Por Nilza Vaz Guimarães

Do total de caminhões da frota brasileira, estimada em 1,5 milhão, mais de 270 mil veículos têm idade superior a 30 anos. A afirmação é do diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Bruno Batista, feita durante evento realizado no início de maio deste ano em Brasília, onde estiveram presentes líderes sindicais e empresários do setor de transporte rodoviário de cargas de todo o País. Dados da entidade indicam ainda que mais de 60% da frota de caminhões em circulação no Brasil tem idade superior a 20 anos. É sabido que a renovação da frota pode gerar, além de benefício ambiental, um aumento da produtividade e redução dos índices de acidentes nas estradas.

Batista apresentou sugestões para a criação de um plano de renovação de frota, que seria direcionado prioritariamente aos carreteiros autônomos, onde o incentivo à compra de veículos seria dado por meio de um bônus na troca de caminhões velhos em atividade nos últimos 12 meses por um veículo mais novo, com encargos menores e melhores condições de acesso ao financiamento. Para assegurar a desativação da frota antiga, informa Batista, o governo teria que organizar e monitorar centros de reciclagem que fariam o desmonte para aproveitamento da sucata, como aço, pneus etc, por siderúrgicas e outras indústrias.

Perto de se aposentar, o carreteiro José Antonio de Abreu já não pensa mais em comprar um caminhão novo para trabalhar
Perto de se aposentar, o carreteiro José Antonio de Abreu já não pensa mais em comprar um caminhão novo para trabalhar

O carreteiro José Antonio de Abreu, de 50 anos de idade e 27 de profissão, proprietário de um caminhão MB 1313, ano 1982, transporta mudanças e outras cargas de São Paulo para toda a região nordeste, sempre que pode viaja com a esposa e o neto, e mantém em dia as revisões do bruto. Já está quase se aposentando das estradas e diz que não sonha mais em ter um caminhão novo. “Impossível comprar um veículo OK, e para comprar um usado a gente não sabe como ele está”, comenta. Na sua opinião, hoje não existe frete bom que dê para entrar num financiamento e trocar o caminhão velho por um novo. De acordo com ele, vários companheiros seus de estrada compraram e estão perdendo tudo, porque não puderam pagar as prestações. Ele até pensa em vender seu caminhão e comprar outro menor, para rodar dentro de São Paulo, mas acredita que a maioria dos carreteiros que tem prestação de caminhão para pagar, trabalha dia e noite, usa arrebite e faz loucuras nas estradas.

Viajando desde menino com seu pai, o carreteiro Deusito Lucena Lima, cearense de 51 anos de idade, comprou seu primeiro caminhão em 2000, um modelo fabricado em 1981 e está até hoje em suas mãos. Ele também transporta mudanças, de Goiânia para o Nordeste, e adquiriu o veículo usado através de financiamento. Admite que na verdade gostaria de ter um modelo da mesma marca, porém mais novo, fabricado entre 1996 e 2000, mas afirma que ainda não chegou a hora. No momento Lima pensa em pedir um empréstimo para ampliar o baú de seu bruto para 8 metros, valor que poderá pagar em até 36 meses. Depois disso, pretende instalar um rastreador. “Mas para fazer isso terei de trabalhar mais. A vida do carreteiro está cada dia mais difícil, pois hoje até banho a gente paga. O cafezinho que era de graça, agora é pago. No Nordeste, somente 3% dos postos de combustível ao longo das estradas atendem o carreteiro”, constata. A dificuldade para renovar a frota se estende também para os empresários do setor de transporte. De acordo com o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Conteiners do Estado da Bahia – Setconteiners, Creso Correa de Amorim Filho, apesar do setor agrícola estar aquecido no mercado interno, existe uma soma de fatores para que o empresariado não renove a frota, como a falta de credibilidade na economia mundial e o mercado interno inconstante.

No ano 2000, Deusito Lucena Lima adquiriu seu primeiro caminhão, um modelo fabricado em 1981, e está com ele até hoje
No ano 2000, Deusito Lucena Lima adquiriu seu primeiro caminhão, um modelo fabricado em 1981, e está com ele até hoje

“Principalmente neste segmento que atuamos, no qual dependemos de muitas variáveis, como o clima, o dólar, a infraestrutura portuária e a inconstância nos valores dos fretes rodoviários”, afirma Amorim.

