Avançados processos de produção, robôs, novos materiais, objetos físicos conectados à Internet executando determinada ação de forma coordenada, inteligência artificial – na qual a computação procura simular a capacidade humana de raciocinar, tomar decisões e resolver problemas – entre outras ciências e tecnologias, são elementos da indústria 4.0, pela qual são produzidos os caminhões atuais

Por: João Geraldo

Fotos: Divulgação

Há cerca de um ano, a Mercedes-Benz anunciou que a linha de montagem em sua fábrica de São Bernardo do Campo estava dando um importante passo no processo de produção de caminhões. A ação foi divulgada como o ingresso na chamada indústria 4.0, desde então os veículos de carga da marca passaram a ser montados por um sistema de produção conectado à Internet mais rápido e eficiente. .  

Em fevereiro desse ano, a inauguração da nova linha de cabines selou mais um avanço da montadora em direção à modernização de sua planta, com a operação da unidade de cabines também conectada, operando com robôs de última geração, profissionais utilizando óculos de realidade aumentada e exoesqueletos (equipamentos que forneceM força e resistência aos membros do corpo humano). 

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Com a aplicação de Internet, dados na nuvem e avançados sistemas de produção – elementos comuns à chamada indústria 4.0 -, a Mercedes-Benz está mostrando que ampliou ainda mais seu nível de tecnologia para fabricar caminhões. O moderno sistema inclui também o aprimoramento de áreas fora da linha de montagem diretamente ligadas à linha de montagem. 

Em outras palavras, indústria 4.0 é a quarta revolução industrial, na qual os processos produtivos se valem das últimas tecnologias para ganhar agilidade, escala de produção e maior qualidade ao produto final. Os caminhões, por exemplo, há anos incorporam tecnologias desta quarta fase do desenvolvimento da indústria, inclusive nos materiais, que também são frutos de pesquisas.

Quando o carreteiro usufrui dos recursos disponíveis nos caminhões, ou utiliza a Internet, smartphone etc, ele está lidando com tecnologias da quarta revolução industrial. Esses são poucos exemplos de avanços que transformaram e continuam transformando o mundo e consequentemente até a rotina de quem dirige caminhão e tudo mais.

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Robôs, inteligência artifical, Internet e exoesqueletos são elementos do moderno sistema de montagem de caminhões Mercedes-Benz

Conforme relatos históricos, nas três revoluções anteriores a indústria soube aproveitar o progresso de cada período para promover, sobretudo, o aumento de produção, melhoria dos produtos e substituição de mão de obra humana por máquinas, entre outras mudanças. Em 1780, a introdução da energia mecânica, motores a vapor e a mecanização da indústria têxtil, por exemplo, é tida como a primeira revolução industrial e marcou época. A chegada da eletricidade a partir de 1870, trouxe mais modernidade à indústria da época e culminou com a produção em massa, inclusive de automóveis, ficou na história como o  início da segunda revolução industrial.

Já a terceira teria começado em meados dos anos 1940, após o fim da Segunda Guerra Mundial, com a utilização de diferentes fontes de energia, como a nuclear, hidrelétrica, petróleo e eólica, entre outras. Porém, dependendo da fonte histórica consultada, o início foi a partir de 1969 com o advento da tecnologia de informatização, computadores pessoais, Internet que automatizaram tarefas mecânicas e repetitivas.

Já na atual fase quatro da industrialização, que se convencionou a chamar de indústria 4.0 – termo que se deriva de diferentes tecnologias dos estágios da evolução da indústria – tem marco inicial o ano 2000, que se caracteriza por avanços como como o surgimento da robótica, inteligência artificial etc, que possibilitam a fusão do mundo físico, digital e biológico. 

Isso inclui objetos físicos conectados à Internet executando determinada ação de forma coordenada (como veículos autônomos, por exemplo); impressão 3D para fabricar objetos; inteligência artificial (computação que procura simular a capacidade humana de raciocinar, tomar decisões e resolver problemas); biologia sintética (desenvolvimentos nas áreas de química, biologia, ciência da computação e engenharia, permitindo o projeto e construção de novas partes biológicas tais como enzimas, células etc) e Sistemas Ciber-Físicos que sintetizam a fusão entre o mundo físico e o digital, de modo que todos os objetos e processos de uma fábrica passam ter um similar digital com dados na nuvem.

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Inauguração da nova fábrica de cabines na unidade de São Bernardo Campo representou um segundo passo da empresa rumo à indústria 4.0

Nessa fase, os processos de produção estão cada vez mais dentro de um ambiente em que os dados armazenados possibilitam o monitoramento da qualidade e a detecção de possíveis falhas nos produtos. E não por acaso, os novos caminhões quebram menos e dificilmente apresentam problemas, porque o projeto é executado dentro de modernos processos que envolvem tecnologias e materiais disponíveis para se chegar ao produto final desejado. 

