Diante da desvalorização do frete, da baixa movimentação de carga e do preço alto do diesel, entre outros desafios, o ano de 2017 exigiu persistência de muitos motoristas para continuar na profissão. Mesmo assim, ainda restou a expectativa de que 2018 possa ser menos difícil para quem vive de dirigir caminhão
Por Daniela Giopato
Os últimos dois anos não têm sido fáceis para quem vive do transporte rodoviário de carga. Fabricantes de caminhões, frotistas, e carreteiros tiveram de lidar com a alta do diesel, frete desvalorizado, baixa movimentação de carga e queda nas vendas. Porém, a partir do segundo semestre de 2017, a economia começou a dar pequenos sinais de recuperação trazendo de volta um pouco de otimismo e expectativas positivas para 2018.
A carta da Anfavea divulgada no início de dezembro mostrou resultados positivos do setor. Em novembro, por exemplo, foram licenciados 5.472 caminhões, volume 8,8% superior ao total de emplacamentos registrado no mês de outubro. Já em comparação com as 3.800 unidades de novembro de 2016, o crescimento foi ainda maior, 44%. E comparando os primeiros 11 meses de cada ano, a diferença caiu para apenas meio por cento.
No fechamento do primeiro semestre de 2017, a retração em relação ao ano passado era de 16,1%. Com base nessa sequência de resultados satisfatórios, executivos das principais fabricantes de caminhões do País anunciaram durante a Fenatran – um dos maiores eventos voltados para o transporte rodoviário de carga da América Latina – crescimento de 20% nas vendas para 2018.
No início de dezembro, as boas notícias sobre a recuperação do mercado pareciam não ter chegado ainda na estrada. Apesar de os motoristas dividirem opinião em relação a 2017, todos os entrevistados foram categóricos em dizer que não alimentam grandes expectativas de melhoras para 2018. Alguns pensam em abandonar a profissão, outros dizem que continuarão lutando. Tem ainda aqueles que, apesar de desanimados, colocam a paixão pelo caminhão acima de qualquer dificuldade.
“Não consigo pensar em largar a profissão. Está no sangue. Passou de pai para filho. Sei que as coisas não estão boas, mas não desanimo e vou continuar lutando e agradecendo a Deus”, afirmou Francisco Barros Araújo, 61 anos de idade e 43 de profissão, que viaja pelo Brasil com um caminhão câmara fria.
Para Araújo, 2017 não foi um ano tão ruim. Afirma ter trabalhado muito para compensar as eventuais baixas e aumentou o controle das despesas para atravessar os momentos mais complicados. Na sua opinião, algumas coisas podiam começar a mudar em 2018 para facilitar mais o dia a dia dos profissionais. Entre os principais itens estão o preço do diesel e a segurança na estrada. “Tenho alguns colegas que realmente estão em situação bastante difícil e pensando em deixar a profissão, infelizmente”, contou.
A expectativa para próximo ano é de trabalhar e tentar ficar mais próximo da família. “Por conta de toda a dificuldade que o País enfrenta, este ano acabei ficando mais tempo longe de casa. Espero que em 2018 eu consiga passar mais tempo em casa”, disse Barros.
Com 54 anos de idade e 34 de profissão, Luiz de Lucca, de Francisco Beltrão/PR, trabalha no transporte de móveis planejados e roda pelo Brasil inteiro. Ele conta que para quem atua como empregado, assim como ele, a situação em 2017 ficou um pouco mais tranquila. Mesmo assim, as viagens diminuíram. Em tempos melhores fazia entre cinco viagens por mês no trecho entre Paraná e São Paulo. Hoje foi reduzido para duas e no máximo três. “Mas, no caso dos autônomos, que têm de ir atrás do frete, as coisas estão bem mais difíceis”, destacou.
Ele reforça que a crise econômica pela qual o País atravessa reduziu as vendas e automaticamente o número de viagens. Porém, afirmou que não chegou a afetar seu ganho. “Já tive vontade de ser autônomo e cuidar do meu próprio negócio, mas penso em todas essas questões, tais como falta de carga e aumento do diesel e aí acabo desistindo”, afirmou. Além disso, Luiz de Lucca ressalta que viver na estrada está bem complicado, principalmente por conta do uso de drogas, cada dia mais evidente entre os motoristas. “A falta de respeito é grande. Esses motoristas comprometem a segurança de todos”, lamentou.
Luiz já deu entrada para se aposentar e entre os suas metas para os próximos anos está a compra de um caminhão, porém menor, e fazer pequenos fretes em sua cidade. “Largar a profissão totalmente é impossível, quero continuar trabalhando, porém em um ritmo mais sossegado, seguro e menos estressante”, confessou. Mesmo com todas essas previsões positivas dos empresários, ele acredita que ainda vai demorar um pouco para as mudanças chegarem na estrada.
O autônomo Nelson Batista, de Pará de Minas/MG, 53 anos de idade e 25 de profissão, trabalha com cargas fracionadas e se encontra bastante desanimado com a profissão. “2017 foi péssimo. Em época boa fazia seis viagens por mês, hoje no máximo três. Como consequência, meu faturamento também reduziu em 50%. O grande problema foi o aumento do diesel. A conta não fecha. Está difícil pagar as contas”, lamentou.
