Por Evilazio de Oliveira

A falta de motoristas qualificados para o transporte rodoviário de cargas, mais as dificuldades para atrair novos profissionais, além das inevitáveis exigências de experiência, podem resultar num apagão no setor pela absoluta falta de mão de obra. Na opinião de pessoas ligadas ao meio, já passou da hora de empresas e governo se preocuparem seriamente com o assunto. À medida que motoristas saem do mercado por idade, aposentadoria ou mesmo por troca de profissão, essa mão de obra não é reposta na mesma proporção. Destaca-se, também, o constante aprimoramento tecnológico dos caminhões, sem que haja um efetivo treinamento para que os condutores saibam tirar o máximo proveito dessas inovações.

Para as novas gerações de candidatos a motorista de caminhão, as alternativas são as auto-escolas para as aulas práticas, teóricas e para a primeira CNH para a condução de caminhões de carga. Como poderia o indivíduo, com apenas algumas horas de volante se aventurar a pegar a estrada com um caminhão grande, carregado, em estradas desconhecidas e muitas vezes embaixo de mau tempo? É o desafio do primeiro emprego que, paradoxalmente, se torna muito difícil no Brasil, apesar da grande oferta de vagas.

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O gerente de frota Valdir Bengivenga diz que na falta de motoristas experientes a opção é treinar novos candidatos até deixá-los dentro do perfil exigido pela empresa

Na opinião de Valdir Bengivenga, 57 anos, 25 de volante e há 10 anos no cargo de gerente de frota da Polivias S.A. Transportes – empresa com matriz em São Paulo, com atuação no território nacional e internacional – na falta de profissionais experientes, a opção é treinar os novos candidatos, mesmo sem experiência. Depois de aprovados pelo RH, que determina se eles estão dentro do perfil exigido pela empresa, ficam trabalhando no pátio, efetuando cargas e descargas, pequenas manobras, levando ou buscando caminhões na Eadi (o porto seco de Uruguaiana) ou fazendo “cruzes de fronteira” até o desembaraço final da documentação para que o motorista oficial siga viagem. Depois de algum tempo é que começam no trecho, sempre acompanhado de um motorista experiente. “É preciso ter humildade e força de vontade”, reconhece Valdir Bengivenga. Mas, é a única maneira de se preparar um bom profissional, ressalta.

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Para o instrutor Ricardo Amado, é necessário que o novo motorista saia com alguém experiente ao lado para ir aprendendo aos poucos os macetes da profissão

Para o instrutor de auto-escola, Ricardo Amado Martha, 45 anos, 12 de estrada e oito na função de preparar novos motoristas de caminhão, é inegável que os alunos não saem devidamente preparados para enfrentar as rodovias. A auto-escola prepara o básico, com legislação e técnicas de condução do veículo, no perímetro urbano, para a obtenção da CNH. “É necessário que o novo motorista saia com alguém experiente ao lado, para ir aprendendo aos poucos os macetes”, diz. Lembra que é difícil, a maioria se acha bem preparada e já quer começar logo na profissão. “Falta humildade”, acentua.

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Há dois anos trabalhando com um caminhão trucado no transporte internacional, Claudemir Lopes vai mudar a categoria de sua CNH para dirigir carrreta

Claudemir Lopes Espíndola, natural de Uruguaiana/RS, tem 26 anos e há dois anos dirige um caminhão no transporte internacional. Está fazendo auto-escola para a troca de CNH, quer conduzir carreta. Ele acredita que não vai ter dificuldades porque já tem experiência com veículos maiores e de maior tonelagem na própria empresa onde trabalha. Apenas lhe faltava a Habilitação, que vai lhe facilitar uma promoção e aumento no salário. Conta que começou a viajar com um amigo e se interessou pela profissão desde cedo. Agora a intenção é se aperfeiçoar cada vez mais, fazendo cursos sempre que for possível para crescer na atividade.

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Luiz Eduardo Rosso já fez vários cursos, mas não consegue emprego devido à falta de experiência e agora quer dirigir veículos pesados para pegar prática

Outro apaixonado pela estrada é Luiz Eduardo Rosso Jacques, natural de São Borja/RS, que sonha em ser motorista de caminhão. Aos 40 anos e com CNH classe AD, que lhe possibilita dirigir automóveis, motos e ônibus, ele agora quer dirigir caminhões para ir pegando prática com veículos pesados. Prepara-se para fazer novos cursos e continuar se aperfeiçoando. Ele conta que investe na profissão e mostra diversos certificados dos cursos que já fez, porém, ao procurar uma oportunidade de trabalho, sempre esbarra na “falta de experiência”. Mesmo assim, não desiste do seu sonho. Acredita que terá sua oportunidade.