“Os passos dados pela Mercedes-Benz são os primeiros de muitos outros que ainda virão, tanto para empresa quanto para outros fabricantes do setor”, disse o vice-presidente de operações da companhia no Brasil, Carlos Santiago. Como exemplos, da primeira fase, inaugurada em 2018, Santiago destaca as apertadeiras eletrônicas programadas para medir o torque de parafusos de acordo o com o tipo de caminhão que está em produção; veículos guiados eletronicamente para alimentar a linha e sensores nas prateleiras que controlam a entrada e saída de peças, além de monitores de TV. 

“Todos esses elementos geram dados que são armazenados na nuvem, os quais permitem monitorar a qualidade de todos os produtos e detectar qualquer falha”, concluiu Santiago. O executivo resumiu que se trata de um moderno, integrado e inteligente sistema de produção que concentra inclusive a logística de peças num mesmo prédio.  Contou que houve também ganho acima de 15% no tempo de produção de um caminhão.

LINHA DE PRODUÇÃO

Quem não se moderniza perde terreno e pode desaparecer. Bastante citada nos dias atuais, essa frase não se aplica à indústria de caminhões instalada no Brasil. Os fabricantes do setor vivem em acirrada competição para mostrar ao cliente que seu produto é a melhor opção para o seu negócio, porque incorpora uma carga de investimentos para entregar o que ele precisa na sua operação. E justamente por isso, existe uma grande semelhança entre as linhas de produção com robôs computadorizados e sofisticados processos em todas as áreas das fábricas, de maneira que as diferenças, quando existem, dificilmente são percebidas, pois se trata de alta tecnologia.

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Fábrica da Volkswagen conta com avanços tecnológicos para manter a empresa dentro da tendência mundial da indústria automotiva

A fábrica da Volkswagen Caminhões e Ônibus, localizada em Resende/RJ, onde também são montados os pesados MAN, por exemplo, recebeu em 2017 investimento de R$ 190 milhões na preparação para produzir a nova linha Delivery. A movimentação foi definida pela empresa como um salto tecnológico nos processos dentro do conceito da indústria 4.0.

Na ocasião foi divulgado que entre os avançados equipamentos, 38 novos robôs passaram a conferir nível de automação de 60% na armação da cabine, 2.500 pontos de solda e 170 itens de medição, além de robôs que se deslocam de um ponto a outro abastecendo a linha de montagem. Pelo processo de produção, cada cabine recebe um chip para que os robôs identifiquem o modelo e ponto de solda. No final da linha de montagem, as apertadeiras e equipamentos de apoio à montagem recebem de forma virtual a mesma informação para que o torque e outras configurações sejam as definidas para o modelo.  

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Células de medição que escaneam as cabines é uma das tecnologias da fábrica da Scania que produz os caminhões da nova geração

Para abrigar os avanços tecnológicos, e manter a empresa dentro da tendência mundial da indústria automotiva, a montadora ampliou em cerca de cinco mil metros quadrados sua área construída, sendo que só o espaço para os robôs ganhou uma extensão de 30%. Também fizeram parte da modernização o equipamento de alinhamento da suspensão independente e um robô para colar para-brisas e vidro vigia.

A Scania, por sua vez, também seguindo os passos da indústria 4.0, inaugurou em 28 de agosto do ano passado a unidade de cabina para solda a laser, a primeira com essa tecnologia no Brasil, com investimento de 75 milhões (cerca de R$ 320 milhões). A unidade foi preparada para atender a nova geração de caminhões que começou a ser entregue aos clientes no início de 2019. Sua capacidade de produção é de 25 mil cabines por ano.

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Produção do novo Volvo FH, concentrou investimentos nas linhas de pintura e solda da fábrica de cabines em Curitiba

Ricardo Cruz, gerente executivo da fábrica de solda de cabines disse que a unidade passou a ser a mais moderna e automatizada da Scania na America Latina, um espelho da matriz na Suécia. “Com essa unidade, revolucionamos os processos de manufatura integrada, com controle de produção desde o pedido até a entrega do veículo ao cliente”, adicionou.

A solda a laser, feita por dois robôs, aumenta a qualidade de vedação e resistência estrutural da cabine, além de eliminar os riscos de infiltração. Outro ponto de destaque da nova fábrica é o uso de uma célula de medição que escaneia as cabines produzidas identificando qualquer variação nos padrões estabelecidos. Os robôs da célula fotografam a superfície das cabines e verificam se as medidas e dimensões estão idênticas ao modelo virtual.

E a Volvo investiu na modernização da linha de produção para começar a produzir a nova geração do caminhão FH, a partir de 2015. Na ocasião, o foco maior se concentrou na modernização das linhas de pintura e solda da fábrica de cabine. Junto com os novos caminhões a montadora trouxe maior grau de conectividade ao mercado brasileiro. Na ocasião, a empresa ressaltou o ganho de qualidade dos veículos da marca com os investimentos. Outra fabricante que investiu em recursos para produzir caminhões competitivos no Brasil é a DAF. A fábrica da montadora, instalada em Ponta Grossa/PR, foi inaugurada em 2013, e os seus processos produtivos estão de acordo com o sistema desenvolvido pelo Grupo norte-americano Paccar, para garantir qualidade aos produtos.