Havia tempo que Romualdo sonhava em passar o Natal ao lado da família. Todos os anos, quando chegava o mês de outubro ele já começava a planejar sua parada de final de ano, mas sempre acontecia de aparecer uma carga urgente por um bom preço ou um problema com quebra do caminhão e ele precisar trabalhar para compensar o prejuízo ou outra coisa qualquer. O fato é que ele acabava sempre na estrada e sua família na casa de parentes, embora sua esposa Rute fosse bastante compreensiva neste aspecto.
Quando entrou o mês outubro de 1999, Romualdo pensou:
— Desta vez eu passo o Natal e ano novo com minha família, afinal vamos entrar na era do ano 2000 e acho importante estar junto aos meus.
Naquele mês e nos outros seguintes, suas viagens eram todas planejadas. Chegou a recusar frete para certos lugares com medo de acontecer alguma coisa errada, como quebrar o caminhão, ser assaltado ou até mesmo ficar doente. Enfim, estava decidido a ficar com a família na sua casa em Santa Catarina.
Na segunda-feira do dia 20 de dezembro de 1999, Romualdo aguardava por uma carga em Belém/PA, quando recebeu a notícia pelo telefone celular de que seu pai não estava bem de saúde. Já velhinho e sem saúde, o homem encontrava-se na UTI de um hospital no Maranhão, onde vivia.
O jeito foi dispensar o carregamento, cujo destino era São Paulo, e seguir para o Estado do Maranhão. Por algumas horas chegou a se esquecer do Natal com a esposa e os filhos. Quando chegou ao destino só houve tempo para fazer os preparativos para o sepultamento de seu pai e, em seguida, pegar a estrada para seu lar, em São Paulo.
Romualdo conhecia bem o trecho, mas tinha menos de quatro dias para chegar em sua casa. A esposa já tinha dito a ele para ter paciência e não se arriscar a ficar muitas horas ao volante e nem abusar da velocidade. Era completamente compreensível se ele chegasse após a noite de Natal.
Depois de rodar quase dois mil quilômetros e cansado, Romualdo parou em um posto para ir ao banheiro, abastecer, comer alguma coisa e jogar uma água no rosto. Precisava se refazer para continuar a viagem. Eram aproximadamente 17 horas e a temperatura estava ainda bastante alta naquela região. Quando retornava para seu caminhão foi abordado por uma mulher grávida que lhe pediu carona.
Por ser contra dar carona para desconhecidos, de qualquer espécie, Romualdo explicou com jeito que não gostaria de levá-la pois estava com pressa e ela poderia precisar de cuidados. Enquanto conversava com a mulher não deixou de notar como ela era calma, tinha um olhar suave e transmitia confiança. Talvez por isso ele tenha aceitado levá-la.
Três horas de estrada mais tarde ela lhe disse que estava passando mal e precisava parar.
De repente veio o susto maior. A cabine escura do caminhão ficou iluminada por um brilho que saia do corpo da mulher. Ainda esfregava os olhos, para recuperar a visão ofuscada pela luz, quando ouviu o choro. Aos poucos a luz foi enfraquecendo e ele pode ver mãe e filho por inteiro. Agora era a criança que emanava um brilho intenso e naquela situação de um parto na cabine do caminhão, no meio do nada, longe de tudo, Romualdo falava o tempo todo com ele mesmo para não perder o controle da situação.
Ainda em luta consigo mesmo para se manter calmo, enrolou a criança em um coberto que carregava no caminhão e procurou seguir em frente até encontrar ajuda. A estrada estava escura e deserta. Logo avistou algumas luzes e um pequeno conjunto de casas na beira da estrada. Entre elas, uma maior se destacou, por ser mais iluminada e com a indicação de ser um hospital. Romualdo quase não acreditou quando parou o caminhão em frente da entrada principal e viu que logo apareceram várias pessoas vestidas de branco e levaram mãe e filho para dentro.
Romualdo nem chegou a descer do caminhão e seguiu viagem. Seu caminhão parecia outro, estava agradável e parecia mais fácil de dirigir. Ia dar tempo para chegar em sua casa antes do Natal. Um mês depois, quando retornava de uma viagem de Belém para São Paulo, ao passar pelo posto de serviço, ele lembrou da mulher e seu filho. Decidiu procurar o hospital para saber que fim tinha levado aquela mãe, que parecia ter agora apenas seu filho como companhia no mundo.
Rodou horas e horas até se convencer de que não havia nem vilarejo nem hospital na beira daquela estrada. Preferiu acreditar ter vivido um milagre de Natal, pois tinha uma certeza: se tivesse recusado a dar carona para aquela mulher, jamais teria chegado em sua casa a tempo de fazer a ceia de Natal junto com sua mulher e filhos.