Por Daniela Giopato

Se manter na estrada não é para qualquer aventureiro, afinal, saber dirigir e conhecer caminhões e rodovias não são mais o suficiente para se ter bons resultados na profissão. O bom carreteiro tem que saber administrar as despesas e tornar seu negócio rentável. Os gastos, como afirma a grande maioria, estão cada vez mais altos e o valor do frete não acompanha. Diesel, pedágio, manutenção do caminhão são os que mais pesam no orçamento, mas não os únicos vilões que reduzem o lucro dos motoristas. Os custos pessoais também podem se tornar um peso no orçamento final e a alimentação é um bom exemplo que pode consumir até R$ 900,00 do valor total recebido pela viagem, de um carreteiro que passa um mês longe de casa.

Para economizar um pouco, Mariangelo Eckhardt, Lajeado/RS, quatro anos de estrada, na rota Rio Grande do Sul – São Paulo, faz apenas uma refeição no restaurante. As demais são realizadas no caminhão. “Fico cinco dias longe de casa e não dá para se dar ao luxo de almoçar e jantar no restaurante, o que custaria cerca de R$ 22,00 por dia. Parece nada, mas no final do mês o valor pesa muito”. Mariangelo explica que por ser empregado tem uma vantagem, a empresa mantém convênio com alguns postos e assim o pernoite e o banho são gratuitos. “É um absurdo o que alguns lugares fazem com os carreteiros. Cobram entre R$ 2,00 e R$ 3,00 por um banho e têm alguns que nem pagando te deixam usar o banheiro se não abastecer”.

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Mariangelo Eckhardt conta que faz uma refeição no restaurante e as demais no caminhão para não pesar no orçamento

Jéferson Alexandre da Cruz, Lageado/RS, seis anos de estrada, faz a rota Sul -São Paulo-Recife e chega a permanecer um mês longe de casa. Trabalha como empregado e mesmo recebendo diária afirma que se vira como pode para tentar economizar e sobrar mais no final do mês. Segundo ele, as refeições feitas em restaurante hoje são muito caras. “É só fazer a conta, cada refeição custa cerca de R$ 10,00, se eu almoçar e jantar já são R$ 20,00, comendo fora 30 dias gasto R$ 600,00. Cozinhando no caminhão gasto metade e ainda tomo café da manhã”, diz. Alimentos como queijo, salame, arroz, feijão e enlatados, sempre estão na caixa da cozinha. Carnes e frutas Jéferson compra nos mercados próximos ao posto onde para, afinal não tem como conservá-los.

Para driblar os gastos com pernoite e banhos que alguns postos cobram, Jéferson evita estabelecimentos que não conhece e procura sempre os mesmos pontos de parada. “Já pensou pagar R$ 5,00 por um banho toda noite? Ou mesmo para poder estacionar o caminhão. Se fosse arcar com todas essas despesas não sobraria nada no final do mês”.

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Por conta da correria, o argentino Juan Baldi muitas vezes opta pelas refeições em restaurante mesmo sabendo que são mais caras

Apesar destes custos pesarem no orçamento, ele considera correto os postos cobrarem, afinal alguns motoristas vandalizam os banheiros. “Não é agradável entrar em um banheiro onde não dá pra sentar no vaso, ou usar um chuveiro todo quebrado. Da mesma forma que queremos economizar, o posto também tem os seus meios. Alguns vendem fichas para colocar no chuveiro e o banho dura seis minutos.”

O argentino Juan Baldi, faz a rota Argentina-São Paulo, transporta cargas congeladas e também fica mais de um mês longe de casa. Ele explica que com a correria de entregar as cargas muitas vezes opta pelas refeições em restaurante. Mas percebeu de uns tempos para cá que o preço da alimentação aumentou um pouco. “Gasto R$ 30,00 em média por dia, o que no final do mês dá R$ 900,00 a menos no meu orçamento. Às vezes consigo preparar alguma coisa no caminhão e economizo um pouco”.

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Na opinião de Jéferson Alexandre da Cruz, o preço das refeições nos restaurantes está muito alto por isso opta em cozinhar no caminhão

Juan faz questão de ressaltar que sempre encontra bom atendimento nos postos que costuma parar, apesar de alguns cobrarem até pelo banho. “Geralmente não pago, pois abasteço e o banho sai de graça. Quando pago fica entre R$ 2,00 a 5,00 dependendo da região”. Juan lembra que em seu país esses custos saem um pouco mais em conta já que a moeda Argentina corresponde a 40% do Real.

