Por Alessandra Sales

Você que roda pelas rodovias já deve ter percebido que a presença de mulheres no volante de carretas ou caminhões é cada vez mais frequente. O fato é que, há muito tempo, deixou de ser novidade ver uma mulher enfrentando a estrada e batendo marchas. Diferente do que ainda pensa muita gente por aí, em relação ao “sexo frágil”, elas têm demonstrado muita garra e capacidade para desempenhar, com eficiência, a função ocupada quase que totalmente por homens, sem esquecer o lado dona de casa e, alguns casos, de mãe.

Com mais de 10 anos na profissão, Ivana do Carmo tem de dividir o tempo entre trabalho de carreteira e os dois filhos
Com mais de 10 anos na profissão, Ivana do Carmo tem de dividir o tempo entre trabalho de carreteira e os dois filhos

É o exemplo da curitibana Ivana do Carmo Pereira, 38 anos de idade e mais de 10 na cabine de caminhão. Divorciada, ela tem dois filhos e atualmente transporta produtos inflamáveis. Está na profissão por ter seguido os passos da família, que sempre gostou muito das estradas. Lembra que já chegou a permanecer até oito dias fora de casa, quando esteve trabalhando em Belém do Pará/PA. Entre os inconvenientes da profissão, Ivana cita o desconforto da cabine do caminhão, principalmente para descansar, além de incômodos como prostitutas que batem à noite na porta do veículo. “Penso que a profissão poderia melhorar muito se o carreteiro pudesse ganhar mais, afinal, é ele que está sempre enfrentando os perigos na estrada e sabe que em uma viagem tudo pode acontecer”, conclui.

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Marcele Brambilla, 32 anos de idade e cinco de profissão, de Campo Mourão/PR, transporta peças automotivas de Curitiba/PR a Indaiatuba/SP. Sua rotina se resume a um dia no volante e outro em casa, mesmo assim diz gostar do trabalho nas estradas. De acordo com ela, hoje a profissão está boa em vista do que era antes, mas ainda há muita coisa para ser feita, e o seu caso, em particular, acredita que ficará ainda melhor quando tiver seu próprio caminhão. Ao contrário de Marcele, a situação de Tânia Maria Huçulak é bem diferente. Natural de Curitiba/PR, 32 anos de idade e cinco de estrada, na ocasião em que foi entrevista ela se encontrava desempregada. Quando em atividade, transportava peças automotivas no trajeto entre Curitiba e Joinville. Explica que o motivo de viagens curtas se deve à sua filha de 14 anos, pois vive separada do marido. Evita ausentar-se de sua casa e quando isso acontece é pelo período de, no máximo, dois dias.

Afastada da estrada, Tânia Maria tem uma filha menor de idade e por isso precisa conseguir um emprego em que as viagens sejam curtas
Afastada da estrada, Tânia Maria tem uma filha menor de idade e por isso precisa conseguir um emprego em que as viagens sejam curtas

Lembra que na estrada sempre precisou ter “jogo de cintura” para lidar com homens, pois como disse existem aqueles respeitam e outros que não hesitam em fazer piadas. Para ela, ser carreteira não é fácil, mas exceto o trabalho braçal, qualquer mulher pode fazer. Outro ponto destacado por Tânia é o preconceito, que acontece até mesmo em uma simples manobra com o caminhão. “Quantas vezes eu tive de enfrentar brincadeiras na hora de estacionar o veículo”, recorda. Destaca também a dificuldade que enfrenta na hora de arrumar emprego quando diz que tem uma filha para cuidar. “Preciso trabalhar em uma empresa onde eu possa fazer viagens curtas, para não me afastar de minha filha”, finaliza.

