Por Larissa Andrade

Um dos grandes desafios das cidades portuárias é a poluição resultante não só dos navios e equipamentos de manejo de carga, mas também das embarcações de apoio, trens e caminhões. Por conta da diversidade de fontes dessa contaminação da água, do ar e do solo, que acaba prejudicando a saúdeda população local, portos de várias partes do mundo estão desenvolvendo estratégias para atacar as diferentes frentes do problema com o objetivo de proporcionar melhor qualidade de vida a todos.

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No caso dos caminhões, o principal enfoque está na renovação da frota, medida importante também para a saúde dos carreteiros. Por outro lado, quando o governo simplesmente impõe a obrigatoriedade de renovar a frota, os motoristas autônomos se deparam com o desafio de não ter dinheiro para adquirir um veículo novo e, ao mesmo tempo, ter de garantir o posto de trabalho.

O Porto de Los Angeles, na Califórnia (EUA), foi pioneiro em realizar diversas iniciativas voltadas à sustentabilidade visando justamente a melhoria da qualidade do ar, a qual era uma preocupação do governo local. Para se ter uma ideia, um estudo feito pela CARB, conhecida como “Agência do Ar Limpo” da Califórnia, mostrou que a população do Sul da Califórnia gastava entre US$ 100 milhões a US$ 590 milhões por ano para cuidar de problemas de saúde resultantes da poluição causada por caminhões. Pelas projeções, este número chegaria aos US$ 10,1 bilhões por ano em 2025 caso a situação continuasse a mesma.

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Incentivos financeiros concedidos pelo porto os transportadores a comprar ou fazer leasing de caminhões novos foi o pontapé inicial, disse Tim DeMoss

Diante desse cenário, o Porto de LA lançou em 2006 um plano de ação chamado “Ar limpo” e um dos projetos que fazem parte desse plano é o “Clean Truck”, ou “Caminhão Limpo”, que começou a vigorar em 2008. O objetivo era renovar a frota para diminuir a contaminação do ar, mas a inovação veio justamente pelo fato de o Porto apoiar financeiramente a aquisição de novos caminhões, especialmente para as pequenas empresas de transporte, conforme conta o diretor do Projeto, Tim DeMoss. “O Porto forneceu incentivos financeiros para ajudar as empresas de transporte a comprarem ou fazer leasing de caminhões novos. Esse foi o pontapé inicial do programa, e com isso garantimos um número suficiente de caminhões limpos disponíveis para atender os terminais”.

No ano em que o projeto teve início, em 2008, os caminhões com mais de 19 anos de uso foram proibidos de operar no porto. Essa ação resultou na retirada de ao menos 1.500 veículos de circulação. No mesmo ano, o porto de LA ofereceu US$ 44 milhões em pagamentos para que os transportadores (autônomos e empresas) pudessem adquirir 2.200 caminhões “limpos” e, meses mais tarde, 500 caminhões a gás natural foram adquiridos por meio de um subsídio de US$ 12,5 milhões.

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Mas o dinheiro veio não só do porto, mas também de agências locais, estaduais e federais. E houve quem comprasse caminhões novos com investimento próprio, pois a renovação não foi apenas incentivada, como também obrigatória. “As companhias preferem investir em caminhões mais novos e mais caros do que pagar a taxa “Caminhão Limpo”, que é de US$ 70 por cada container de 1,2 metro transportado”, diz Tim DeMoss. No caso das empresas de pequeno porte, há um programa de subvenção – voltado especificamente para elas – que já investiu US$ 1 milhão na compra de 25 caminhões.

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Programa para renovação da frota recebeu apoio de transportadores e população e no primeiro ano retirou de circulação mais de 1.500 caminhões velhos

Mas o gerente do Programa também ressalta que o Porto de Los Angeles atuou também na conscientização sobre a importância dos investimentos na nova frota. “O Porto foi até os motoristas e empresas de transporte em reuniões e os informou sobre a importância de reduzir riscos potenciais à saúde das comunidades locais e dos trabalhadores por meio da implementação de caminhões mais limpos”, ressaltou o diretor do Programa.