Para ele, essa onda de otimismo para o próximo ano ainda não deu sinais. “Não tenho expectativas. A minha vontade é vender o caminhão e recomeçar em outra área. O problema é que não acho comprador. Enquanto isso vamos seguindo em frente e mantendo a esperança”, afirmou.
Ao contrário do colega, João Alfredo Machado Teixeira, de Santo Ângelo/RS, 53 anos de idade e 23 de profissão, conta que 2017 foi um ano razoável. Ele atua com cargas de exportação e diz ter trabalhado bastante. Na sua opinião, um dos grandes problemas enfrentados por todos que vivem do transporte de carga é o aumento do diesel. “Mesmo sendo empregado e não arcando com essa despesa sentimos o reflexo. Somos mais cobrados a fazer média para que o consumo diminua”, destacou.
Para ele, o clima na estrada ainda é de pessimismo, principalmente para aqueles que arcam com todas as despesas da estrada. “Para nós, empregados, a crise chega um pouco mais leve”, reconheceu acrescentando que o custo de vida está muito alto e o que se ganha não acompanha os aumentos. Teixeira lembra que 2018 será um ano político, portanto, mais complicado. “Espero que o clima de otimismo chegue até a estrada e que as coisas comecem a melhorar para deixar a vida do carreteiro mais confortável”, concluiu.
Para Fernando Santor, Treze Tílias/SC, 27 anos de idade e seis de profissão, 2017 foi um ano pouco rentável. “Trabalhei a mesma coisa, mas os custos aumentaram e o faturamento final foi bem menor. Antes, sobrava mensalmente cerca de R$1.500 para guardar, hoje não consegui juntar nada. Trabalhei para pagar conta”, contabiliza.
Quando perguntado sobre as expectativas para 2018, Santor diz não estar tão otimista, pois lembra que afinal é apenas uma mudança de calendário. Mas como todo brasileiro, ele tem algumas metas e esperança de que as coisas progridam e a situação melhore. “Quero trocar de carro. Quanto à minha profissão, vou esperar um pouco mais, quem sabe a situação melhore, conforme andam dizendo por ai”, destacou.
O autônomo José Donizete Ferreira, 48 anos de idade e 25 de profissão, de Andradina/SP, trabalha no transporte de areia para obras. Para ele, 2017 foi um ano fraco, com redução das viagens pela metade. “Antes eu fazia 60 viagens e conseguia tirar 10 mil reais por mês. Hoje faço 30 e recebo no máximo R$ 6.000”, revela. Um dos principais fatores que prejudicaram o bom andamento dos negócios na profissão foi o aumento do preço do diesel e o frete baixo. “Hoje tem muito caminhão parado e quando aparece um frete ninguém quer saber se vale ou não vale a pena, apenas aceita”, explicou.
Mas, segundo ele, é importante manter o bom humor e a esperança para enfrentar todas as dificuldades. “Um dos meus desafios para 2018 é tentar trocar o meu caminhão fabricado em 1991 por outro 2010. Sei que não vai ser uma tarefa fácil, porque as condições são poucas e os custos cada vez maiores. Mas vou manter o meu otimismo”, brincou.
O colega de profissão, Antônio de Andrade de Souza, de Alagoinhas/BA, 53 anos de idade e 10 na atividade, também acredita que o bom humor seja um elemento essencial para encarar os problemas. Reforça que 2017 não foi um ano fácil. Disse que hoje recebe R$ 4.600 por mês e gasta R$ 2.680 com diesel. Lembra que quando começou a trabalhar na profissão recebia mais de R$ 7.000 e o gasto com combustível era mais equilibrado. “As coisas estão ruins, com valores do frete muito baixo e do diesel alto. Foi difícil fechar a conta. Mas, não adianta ficar se lamentando. O jeito é trabalhar”, conforma-se.
Souza conta que está tentando vender o caminhão e mudar de ramo mas reconhece que está difícil. “Primeiro quis trocar, mas não tinha condições. Agora já faz um bom tempo que tento vender e não aparece interessado. Enquanto isso vamos tocando e encarando os problemas de maneira leve”, ameniza. Sua expectativa para 2018 talvez seja a mesma de muitos brasileiros “ganhar na mega sena”, mas reforça que também quer bastante saúde para continuar trabalhando.
NA CRISE É IMPORTANTE ANALISAR O FRETE
O engenheiro Antônio Lauro Valdivia Neto, especialista em transporte e assessor da NTC & Logística, concorda que diante da crise estabelecida a pressão é grande para aceitar qualquer valor de frete, principalmente para os motoristas de caminhão que estão com dívidas e pressionados pelo vencimento das parcelas. “O frete vem caindo desde 2014. O pior é que o volume de carga transportada também vem diminuindo e a receita de quem transporta despencou nos últimos três anos”, explicou.
Porém, Valdivia diz ser importante sim analisar o frete, principalmente se o valor oferecido será suficiente para pagar todos os custos da viagem e se sobrará alguma coisa. E o frete analisado deve ser a soma recebida na ida e na volta. Deve-se anotar todos os recursos consumidos e lembrar que aquilo que deixou de ser anotado será coberto pelo lucro, caso ele tenha algum.Portanto deve-se controlar os custos com manutenção, pneus, despesas de viagem, combustível, taxas e impostos pagos para rodar com o veículo (Licenciamento, IPVA, seguro obrigatório, RNTRC, taxa de vistoria de tacógrafo, etc), seguro do caminhão, além de incluir os custos de depreciação do caminhão.