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Assaltos, condições ruins das estradas, alto preço do pedágio e do diesel são problemas comuns da profissão lembrados por Patrícia Concheski

Patrícia Concheski, 37 anos de idade e 14 de profissão, vive uma história parecida por ter um filho de 18 anos, criado na cabine do caminhão. Residente de Paranaguá/PR, ela é autônoma e trabalha com o marido no transporte de areia de Araucaia/PR para Paranaguá/PR. O casal tem dois caminhões (Volkswagen e um Chevrolet), que de acordo com ela estão em péssimas condições. O marido opta por viagens mais longas, por serem mais compensadoras, enquanto ela prefere as mais curtas, para não se afastar muito do filho. Patrícia aponta problemas como as condições precárias das estradas, pedágios e diesel caros, mas garante não sofrer com o preconceito na profissão.

A falta de banheiros adequados e comida ruim nas estradas fazem parte das observações de Rosângela da Silva em relação à profissão
A falta de banheiros adequados e comida ruim nas estradas fazem parte das observações de Rosângela da Silva em relação à profissão

Com 30 anos de idade e mãe de duas meninas, Rosângela da Silva Santos, de Curitiba/PR, está a cinco anos na profissão e atualmente transporta carros em uma carreta cegonheira, no trecho entre Curitiba e São Paulo. Diz saber lidar com as dificuldades encontradas na estrada e destaca a falta de estrutura nos postos de serviço, como os banheiros, pois em muitos casos só podem ser usados por motoristas homens e que abastecem no local. Ela reclama também da comida ruim e das estradas esburacadas, apesar de achar que hoje em dia existem mais recursos para o carreteiro e também mais respeito com as mulheres que se aventuraram a serem carreteiras “Hoje estou no céu, porque já reconhecem mais nossa profissão”, disse, ao afirmar que “a mulherada” é bem aceita na profissão. Nascida em uma família carreteira, Maria Goretti Ichel, 42 anos de idade, casada, e mãe de três filhos, está há 12 na profissão e transporta todo o tipo de carga que aparecer na rota entre Curitiba/PR e o Interior de São Paulo. Diz que chega a permanecer três dias fora de casa quando viaja. Em relação às condições das estradas, Goretti cita que algumas têm mostrado melhoria, como é o caso da Régis Bittencourt. Quanto à profissão, expressa que é bem recebida nos lugares onde para e não vê diferença entre o homem e a mulher no volante do caminhão. “Só peço mais união entre os colegas de estrada”, conclui.

Maria Goretti diz não ter problemas e acredita que não exista diferença entre homens e mulheres na direção do caminhão
Maria Goretti diz não ter problemas e acredita que não exista diferença entre homens e mulheres na direção do caminhão

A gaúcha Iracema Celestina Casagrande, de Palmeiras das Missões/RS, faz parte de uma família de agricultores, e já dirigia caminhão desde os 18 anos. Agora, aos 60 anos de idade, casada e mãe de um filho, tem dois caminhões que transportam máquinas agrícolas de Curitiba para Mato Grosso. Ela comenta que as condições para se trabalhar na estrada ainda são ruins e para ilustrar lembra de uma vez que quis usar o banheiro em um posto e teve de pedir ajuda para seu marido vigiar a porta. “Apesar disso, tenho opinião de que os postos melhoraram em vista do que era antes”, disse.

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Honestidade e evitar o uso de drogas e tudo que possa provocar influência negativa no trabalho é o conselho da veterana Iracema Celestina para quem está começando

Sobre seu trabalho, ainda mais por ser uma mulher que está no comando do caminhão, Iracema diz que os homens são machistas e não admitem, mas garante que não há diferença no transporte de carga. Por fim, deixa um recado para aqueles que estão começando na profissão, para que trabalhem honestamente, evitem roubos, drogas e tudo o que possa ter alguma influência negativa no trabalho. “Eu venci trabalhando corretamente, e acredito que este seja o caminho”, acentua.

Embora cada carreteira tenha sua própria história de vida na estrada, elas conquistaram algo em comum com o fato de terem sido escolhidas para participarem da campanha da Tortuga Câmaras de Ar, na qual reuniu 12 profissionais para contarem suas histórias, além de figurarem em um calendário de 2009 distribuído pela empresa. Outras carreteiras que também fizeram parte do trabalho não estão nesta matéria.