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Empresário de transporte, Paulo Roberto Lemos procurou parcerias para treinar e capacitar motoristas, não conseguiu e decidiu investir por conta própria em treinamento

Na tentativa de resolver o problema da falta de motoristas ou de profissionais com pouca experiência, o empresário Paulo Roberto Lemos de Souza, 39 anos e 15 no setor de transportes, decidiu treinar e capacitar os seus profissionais. Ele é dono da GRT Log – Transporte e Logística Ltda., de Uruguaiana/RS, empresa que atua no transporte nacional e internacional de cargas. Destaca que o setor vive um gargalo com a falta de bons profissionais. E, como antes de procurar “motoristas” ele procura “homens de boa conduta”, decidiu formar seus próprios profissionais. Com investimento inicial de aproximadamente R$ 6 mil, mas que pode chegar a R$ 20 mil, contratou o instrutor master driver José Delmiro Marques, para treinar um grupo de 10 futuros motoristas. Paulo Souza conta que buscou parceria com o Sest/Senat para ter um local onde seriam ministradas as aulas teóricas. O valor do aluguel da sala foi considerado muito alto e, no final, o Sindimercosul ofereceu graciosamente um local, mandando construir uma sala especialmente para as aulas teóricas do curso. Ele procurou também fazer parcerias com colegas transportadores, mas como ninguém demonstrou interesse, decidiu bancar a empreitada sozinho, mesmo sabendo do risco de também treinar motoristas para os seus concorrentes. “Faz parte do jogo”, explica de bom humor. Mesmo antes de terminar o treinamento da primeira turma, dois motoristas já foram selecionados e contratados. Com isso, tem muita confiança e acredita que esse tipo de treinamento para novos motoristas será permanente.

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O instrutor José Delmiro Marques, que já passou por montadoras de caminhões, começou a treinar motoristas, mas admite que alguns estão ainda “muito verdes”

Para o instrutor José Delmiro Marques, 49 anos, 30 de profissão, natural de São Gabriel/RS, master driver pela Scania, Mercedes, Volvo e com longa experiência no treinamento de motoristas de caminhões, esse é um novo desafio: preparar em 30 dias profissionais capazes de enfrentar a estrada com segurança e responsabilidade. Ele utiliza no treinamento um Scania 78 (Jacaré), com baú, que serve para a etapa inicial do curso prático de direção. Depois os candidatos vão para caminhões mais novos, quando aprenderão a utilizar as novas tecnologias embarcadas. Além das aulas práticas, todos passam pelas aulas teóricas onde ficam sabendo conceitos técnicos dos caminhões, do transporte e até mesmo da burocracia nas aduanas. Também ficam sabendo de itens referentes à parte comportamental do motorista, necessidade de boa educação no trânsito, boa apresentação e da necessidade de adaptação aos novos tempos. Delmiro admite que alguns candidatos “estão muito verdes”, mas acredita que no final todos estarão perfeitamente capacitados para o cargo de motoristas carreteiros, dirigindo com segurança, economia e responsabilidade.

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Com vários cursos e experiência de oito meses com caminhão trucado, Thiago Oliveira Carrício enfrenta o problema da falta de experiência profissional

Aos 26 anos, CNH categoria AE e todos os cursos necessários para o exercício da profissão, Thiago Oliveira Carrício está desempregado e sempre esbarra na falta de experiência quando se candidata a uma vaga para carreteiro. Ele chegou a trabalhar por oito meses dirigindo caminhão trucado, e agora acredita que essa “oportunidade que o seu Paulo Roberto está dando caiu do céu”. Garante que está se esforçando ao máximo e tem a esperança de ser admitido na própria empresa. “Vai ser a minha salvação”, diz ele.

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Desempregado e com experiência de sete anos com caminhões toco e trucado, Neimar Moiano está desempregado e se preparando profissionalmente

Outro candidato, Neimar Moiano de Paula, 39 anos e sete anos dirigindo caminhões nas configurações toco e trucado, também está confiante em ser admitido como motorista do “seu Paulo”. “Afinal, o homem está nos dando essa oportunidade e não podemos desperdiçar”. Neimar também está desempregado e a falta de experiência o tem impedido de conseguir trabalho, mesmo existindo muitas vagas nas transportadoras. Ele também tem todos os cursos, inclusive para a condução de ônibus. Pretende trabalhar no transporte internacional por causa do salário, “que é um pouco melhor”.

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Desempregado e sem experiência em dirigir na estrada, Luiz Carlos de Deus dos Santos, está fazendo curso e confiante de que terá mais oportunidade no mercado

Luiz Carlos de Deus dos Santos, 40 anos e 12 como motorista de caminhão toco e trucado, sempre trabalhou em transportes no perímetro urbano e não tem experiência de dirigir na estrada. Está desempregado e lamenta que ninguém lhe dê oportunidade para o primeiro emprego como carreteiro. Por isso, está feliz com o curso. Confessa que está aprendendo bastante e ao final, certamente, será um ótimo motorista. E também não poupa elogios ao “seu Paulo e ao seu Delmiro – que Deus os ilumine – pelo que estão fazendo por nós”, finaliza.