Por Evilazio de Oliveira

A espera para a liberação de cargas na estação aduaneira de Uruguaiana/RS, na fronteira com a Argentina, faz com que os carreteiros do transporte internacional permaneçam atentos, sempre preocupados com a ação de criminosos que agem livremente nas redondezas. As investidas são rápidas contra as cabines dos caminhões, quando levam o que podem como roupas, documentos, rádios e – preferencialmente – os tacógrafos. O pior é quando os ataques são feitos diretamente contra os motoristas, sob a ameaça de armas de fogo.

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Alexandre Pelissalt mantém o caminhão fechado e procura ficar sempre por perto, de olho no veículo

A administração da Eadi (Estação Aduaneira do Interior) – tido como o maior porto seco rodoviário da América Latina – se preocupa com a liberação rápida dos caminhões, evitando filas nas vias de acesso e ampliando os pátios de estacionamento interno. Mas, as filas são inevitáveis pelos mais variados motivos. E quando acontece do carreteiro ficar horas – ou mesmo dias – esperando pela legalização das cargas transportadas, o perigo é constante. A estação aduaneira está localizada ao lado de uma vila clandestina, freqüentada por prostitutas e desocupados que costumam fazer pontos em bares e inferninhos na região. Por mais cuidado que tenha, o motorista sempre estará sujeito a pequenos furtos, desde o arrombamento da caixa de alimentos, de mercadorias transportadas ou acessórios.

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Outro ponto crítico para os carreteiros é quando chegam ao Brasil. Depois de cruzarem a ponte internacional, precisam da liberação das cargas pela aduana brasileira. No local não existem vilas, nem bares e nem inferninhos. É um lugar ermo e solitário, sem policiamento, muito perigoso e com assaltos constantes. O pessoal do trecho fica atento, nervoso, preocupado e sem tempo nem mesmo para ir ao banheiro ou fazer um lanche, reclama Alexandre Pelissalt, 34 anos, 16 de profissão. Ele dirige um Scania 124 para a Transportadora Schio. Conta que, graças a Deus, nunca foi assaltado. Toma muito cuidado, mantém o caminhão fechado e procura ficar sempre por perto, observando.

Apesar de toda a atenção dos carreteiros, eles sempre se constituem em alvo fácil para os criminosos. Muitos, nem mesmo procuram a polícia quando são vítimas de roubos, a não ser em casos mais graves em que precisem comprovar a ocorrência para o patrão ou para o seguro.

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Na opinião de José Benedito deveria existir um estacionamento pago nas redondezas, com infra-estrutura e segurança

Para o carreteiro José Benedito Félix, 41 anos, 21 de volante, e com o dissabor de ter sido roubado por duas vezes, em São Paulo, o cuidado com o caminhão é redobrado. Garante que sempre fica por perto, vigiando, e quando precisa sair para um lugar mais longe pede para um colega ficar cuidando. Félix nunca foi assaltado ou roubado em Uruguaiana, mas garante que sabe de muitas histórias de roubo de tacógrafos, parte das cargas e até mantimentos da caixa que serve de cozinha. Segundo ele, deveria ter um estacionamento pago nas redondezas, com infra-estrutura e segurança. Afirma que a maioria do pessoal do trecho pagaria sem reclamar.

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Jorge Vargas já teve prejuízo com a ação de ladrões, que levaram o rádio e documentos da cabina do seu caminhão

Jorge Vargas Martins, 34 anos, 10 de volante, é outro carreteiro que teve prejuízo com a ação de ladrões, eles levaram rádio e documentos da cabina do seu caminhão. Também sabe de vários colegas que se descuidaram e tiveram prejuízos com pequenos furtos, até mesmo de comida ou de sinaleiras das carretas, coisas pequenas, mas que incomodam, diz. Agora não sai de perto do bruto ou então se alterna com outros colegas para ficarem vigiando enquanto algum deles precisar se afastar por mais tempo.

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Como prevenção, Siegfried Bar estaciona em lugares seguros, tranca bem as portas e não esquece de acionar o alarme

Embora nunca tenha sido assaltado por ladrões, o motorista Siegfried Bar, 52 anos, 20 de estrada, diz que está sempre prevenido, estacionando em lugares seguros, tranca bem as portas e não esquece do alarme. Ele sabe que as estradas são perigosas, os postos de combustíveis são visados pelos ladrões e nas filas de espera para a liberação da documentação, em Uruguaiana, não dá pra bobear. “Cada um cuida de si e do companheiro, afinal todos correm os mesmos riscos”, afirma.

A situação do alto índice de assaltos e pequenos furtos na periferia do porto seco, segundo a delegada Betina Martins Caumo, 25 anos, responsável pela 2ª DP e onde funciona o Plantão Policial, reflete os graves problemas sociais do município: a falta de empregos e de perspectivas da população, principalmente entre os jovens. E nas proximidades do porto seco a atuação policial precisaria ser bem mais intensa, porém sempre esbarra na ausência de efetivo.

Naquele local os problemas são grandes, envolvendo prostituição infantil, assaltos, roubos e drogas. A presença constante dos carreteiros com caminhões potentes, equipados com rádios, rádios transceptores, tacógrafos e supostamente de motoristas com dinheiro para as despesas de uma viagem longa, se constituem num grande atrativo para os criminosos.

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Para a delegada Betina Martins, o alto índice de assaltos é reflexo dos graves problemas sociais do município, como a falta de emprego da população

A delegada Betina Caumo – que está em Uruguaiana desde outubro – conta que os ladrões roubam de tudo: arame das cercas e até os moirões, hidrômetros das casas, bujões de gás, bicicletas, tudo. E nas filas das carretas, também levam o que estiver mais disponível, desde panelas, comida, até acessórios dos caminhões. Mas a grande preferência continua sendo por tacógrafos, o que faz imaginar uma quadrilha especializada, com um esquema de receptação garantido para esse tipo de equipamento. “Os policiais investigam nesse sentido, mas sem grande sucesso. Falta gente”, explica.

E é justamente pela falta de efetivo que a delegada Betina Caumo não acredita na possibilidade de instalação de uma delegacia – ou de um posto policial – na área do porto seco, conforme defendem líderes comunitários, policiais e, sobretudo dos carreteiros, que precisam passar pelo local em suas viagens para o exterior. A administração da Eadi já teria até oferecido as instalações físicas para a Delegacia que, além de dar segurança aos motoristas, também atenderia as eventuais ocorrências na vila clandestina. Um sonho difícil de ser realizado, afirma a delegada. “Seria muito bom, mas também muito difícil”, avalia.