Proprietário da Creso Amorim Transportes e Serviços Ltda, empresa que está no mercado baiano há mais de 15 anos e opera com cargas conteinerizadas, refrigeradas, petroquímicas, além de frutas para todo o exterior, Amorim acredita que adquirir veículos usados não compensa pelo alto custo de manutenção, face à infraestrutura rodoviária no nordeste estar ainda bastante comprometida. A política da empresa é renovar a frota de cinco em cinco anos. “Inclusive renovamos recentemente e centralizamos a frota em apenas uma marca, a Iveco”. Para operar os 15 caminhões modelo Stralis da empresa, os motoristas foram treinados pela fábrica. A empresa também conta com 25 carreteiros autônomos e roda um total de 12 mil quilômetros por mês. “Os agregados rodam menos, apenas em distâncias mais curtas, ficando nossa frota para as viagens longas”, acrescenta. Para Benedito Teles Santos, sócio-gerente da Concórdia Transportes Rodoviários Ltda e vice-presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas do Estado da Bahia – Setceb, hoje, com a crise econômica mundial, os preços dos equipamentos baixaram, mas por outro lado, surgiu a falta de perspectiva de utilização dos mesmos, em função da baixa demanda que atinge o segmento de transporte. “Mesmo com a baixa do valor de aquisição dos equipamentos, não nos animamos para aproveitar este bom momento e investir na frota para comprar novos veículos, mas a elaboração de um plano de renovação de frota seria bem interessante.

Na hora da renovação, a empresa leva em consideração o custo de manutenção do equipamento, diz o empresário Marcus Vinicius de Azevedo
Na hora da renovação, a empresa leva em consideração o custo de manutenção do equipamento, diz o empresário Marcus Vinicius de Azevedo

Com frota própria de 280 equipamentos das marcas Iveco, Scania, Volvo, Kronorte, Facchine e Biselli, a Concórdia, localizada no município de Dias D’Ávila, conta com 125 motoristas em seu quadro de funcionários e apenas três carreteiros autônomos. A idade média atual dos cavalos mecânicos é de 2,8 anos e o critério de renovação é de no máximo cinco anos. De acordo com Teles, uma das facilidades para a renovação da frota é que “nossos equipamentos gozam de uma boa aceitação no mercado de usados, em função da boa manutenção que lhes é dispensada”, explica o empresário que só adquire caminhões através do Finame. A Concórdia está no mercado há 30 anos transportando granéis líquidos e conteiners.

O empresário Marcus Vinícius de Azevedo, sócio-gerente da KLZ Transportes Ltda, empresa especializada em transporte de toras de eucalipto, com matriz na cidade de Mucuri, sul da Bahia e filiais no Espírito Santo e Minas Gerais, diz que as maiores dificuldades para se adquirir um caminhão novo hoje em dia são, ainda, as taxas de financiamento muito altas e dificuldade na obtenção do mesmo, além de preços dos equipamentos elevados. “Não utilizamos o BNDES, e sim compramos nossa frota através de leasing bancário ou CDC”, esclarece Azevedo. Na opinião do empresário, os veículos velhos, poluidores e obsoletos, que povoam as estradas brasileiras colocando em risco quem por elas trafegam, serão apenas substituídos por novos, se houver uma maior flexibilidade dos órgãos financiadores quanto à documentação exigida, “que com certeza os proprietários desses equipamentos terão dificuldades em conseguir”, avalia Azevedo, que espera realmente que isso aconteça.

Devido a complexidade de sua operação, a KLZ, que está no mercado há 10 anos, renova sua frota a cada cinco anos e na hora da opção de compra leva em consideração o custo de manutenção do equipamento. “Se começa a ficar alto, decidimos logo pela substituição do caminhão, pois o tempo de parada na oficina, mais a falta de produção atrelado ao alto custo de manutenção, nos obriga a substituí-lo”. A KLZ também não compra caminhões usados, porque segundo o empresário, estes equipamentos não dão o retorno esperado. A empresa tem uma frota de 26 caminhões extrapesados modelos MB Axor 3344/2638 e Volvo FH 440, com idade média de três anos, e conta com 50 motoristas treinados, para percorrer 250 mil quilômetros por mês.