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Trabalho contou com reuniões para conscientizar motoristas e transportadores da importância dos caminhões novos para a saúde dos motoristas e as comunidades

Atualmente, 100% da frota de caminhões em operação no porto atende às exigências do padrão estabelecido pelo governo norte-americano em 2007, enquanto 20% já atende às exigências do padrão estabelecido em 2010, que é ainda mais restritivo que o Euro VI. Cerca de 8% dos deslocamentos no Porto são feitos em caminhões movidos a gás natural. Atualmente já são cerca de 900 caminhões, usados principalmente para trajetos de curta e média distância.

Desafios do setor

A frota de caminhões não está sucateada apenas no Brasil. Nos Estados Unidos, o Porto de Los Angeles é um exemplo a ser seguido pelos outros, onde a idade avançada da frota preocupa as comunidades que estão ao redor desses portos por conta da poluição. Para reverter essa situação foi criada a “Coalizão por Portos Limpos e Seguros”, que atua em diversos portos daquele país. A especialista Barbara Maynard, responsável pela comunicação da Coalizão, explica porque a frota é tão velha em alguns deles. “Em 1980, o governo norte-americano desregulamentou a indústria de transporte em caminhões e, desde então, um dos obstáculos para os carreteiros era o esquema ilegal que algumas transportadoras usavam de ‘desclassificar’ seus motoristas fazendo com que eles firmassem acordos como contratante independente, quando na verdade eles eram tratados e controlados pelas empresas como se fossem funcionários. A consequência disso é que essas empresas faziam com que os motoristas pagassem todas as despesas relacionadas à operação e manutenção da frota que transportava carga dentro e fora dos terminais portuários. Como resultado, a frota de caminhões era muito velha e emitia muitos poluentes”.

Barbara Maynard conta que os motoristas são parte central da Coalizão e tem voz efetiva no debate sobre como diminuir a poluição causada pelos caminhões, pois se trata não só de uma preocupação com o meio ambiente como também com a qualidade de vida desses trabalhadores. Embora em Los Angeles o programa Caminhão Limpo venha dando resultados, em outras regiões há ainda muitos obstáculos. “Houve alguns programas de subsídios em outros portos, mas eles fracassaram em alcançar resultados notáveis como aconteceu em Los Angeles, porque eles são, em grande parte, programas voluntários”. Ou seja, muitos profissionais e transportadoras preferiam não investir porque não havia risco de multas”.

Para Barbara, o incentivo financeiro para a compra de novos caminhões é importante, mas não representa a única causa do sucesso do Programa Caminhão Limpo. “Os subsídios dados pelo Porto de Los Angeles eram apenas uma parte do Programa. Os componentes chave que resultaram na renovação da frota que atende o porto – em basicamente três anos – incluiu uma proibição progressiva de caminhões mais velhos e um programa de concessão obrigatório que exige que cada companhia atenda a padrões financeiros, de segurança e de manutenção”.

Agora, as metas da Coalizão são “melhorar os salários e as condições de trabalho dos motoristas, ajudando-os a se organizar para que possam ter os seus direitos respeitados e negociar um bom contrato que os permita sustentar suas famílias”, conforme conta Barbara. (LA)

Porto de santos: primeiros passos

Os carreteiros que atuam no Porto de Santos (SP), o maior do País, já são o alvo de um projeto do governo do Estado de São Paulo chamado “Desenvolve SP”, que visa incentivar o crescimento de pequenas e médias empresas por meio de taxas de juros reduzidas e longo prazo. No caso dos carreteiros do porto, o programa atua no financiamento de caminhões com juros zero e prazo de pagamento do financiamento em até 96 meses, sem entrada e com carência de até seis meses. Ainda em sua fase-piloto, o programa permite atualmente apenas a participação de autônomos e pessoas jurídicas enquadradas com empresários individuais que prestem serviços no porto e que tenham caminhões com mais de 30 anos de idade. Além disso, é preciso morar nas cidades portuárias da Baixada Santista. Apesar das condições restritivas, o Governo do Estado de SP informa que o projeto, em um ano de atuação, já entregou 42 caminhões e outros 10 estão em fase final de análise. Essa é apenas a ponta do iceberg, já que a frota que circula no porto é de cerca de seis mil caminhões. (LA)