Por Evilazio de Oliveira Fotos Gilmar Gomes
O transporte rodoviário de cargas no Brasil é feito por uma frota de caminhões envelhecida, que trafega por estradas esburacadas, mal sinalizadas, inseguras e parte delas com tarifas de pedágio consideradas altas. Ao longo dos anos os carreteiros acostumaram a ouvir críticas, sendo responsabilizados por muitas coisas, a começar pela má conservação das estradas, cujas coberturas asfálticas estão constantemente danificadas pelo excesso de peso das cargas que transportam e que ultrapassariam os limites estabelecidos pela ANTT (Agência Nacional de Transporte Terrestre). A partir daí, surgem dezenas de outras críticas à categoria, incluindo-se também o envolvimento em grande número de acidentes ocasionados pelo cansaço derivado do excesso de horas ao volante, que pode ressaltar em maior desgaste físico, apresentando dificuldades de fazer uma curva ou de frear o caminhão. Além disso, ocorrem desgastes e danos à suspensão e eixos, o que também pode contribuir para ocorrência de acidentes.
De acordo com a resolução nº 337 do Contran, de 17/12/2009, a tolerância de 7,5% por eixo teve o prazo estendido para 30 de junho de 2010. Porém, o peso bruto não deve exceder a tolerância de 5% determinada pela resolução 258/08 de 30 de novembro de 2007. Nas rodovias federais concedidas, a fiscalização é realizada pela ANTT e nas demais rodovias federais o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura do Transporte) – e nas estaduais pelos respectivos DER´s.
Com o passar do tempo, a lei acabou criando um mau hábito entre os transportadores, que aumentam o peso da carga transportada baseados nessa margem de 5%. Outros, mesmo com a tolerância, e ignorando as consequências, acabam se arriscando e colocam peso a mais no caminhão para aumentar o faturamento no final do mês. Porém, a ANTT alerta que quando é detectado o excesso de peso tanto no eixo quanto no Peso Bruto Total, o motorista deve providenciar o remanejamento ou o transbordo da carga excedente para outro veículo, para que possa seguir viagem.
Para o carreteiro Anderson de Souza, 32 anos e 14 de estrada, carregar além dos limites de peso é arriscado e não compensa o pouco lucro que possa ter no frete. Dirigindo entre Santana do Livramento/RS e Rio de Janeiro/RJ, ele destaca que a maioria das empresas carrega dentro da tonelagem adequada, evitando transtornos com multas e até mesmo o transbordo de cargas nas balanças. Salienta que além da preocupação com a fiscalização, também é preciso pensar na segurança, no desgaste dos freios, do motor e no consumo de combustível. Acredita que com todos os riscos e desvantagens somados não vale a pena querer ganhar um pouco mais rodando com excesso de carga. “Além disso, o patrão no gosta”, conclui.
Outro motorista que diz evitar o excesso de peso nas cargas que transporta é Marcos Antônio de Almeida, 42 anos e 22 de profissão. Natural de Flores da Cunha/RS, trabalha com um baú câmara fria entre Campo Grande/MS e a Serra Gaúcha, levando frutas na maioria das vezes e retornando com carne. Segundo ele, sempre procura carregar dentro dos limites legais, observando a margem de tolerância. Todavia, reconhece que esses limites por eixo nem sempre funcionam em razão das cargas fracionadas, e que na medida em que são descarregadas modificam a distribuição do peso. Por isso, a situação fica difícil e convém não se arriscar, conforme observa. Qualquer multa já vai pesar bastante na planilha de custos da viagem, ainda mais quando a prestação do caminhão é alta. “Isso sem contar o desgaste do caminhão, dos freios e dos pneus, mais esforço para dirigir, até mesmo o asfalto acaba estragando”. Ele conta que já foi pego por excesso de peso e teve de fazer transbordo com carga. “Foi uma bagunça e o lucro da viagem se foi. Agora, para evitar incômodos é melhor carregar dentro dos limites”, observa.
