 2016 são de voltar para o transporte urbano. “Tenho esposa e duas filhas, se a situação não melhorar eu largo a estrada e volto para o trabalho na cidade”, afirmou.
O autônomo Washington Celestino, de São Paulo/SP, tem 45 anos e há 23 atua no transportem rodoviário de carga. Carrega todos os tipos de carga e em 2015 viu o seu faturamento despencar entre 30 e 40% e as despesas aumentarem. Lembra que começou a usar o cartão de crédito para algumas emergências, como despesas de manutenção, e passou a pensar melhor antes de aceitar uma carga. “Acredito que esse seja um dos piores momentos que estou enfrentando desde que entrei na profissão. É preciso muito cuidado para não escolher a carga errada. Tudo tem que ser colocado no papel”, adverte. Como muitos brasileiros, Celestino espera que em 2016 seja menos pior, porém, admite ter a impressão de que a situação não vai mudar muito. Como prevenção, diz que continuará fazendo conta e mais uma vez vai adiar troca de seu caminhão 2007 por um modelo zero quilômetro.
O veterano Mário Farias, de São Paulo/SP, 51 anos na profissão, também é autônomo e atualmente trabalha com entrega de bebidas em São Paulo. Durante muitos anos viajou pelo Brasil inteiro e garante que já vivenciou outras crises econômicas. Quando perguntado se o atual momento econômico do Brasil interferiu em sua rotina, afirma que tudo funcionou bem até o mês de setembro. “No início de novembro o movimento caiu 50%, com o aumento dos custos como combustível e inflação alta, as pessoas diminuíram o consumo de bebidas”, acredita.
Farias disse que já começou a sentir no bolso a queda do movimento. Quando conversou com a reportagem da revista O Carreteiro, em meados de novembro, disse que havia 15 dias que estava sem receber nada. “Confesso que comecei a ficar preocupado, porém, estou um pouco tranquilo, pois, nos tempos de vacas gordas investi em algumas casas para alugar”, revelou na ocasião. Comentou sentir-se satisfeito por ter conseguido formar seus filhos e não ter muitas dividas. Otimista, acredita que a situação comece a melhorar em 2016.
O argentino José Maria, 45 anos de idade e há 15 na atividade, carrega carga geral da Argentina para São Paulo e Rio de Janeiro. Em sua opinião, apesar da crise econômica do País, o principal problema da situação do motorista brasileiro é a desvalorização do profissional. Ele diz que começou a viajar para o Brasil há dois meses e nota a nítida diferença de valores entre o que ele recebe fazendo o mesmo trabalho de um motorista brasileiro. “Todas as minhas despesas são pagas, e se acontece algum imprevisto recebo custo adicional para comer e ficar o tempo que precisar. Aqui no Brasil tudo é diferente, parece que sai tudo do bolso do motorista. A profissão deveria ser mais reconhecida”, opina. Como muito otimismo, afirma que 2016 será um ano bom. “As coisas vão melhorar”.
MUITO CAMINHÃO, POUCO FRETE
Existem duas situações agravantes para o setor do transporte rodoviário de carga neste momento: uma é a falta de fretes devido à queda na movimentação econômica; a outra é o crescimento desproporcional da frota de caminhões. A explicação é do presidente da Confederação Nacional do Transportador Autônomo (CNTA), que afirma ainda que este ano o rendimento do motorista caiu em 30%, percentual baseado na oferta de cargas e na movimentação nas estradas. “Até as cargas segmentadas, como as líquidas e de cegonheiros, estão sofrendo depreciação de valores”, acrescenta.
Bueno disse que o aumento expressivo no número de caminhões lançados no mercado foi mais intenso a partir de 2012, justamente no período em que houve uma retração do PIB, causando, em grande parte, a crise pela qual passa o setor, com endividamento estimado em 40 bilhões de reais, conforme levantamentos feitos pelo setor de transporte. “Os programas de incentivo para a compra de caminhões novos, como o Finame e Procaminhoneiro, serviram apenas para incrementar as vendas dos fabricantes e não voltados para a renovação da frota”, explicou Bueno. Atualmente temos um excedente de 300 mil caminhões.
Em relação às expectativas, acredita que se a crise for estancada por ações econômicas do governo federal, não haverá recuperação imediata e será preciso aguardar mais um ano para o Brasil voltar a crescer. Ainda de acordo com Bueno, enquanto isso o motorista deve administrar ao máximo suas despesas e não se afundar num precipício de viagens com fretes sem qualquer rentabilidade. Isso porque a partir do momento que ele fizer isso, terá que apelar para os juros exorbitantes do cheque especial até começar a ter que se desfazer do seu patrimônio.