Valério Harter, Pelotas/RS, 34 anos de estrada, fica entre 5 e 6 dias fora de casa e nesse período opta por uma comida fresquinha, feita no caminhão. “Com pouco mais de R$ 8,00 eu compro mistura, fruta, um pãozinho e tenho a garantia de uma alimentação saudável, do jeito que eu gosto”. Valério lembra que nem sempre foi assim. Quando começou na profissão, as refeições eram feitas em restaurante, mas como ele mesmo diz, os tempos eram outros, o preço era mais em conta e não pesava muito no orçamento. “Sou autônomo e consigo tirar R$ 1.800,00 líquidos, se eu comer todos os dias em restaurante vou ter uma despesa de R$ 150,00 então prefiro economizar. Além disso, não me adapto ao tempero, sou mais a minha comidinha, que sei que é feita com higiene. Melhor ainda se for preparada pela esposa”, comenta.

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No início da profissão e sem ajuda de custo para alimentação, Alexsandro Hunge se alimentava de sanduíches para economizar

Outra diferença que o experiente carreteiro observa é que até três anos atrás os postos não cobravam pelos banhos e hoje é comum ter que desembolsar R$ 2,00 ou R$ 3,00 para utilizar o banheiro ou ter que abastecer para garantir acesso livre. “Sinceramente não critico a atitude dos postos. Infelizmente alguns motoristas fazem muita bagunça, quebram ou levam os chuveiros, além de não terem higiene alguma. O perfil de quem faz isso com certeza é refletido na estrada, é um profissional perigoso e que não dirige com cuidado. Por essas atitudes os outros têm que pagar”, opina.

Há apenas um ano e meio de profissão, Valdo da Costa, de Carazinho/RS , já sabe o peso dos custos no orçamento final. Na rota para a Argentina, o carreteiro fica mais de um mês longe de casa e se vira como pode para conseguir reduzir as despesas. “Nem todas as refeições consigo fazer no caminhão, pois o tempo é curto. Então o jeito é dividir. Geralmente na hora do almoço como fora e as outras refeições procuro fazer no caminhão. Nesse caso é só comprar carne para complementar”.

Valdo faz as contas e diz que se comesse diariamente em restaurantes teria R$ 500,00 a menos no salário. Controlando um pouco, reduz quase pela metade esta despesa. Para evitar gastos com banho e estacionamento, Valdo procura ficar sempre em postos onde já é conhecido. “Já pensou ter que arcar com R$ 2,00 ou R$ 3,00 diariamente? Com esse valor eu poderia fazer uma compra”.

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Valdo da Costa e Vilmar dos Santos revezam entre comer no restaurante e no caminhão, para reduzir as despesas

Com mais de 20 anos na estrada, Vilmar de Matos acompanha Valdo nessas viagens iniciais. É norma da empresa. Ele lembra que no início da profissão alguns postos davam vale almoço e banho quando o carreteiro abastecia. Hoje, além de não existir mais essa cortesia tudo é cobrado, inclusive o banheiro. “Sei que os tempos mudaram e que um grupo de carreteiros que destrói chuveiros e deixam os banheiros sem nenhuma higiene contribuíram para o que passamos hoje. Mas, cobrar R$ 5,00 por um banho é muito. Ou até nem deixar usar o banheiro por não ter abastecido? Todo mundo precisa de um banho para ter uma boa noite de sono.”

Alexsandro Hunger, Santa Cruz do Sul/RS, há cinco anos na estrada, conta que durante algum tempo comeu muito sanduíche para poder economizar e ganhar tempo nas entregas. “Antes não tinha ajuda de custo para alimentação, nem condições e nem tempo de ficar comendo todo dia em restaurante, então trazia mortadela, queijo e improvisava lanches na hora do almoço e no jantar. Foi um período difícil, pois além de não sustentar, não era nada saudável e ainda pesava muito à noite. Ás vezes não conseguia dormir direito”, explica.

Há alguns anos, Alexsandro começou a trabalhar em outra empresa e tudo mudou. Agora ele abastece no posto que a empresa indica, recebe um ticket para almoçar e ainda leva alguns alimentos para improvisar uma refeição. “Hoje tenho uma alimentação mais saudável e balanceada e essa questão é bem valorizada na empresa que trabalho. Tivemos até uma palestra sobre o assunto e percebi que ainda tenho que melhorar um pouco”, reconhece.

Apesar de contar com certas vantagens, Alexsandro acredita que deveria existir um convênio entre as empresas, os posto e restaurantes que garantisse a alimentação e banho aos motoristas. “Já paguei muitas vezes para usar o banheiro. Agora procuro me manter sempre na mesma rota e parar em postos em que tenho mais intimidade e o pessoal já me conhece”, finaliza.