Menos preocupado em manter os limites de peso das cargas que transporta, Fernando Turquete, 33 anos e quatro de direção, admite que tudo depende do trajeto e da mercadoria que transporta. Natural de Roque Gonsalez/RS, ele costuma comprar alfafa e aveia na região para revender em municípios da Grande Porto Alegre, onde tem clientes certos. Nessas ocasiões carrega o que dá, muitas vezes comprando o produto para a revenda em locais onde não haja a fiscalização por balanças. No retorno, leva carga variada e sem problemas de peso. Diz que nunca foi multado, mas reconhece eventuais problemas de desgaste para o caminhão, um truck ano 85. “Mas fazer o quê? É preciso ter jogo de cintura”, justifica.
Depois de muito tempo na estrada dirigindo um caminhão trucado, Ari Maggioni, 50 anos e 30 de profissão, natural de Boa Vista do Sul/RS, comprou um cavalo-mecânico ano 97 com carreta. Ele viaja para o Mato Grosso/MS e tem definido um esquema de trabalho junto com o filho, em que ambos vão para o trecho, cada um com um caminhão. Quanto a eventuais excessos em relação ao peso das cargas, Maggioni admite que nas estradas onde não há fiscalização com balanças ele carrega no limite, “talvez passando um pouquinho”. Reconhece, todavia, que o excesso de peso é arriscado em todos os sentidos, inclusive na segurança do veículo, por isso acredita que o melhor mesmo é trafegar com a carga no peso certo para evitar transtornos. Salienta que não são os carreteiros e nem excesso de peso das cargas que danificam as estradas. “Quem estraga a estrada é quem a faz”, garante.
Com 20 anos de profissão dirigindo carreta cegonha, Itagibe do Prado Alves, aos 50 anos e 26 de volante, natural de Vacaria/RS, conta que finalmente conseguiu trabalhar perto de casa. Atualmente, ele dirige uma carreta em Caxias do Sul/RS entregando ferro de uma empresa distribuidora para indústrias da região. Garante que está tranquilo. Só carrega dentro dos limites e as viagens são curtas. Mesmo que quisesse carregar quantidades maiores de ferro não poderia, porque as entregas são programadas. “E o salário é o mesmo, tudo muito organizado”. De qualquer maneira, Itagibe garante que é contra o excesso de peso por vários motivos, incluindo o desgaste do caminhão, falta de segurança e pelo fato de prejudicar o colega que vai ter mais dificuldade em conseguir um frete. O mesmo tipo de preocupação com os colegas e com a justa distribuição dos fretes é manifestada pelo carreteiro Mário Teixeira Luiz, de Guarulhos/SP, 38 anos e 20 de cabine. Ele dirige uma carreta entre a região Nordeste e Rio Grande do Sul transportando frutas. Garante que prefere sempre carregar dentro dos limites legais do caminhão, evitando problemas nas balanças, multas e a falta de segurança ocasionada pelo excesso de peso. Além disso, considera que carregar a mais do que o permitido tira o trabalho de outro chefe de família, que também precisa trabalhar. Critica alguns condutores de bitrens que transportam tonelagens acima do permitido e muitas vezes usando uma segunda nota para “passar a perna no patrão e embolsar a diferença”. Lembra que esse fato é muito comum no transporte de gesso, em Trindade, Pernambuco, onde os motoristas carregam a mais e ainda levam uma segunda nota para a mercadoria transportada para outro cliente. É o chamado “cachorro”, muito comum no trecho, mas que na verdade é uma pouca vergonha, salienta. Segundo ele, os donos dos caminhões sabem dos riscos do excesso de carga e na maioria das vezes proíbem que os seus motoristas ultrapassem os limites de peso ao carregarem. Lembra que o embarcador também deve ser responsabilizado nos eventuais excessos, pois, evidentemente, também é culpado pelos riscos que uma carga acima do peso vai causar nas estradas, ao caminhão, motorista e certamente a todos os veículos que estejam na rota.
Natural de São Marcos/RS, Alcemar Cegato, 37 anos e 18 profissão, transporta ferro de Caxias do Sul/RS para o Paraná em uma carreta e retorna com madeira ou papel. Lembra que numa ocasião, para atender a um cliente, carregou com excesso de peso e por sorte não foi pego na balança. “Aconteceu apenas uma vez – recorda – e mesmo assim não foi por vontade própria, foi uma circunstância especial”, diz. Ao criticar motoristas que transportam cargas acima do peso permitido, lembra que é filho de carreteiro que “quebrou” apesar de sempre transportar cargas com excesso de peso. “Não vale a pena”, conclui.